Ela fugiu do passado com um novo nome, um novo rosto... mas o destino a obrigou a reencontrá-lo. Depois de sobreviver a perdas irreparáveis, um casamento por conveniência e um acidente que quase lhe tirou a vida, ela enterrou tudo o que foi, inclusive seu próprio nome. Agora, como Dafne Vieira, vive discretamente, trabalhando como babá e tentando reunir os cacos de seu coração destruído em silêncio. Mas o que parecia um recomeço tranquilo se transforma em um turbilhão quando ela aceita um novo emprego para cuidar de uma garotinha encantadora chamada Lavínia, a filha de Cézar Hoffmann, o bilionário implacável que ela jurou que nunca mais veria. Dafne pensou que estava preparada. Que os anos bastariam para mantê-la segura atrás de sua nova identidade. Mas, esse homem a transformou em um alvo por um capricho cruel. Ele é o mesmo de quem ela fugiu. Frio, arrogante, intenso, perigoso. Cuidar de Lavínia, a filhinha dele, foi uma escolha sua, mas ela não imaginou que isso a levaria ao limite do seus sentimentos, suas determinações, e da sua sanidade. Porque Cezar Hoffman, o único homem que um dia amou, diminuía cada vez mais a distância que ela jurou manter. Mas nenhum plano resiste ao desejo implacável, e à tensão cortante entre olhares, que dizem o que as bocas jamais ousariam. Um jogo perigoso de atração se forma, provocações, desejo contido e palavras não ditas, Dafne e Cézar se aproximam de forma inevitável. Mas o passado está à espreita. Segredos enterrados, mentiras não reveladas e uma verdade que pode despedaçar tudo, voltam à tona… e colocarão em risco não apenas a relação entre os dois, mas o futuro de uma menina que só deseja ser amada.
Leer másPorto Alegre – Rio Grande do Sul
Dafne
Da janela da pequena sala de espera, vizinha ao berçário, Dafne observava a chuva caindo no Jardim Europa. Gotas grossas e frias, caindo de um céu noturno, arrebentando-se contra a vidraça, e envolvendo tudo num manto branco.
De repente, estremeceu.
A chuva sempre fazia ela se lembrar, trazendo de volta ao passado, com clareza cruel. Mas, com o passar dos anos, será que a dor diminuiria, e as cicatrizes emocionais iriam sarar, como as físicas tinham desaparecido?
O espelho não mostrava mais nenhum sinal delas, e mesmo os sensíveis dedos não podiam encontrá-las. Certo, Dafne ainda tinha as faces encovadas, e parecia mais velha do que era, mas, por ironia, com as faces remodeladas, agora estava quase bonita, enquanto antes era apenas atraente.
Uma batida na porta a despertou dos devaneios.
- Espero não estar te incomodando, Dafne. – Luiza Garcia sua patroa, era sempre muito polida, bem como agradável e amiga. - Só que pensei que você deveria saber sobre o que nós decidimos. Meu marido precisa assumir seu lugar no Memorial Hospital antes do Ano-Novo, de modo que estaremos nos mudando para a Vitória durante o feriado de Natal.
A decisão deles de voltarem para o Espirito Santo, já tinha sido mencionada e discutida, porém, Dafne pensou que tinha alguma chance de não acontecer, e também tentou não pensar naquilo.
Fazia mais de dois anos que os Garcia tinham se arriscado, depois de ouvir um pouco de sua história, e empregado a mulher quieta, de olhos tristes, para ser babá de suas filhas Clara e Aurora, agora com três anos de idade. Dafne estava estabelecida aqui, segura e, se não feliz, pelo menos contente.
A mudança significava um transtorno, uma partida que estive temendo sempre que se lembrava desse assunto.
- Vou sentir falta de Porto Alegre - Luiza prosseguiu, se sentando na cadeira oposta a Dafne. - Contudo, quero voltar a trabalhar no escritório da minha família, e estaremos quase na porta ao lado de meus pais. Mamãe está impaciente para tomar conta das meninas...
Aquelas crianças que tinham ajudado a preencher os braços e o coração vazios de Dafne.
- Apesar de que tenho uma tremenda certeza de que ela vai estragá-las.
De repente, se dando conta da desolação que Dafne procurava esconder, Luiza se calou.
Após um momento, prosseguiu, com um ar prático e mais enérgico.
- Na verdade, o que vim te dizer foi que esta tarde Otília Cavalcante telefonou para o escritório para perguntar se você estaria procurando outro emprego como esse. Ela sabe de um rico empresário que precisa de uma babá de confiança e está disposto a pagar um ótimo salário. Há uma menina de mais ou menos a mesma idade das minhas da Clara. O pai dela é viúvo ou divorciado, não estou certa, mas isso não importa agora. A avó da criança tomava conta dela, mas há alguns meses a senhora morreu inesperadamente.
Luiza suspirou, um pouco desconfortável pelo silêncio de Dafne.
- Pelo que sei, a pessoa que cuidava da criança não conseguiu conquistar a confiança dela. A pobre criancinha não gostava dela e preferia ficar com a governanta. Quando o pai descobriu o que estava acontecendo, despediu a mulher que aparentemente não tinha a menor vocação para babá. Eles precisam de alguém que possa começar já. Ele estará na residência amanhã de manhã, caso você queira uma dispensa para ir conversar e tentar uma entrevista.
- É muita gentileza sua pensar em mim dessa forma, Dona Luiza, mas eu não posso começar imediatamente. Preciso cuidar das meninas e....
Luiza fez um gesto com a mão a interrompendo.
- Limpei minha mesa do escritório hoje e estarei em casa até a mudança. Assim, se decidir tentar o emprego, estou certa de que posso dar conta. Você foi uma verdadeira enviada por Deus para mim, Dafne, e eu estou muito grata por todo carinho e cuidado que prestou as minhas filhas. É por isso que gostaria de te ver bem acolhida antes de nossa partida. O nome do homem é Cezar Hoffmann. Ele possui uma bela residência na Península Ponta da Figueira Marina. Escrevi o endereço e o número do telefone aqui.
Ela passou um folha de papel dobrada.
- Bem, acho que é melhor eu sair, ou o Samuel pode ficar irritado com o meu atraso. Temos ingressos para um concerto no teatro. Isso se a chuva não estiver muito pesada.
Mas, embora Dafne tivesse aceitado o pedaço de papel, ela não ouviu absolutamente nada desde que o nome Cezar Hoffmann tinha sido mencionado.
O choque da menção daquele nome fez seu sangue retumbar nos ouvidos e trouxe uma escuridão que ameaçava sufoca-la lentamente. Quando a porta se fechou atrás de sua patroa, Dafne se inclinou para a frente e pôs a cabeça entre os joelhos.
Depois de um tempo naquela posição, a tontura começou a passar. Que brincadeira macabra do destino! Era quase inacreditável que o homem que precisava de uma babá com tanta urgência tivesse de ser o único para quem ela não podia trabalhar. Seria mesmo ele? O endereço era diferente...Sim, tinha de ser. Cézar era um nome bastante comum, mas Cezar Hoffmann não, e de certo modo o resto se ajustava. Na última vez em que ouviu falar dele, a madrasta de Cézar estava cuidando de sua filhinha, e ele estava para casar.
Mas agora parece que ficou livre, e, com a morte de sua madrasta, a criança fora colocada aos cuidados de uma babá. Com um repentino sentimento de angústia, Dafne se lembrou de Luiza Garcia dizendo algo como: "A babá não conseguiu ganhar a confiança da menininha. A pobrezinha não gostava dela". Fechando os olhos com força, Dafne lutou contra a vontade de chorar. Se apenas as circunstâncias fossem diferentes... Em uma questão de semanas, não teria casa nem emprego, contudo, não havia nada que pudesse fazer.
Ou havia? Cézar não reconheceria o Dafne Vieira. Quando ela o conheceu, se chamava Pilar Gonçalves dos Santos. Apesar de que, após tanto tempo, Dafne devia estar acostumada à metamorfose, de vez em quando era um choque ver uma estranha olhando de volta para ela do espelho.
Quando aos vinte e dois, pesava nove quilos a mais, e os cabelos eram curtos, castanhos e ondulados. Agora, estavam longos e lisos, de volta ao loiro natural.
Naquele tempo, era jovem, atraente e curvilínea. Envelheceu drasticamente, se não em anos pelo menos em experiência. Seu corpo era magro, quase esquelética, e seu brilho estava extinto. Não, Cézar não a reconheceria. Após várias sessões de cirurgia plástica, duvidava que sua própria mãe a reconhecesse.
Mas era um risco que não podia correr.
Dafne ainda podia ver a expressão dele, o modo como Cézar a olhou com desprezo e condenação. Ainda assim o desejo de tornar a vê-lo, a necessidade de ver a filha dele, era como uma dor física. Não! Não podia fazer isso. Esse passo seria completa loucura e abriria todas as velhas feridas e destruiria a pouca paz de espírito que tinha conseguido alcançar. Mas, se conseguisse a colocação de babá, seria a resposta a todas as suas preces... Então, decidiu. Marcaria uma entrevista com ele.
Como se inquieto demais para ficar sentado, Cézar se levantou e ficou de pé, apoiado na lareira.- É um pouco tarde para arrependimentos, mas você conhece o velho provérbio que diz "antes tarde do que nunca"... Se preferir me deixar e levar a Lavínia, eu comprarei uma casa para você e sustentarei as duas.- É isso o que você quer?Ela rezava do fundo da alma para que não fosse. Cézar virou a cabeça para encará-la, e, por um segundo, toda sua angústia apareceu.- Não, Dafne, não é... Mas agora tem de ser o que você quer.- Bem, para ser franca, não gosto nem um pouco da ideia de uma família desfalcada de um membro tão importante. Em minha opinião, nossa princesinha deve ter um pai, e eu, esteja certo, gosto muito de ter um marido.Com os dentes cerrados, ele disse:- Olhe, se no futuro você se apaixonar por alguém com quem queira se casar, prometo que vou te dar o divórcio.Dafne olhou para o teto e tomou fôlego.- Um minuto atrás, quando eu disse que sabia que nunca me apaixonaria, vo
- No princípio, eu recusei. Raul continuou a me pressionar, e foi aí que eu contei sobre o bebê. Mas, em vez de me dar as costas e ir embora, ele pareceu contente. Recordo bem suas palavras, "Parece um milagre. A resposta para minhas orações! Diremos a todos que a criança é minha. Cuidarei de vocês duas. Seremos uma família". Ainda assim, recusei, e então ele me disse algo que nunca tinha dito a ninguém mais. Raul queria viver o que ele chamava de uma vida normal, ter um lar e uma família.Ela estava consciente de que Cézar a fitava como se nunca a tivesse visto antes.- Raul não podia entrar em acordo com sua própria sexualidade e estava desesperado para ocultá-la, acima de tudo de sua mãe, que continuava a perguntar por que ele não tinha uma namorada e a tentar empurrá-lo para o casamento. Ele se sentia perseguido. Foi por isso que estava tão ansioso para que eu a conhecesse, e, quando o pressionei, admitiu que a principal razão pela qual queria casar-se comigo era para poder tirar
Ela levou a mão ao peito.- Por que minha sogra mentiria sobre uma coisa dessas?- Pela mesma razão por que mentiu para mim. Otília me fez crer que você não queria a criança. Rafaela e eu tínhamos falado sobre adoção apenas para assegurar que a Lavínia teria um lar seguro e um futuro garantido.- Parece óbvio agora que Otília mentiu para todos nós porque não podia suportar a ideia de ter de se separar da filha de Raul. No entendimento dela, a única maneira de ter certeza de que a neta nunca seria tirada de sua companhia seria você desistir dela e eu adotá-la... Deixar o hospital e desaparecer sem deixar rastro como fez foi entrar no jogo dela. Você não lhe deu trabalho nenhum.Cézar suspirou fundo. Parecendo cansado demais.- Entretanto, pequena Dafne, a maior parte da culpa deve cair sobre meus ombros. Se eu tivesse ido vê-la ou procurado ficar a par da situação, ficaria sabendo da verdade e nada disso teria acontecido. Mas deixei essa parte para Otília, e acreditei no que ela me dis
- Isso foi o que ele falou à mãe, porque não queria que ela se preocupasse. No dia do acidente, Raul havia estado no hospital para conhecer os resultados de alguns exames que ele fez. Os especialistas disseram que ele tinha menos de três meses de vida. Raul voltou para casa arrasado, como você pode imaginar.Ela sentia que toda a tristeza daquele momento voltava com toda a força a seu coração.- Nós conversamos por um momento. Depois, ele resolveu que iria a uma festa de Natal para a qual tínhamos sido convidados. Eu queria que ele tomasse um táxi, mas o teimoso insistiu em ir de carro. Seu hálito já cheirava a bourbon; então, decidi ir junto. Quando a festa terminou, apesar dele ter bebido muito a noite inteira... Se você não acredita em mim, pergunte a nossos anfitriões daquele dia. O Raul estava embriagadíssimo, e se sentou à direção do nosso carro, insistindo em dirigir de volta para casa. Eu consegui persuadi-lo a deixar-me dirigir...Levantando um rosto muito branco, contraído,
Ele acreditou piamente que ela era uma mulher sem valor que leiloava a virgindade no site de acompanhantes de luxo. Por causa disso, Cezar a desprezou ainda mais, chegando ao ponto de agir com brutalidade e violência naquela noite em que descobriu que ela era mesma mulher que Raul dizia ser sua noiva.Agora que ouvia a verdade, ele parecia prestes a enlouquecer.Sem qualquer vontade de continuar lutando para parecer justa aos olhos de Cézar, Dafne só desviou o olhar para a lareira e ficou em silêncio.- Você não me disse nada quando eu te mostrei o site. – ele disse num tom baixo.- O que eu poderia dizer? Aquele momento em que você me acusou de ser uma prostituta que estava se vendendo na internet, foi a primeira vez que me vi no site. Eu não sabia de nada até então. – ela balançou a cabeça. – Em todo o caso, voltando ao momento em que acordei no hospital, eu me senti em uma prisão, precisava sair de lá.- Mas sem dúvida um cárcere muito luxuoso, não achou?- Isso não teve a menor im
Um calafrio correu pela espinha de Dafne ao ouvir aquilo. Não sabia ao que se devia.- Pouco mais de um mês após a morte da Otília que me foi dada a data definitiva da mudança, e me disseram que os Garcia iriam deixá-la aqui. Por sorte, nessa época, eu estava precisando de uma babá para a Lavínia. Então, arranjei para uma conhecida comum, falar com a Sra. Garcia e insinuar que te oferecesse o emprego.Cézar pôs a xícara sobre o aparador e ficou de frente para Dafne.- Não sabia se você teria coragem de vir. Claro que isso dependeria de quanto você tinha mudado e de quanto queria rever sua filha. Embora tivessem se passado quase quatro anos desde que nós tínhamos visto, eu esperava que tivesse feito algo para mudar sua aparência. Mas, quando você entrou, confesso que tomei um grande susto. Pensei por um instante que a agência de detetives tinha cometido um engano e que estava diante de outra pessoa. Não levei muito tempo, contudo, para descobrir que, apesar de sua aparência alterada, a
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