Capítulo 74

O convite oficial da curadoria chegou com uma arte belíssima:

papéis em camadas, linhas de tinta imitando trajetos sobre um corpo abstrato e o título em negrito no centro:

CUERPOS EN TRÁNSITO — Exposición colectiva

“Sobre quem somos quando estamos entre lugares, entre pessoas, entre versões.”

A mostra aconteceria dali a uma semana, no Teatro dos Ventos, um antigo espaço restaurado no coração de Barcelona que abrigava arte em todas as suas formas — música, palavra, imagem, gesto.

Allegra foi convidada a expor duas obras inéditas.

Aquela da mulher mergulhando, com traços borrados de azul e dourado, foi escolhida sem hesitação.

A segunda, porém, ainda estava nascendo.

Era a que mais doía.

E, talvez por isso, a mais necessária.

Naquela manhã, sentada no quintal da Casa de la Llum, Allegra pintava em silêncio.

A nova tela tinha tons de pele, vermelho queimado e pinceladas que pareciam marcas deixadas por mãos.

Era uma mulher dançando sozinha.

Mas não havia ninguém ao redor.

Nem paredes.

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