Quando Tudo Está Pronto... Menos o Coração
O cheiro de ração, serragem e desinfetante se mistura ao silêncio pesado que só os galpões vazios conhecem. É o fim do vazio sanitário, mas o começo de algo que ninguém ali pode prever. Miguel caminha entre as estruturas metálicas com o olhar atento de quem carrega nos ombros muito mais do que planilhas. Em suas mãos, o caderno já surrado com anotações rigorosas e datas riscadas a lápis, porque ali, nada é definitivo. Nem mesmo a paz.
Ele confere bebedouros, temperatura ambiente, a altura exata das lâmpadas que aquecerão os pintinhos ao chegar. Sessenta mil vidas minúsculas a caminho, cada uma delas esperando que tudo esteja perfeito. E está. Porque Miguel faz questão de garantir.
Mas por dentro, ele mesmo está longe disso.
Já em casa, o cheiro de café fresco o recebe junto com o som das novelas antigas que Dona Maria insiste em assistir. Ela sorri ao vê-lo, mas Miguel hesita. Senta à mesa com a postura de quem quer descansar o corpo, mas não consegue calar a mente.
— Mãe... — começa,