A gente conta

Saulo Prado

Ao lado de Angelina, eu me sentia um intruso na vida dela.

Um homem atravessando as frestas de uma mulher feita, vivida, marcada. Enquanto minha vida ainda estava em construção, a dela já carregava alicerces alguns intactos, outros desmoronando.

Ela não dizia nada.

Apenas sentava ao meu lado no carro com as pernas cruzadas e o olhar fixo no vidro. Seus dedos entrelaçados no colo, tensos demais para quem dizia estar "tudo bem".

Aquele silêncio me incomodava. Não por ser vazio, mas porque carregava tudo o que ela não queria dividir comigo.

Vi quando desceu do carro apressada, como se estivesse fugindo de algo ou de si mesma. Eu não a chamei, não a pressionei. Só segui atrás, com as mãos nos bolsos, sentindo a responsabilidade de estar ali por ela. E por mim.

A sala da sexóloga era estranhamente acolhedora. Sofás claros, cheiro de chá de camomila no ar, livros sobre relacionamentos, psicologia, corpo e prazer empilhados em uma estante de canto.

A mulher que nos atendeu tinh
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