O assassino

Capítulo 1

Violet Jones

Eu estava tão feliz. Esse era o dia da minha liberdade. Poder viver normalmente e até andar pelas ruas depois de tantos anos morando num colégio interno.

Não gostei do motorista que veio me buscar, mas não me importei porque finalmente voltaria pra casa.

Mas a vida nunca é boa comigo.

Dois tiros secos mudaram tudo assim que cheguei.

Meus olhos se voltaram para frente... e mesmo sem acreditar eu vi meus pais caindo, e o sangue deles escorrendo pelo piso branco.

O homem que pensei ser só o motorista, os matou na minha frente.

— N-não... — sussurrei. — Não, por favor...

Caí de joelhos. Meus gritos ficaram presos na garganta, e tudo ao meu redor desapareceu. O ar, o som, a luz. Só existia o vazio.

O homem que antes parecia apenas o meu motorista, havia acabado de disparar na minha frente.

— O que você fez? Eles não te fizeram nada! — gritei sem conseguir me levantar — Porque? Porque?

Até que senti o cano da arma encostar na lateral da minha cabeça.

A voz dele, fria como gelo, acabou com o silêncio, me fez engolir o choro de imediato, mesmo que isso me matasse por dentro.

— Pegue o que for precisar. Depois, entre no carro.

Eu balancei a cabeça, negando, sem conseguir impedir as lágrimas de caírem novamente. Apertei as pedras do chão com força, pensando se adiantaria tentar acertar alguma nesse infeliz.

— Eu não costumo repetir. — A ameaça foi clara quando o ouvi engatilhar.

Me levantei trêmula, sem entender se estava viva ou morta por dentro. Entrei na casa que já não era mais minha. A mesma casa onde aprendi a andar, onde comemorei alguns aniversários e onde agora o sangue dos meus pais ainda manchava o chão da entrada.

Fui direto até o painel atrás da estante do escritório. Eu sabia que lá havia uma arma carregada. Já vi meu pai guardar algumas vezes quando vim nas visitas mensais do internato onde me colocaram aqui em Boston.

Se era comigo que ele queria jogar, eu ditaria as regras. Explodiria a cabeça daquele assassino.

Abri o painel com mãos trêmulas. A arma estava lá, exatamente onde eu lembrava. Enfiei os dedos ao redor dela com pressa, sentindo o frio do metal contra a pele suada. Mas um envelope preso atrás da arma chamou minha atenção.

Era branco, fino, mas com um selo vermelho familiar.

O brasão da minha família.

Tirei o envelope com cuidado, era estranho. Meu nome estava escrito à mão na parte da frente, com a caligrafia precisa do meu pai.

Engoli em seco e o abri. Dentro, havia apenas uma folha, mas foi o suficiente pra derrubar tudo o que eu achava que sabia.

Uma ordem de execução pra mim.

Na data de amanhã, um pouco depois que eu saísse do internato. Mas porque esse assassino me buscou hoje?

Eu era um alvo do meu pai. A assinatura era dele. O mesmo homem que me deu uma boneca feita à mão quando completei sete anos. O mesmo que me ensinou a nadar, mesmo que aos gritos. Talvez só fosse exigente. O mesmo que dizia que eu entenderia seus motivos de me deixar naquele internato a infância toda. Mas eu não entendia nada.

Ele havia me condenado.

Meu corpo congelou. O sangue pulsava nos meus ouvidos, e por um instante achei que fosse desmaiar. Tudo começou a fazer sentido: o estranho me buscando, o silêncio no carro, os tiros.

Mas por quê? Por que ele quis me matar? E por que esse homem, esse executor, não cumpriu a ordem? Veio um dia antes?

Guardei a arma no cós da calça, cobrindo com a blusa. Dobrei o papel e enfiei no bolso com os dedos ainda tremendo.

Respirei fundo. Era doloroso demais ser fria.

Então voltei até a porta, onde o homem me esperava, encostado no carro como se tivesse todo o tempo do mundo. Olhou pra mim, impassível. Eu o encarei de volta com um olhar que ele ainda não tinha visto.

Eu queria respostas.

Queria vingança.

— Vamos — murmurei, entrando no carro sem desviar os olhos do assassino.

Se ele não ia me matar… então talvez fosse ele quem me mostraria a verdade. E ficaria bem mais fácil comigo apontando a pistola na nuca dele dentro do carro.

As lágrimas escorriam pelas minhas bochechas, mas meu rosto estava impassível. Meus olhos mantive fixos nele.

O homem dirigia como se eu nem estivesse ali, como se a morte dos meus pais, o sangue nas minhas roupas, a dor latejando no peito… tudo fosse apenas mais um dia do seu trabalho sujo.

Mas ele sabia que eu o encarava, vi diversas vezes ele me olhando.

Meu coração martelava no peito. Uma parte de mim pedia calma, estratégia. A outra gritava por justiça.

A arma pesava na cintura.

Minhas mãos se moveram antes que a razão impedisse. Peguei a arma e, num gesto rápido, encostei o cano na lateral da cabeça dele.

— Olhe pra mim! — gritei. — Olhe pra mim e me diga a verdade! Quero saber por quê!

Ele não se virou de leve e continuou dirigindo. Nem piscou. Só manteve os olhos na estrada como se nada tivesse acontecido.

— Me diga! Por que matou meus pais? E porque ele assinou minha execução?! Quem é você? Por que eles morreram? — exigi.

Minhas palavras saíram desesperadas.

Ele ficou em completo silêncio.

Foi então que falou com a voz baixa, controlada:

— Se quiser morrer, pode atirar. Antes, eu jogo esse carro do penhasco e nenhum de nós verá a luz novamente. Ou — ele continuou, sem pressa — pode guardar essa arma, esperar até chegarmos na sua casa e decidir se quer viver ou morrer.

— Casa? Que casa? Você destruiu tudo o que planejei! Destruiu minha vida!

Furiosa, tirei a arma da cabeça dele e bati com força no apoio do banco, perdendo o controle.

— Covarde! Desgraçado!

Então eu vi um carro cinza escuro atrás de nós, tinha janelas escuras, não pertencia à nossa comitiva. Não era da minha família. Não era do internato, mas eu o reconheci.

O mesmo carro que ficava parado no outro lado da rua nas tardes em que eu caminhava pelos jardins. Eu achava que era paranoia, mas agora ele estava ali, nos seguindo.

— Aquele carro tá seguindo a gente… — falei baixo, quase pra mim mesma.

— Eu sei — ele respondeu sem hesitar.

E naquele instante, tudo fez sentido. Eles não queriam apenas me tirar do internato, queriam mesmo me apagar. Talvez usar meu corpo antes.

Se aquele carro nos alcançasse, talvez não houvesse outra chance. Talvez nem esse homem estranho fosse capaz de impedi-los.

Olhei o velocímetro. O carro diminuía a velocidade para entrar em uma curva. Era agora.

Puxei a maçaneta, abri a porta e me joguei.

O impacto me arrancou o ar. Rolei no chão de terra, sentindo o ombro rasgar com o impacto, os joelhos queimarem, a visão escurecer, mas não parei. Me arrastei até a vegetação densa à beira da estrada. Precisava sumir da vista deles.

Mas ele era mais rápido. Muito mais.

Antes que eu pudesse levantar, ele girou o carro de maneira extremamente louca, fazendo um barulho imenso dos pneus. Então desceu, me agarrou pelo braço e me empurrou contra o tronco de uma árvore, forte o suficiente pra me imobilizar sem me machucar.

Seu corpo era uma parede. Seu cheiro, fumaça, metal e madeira. Sua voz, muito alta.

— Você é burra ou só quer morrer mais cedo? — ele rosnou, com os olhos faiscando a centímetros dos meus.

— Eles querem me matar! Você devia estar do meu lado! Mas também quer me matar! Todos querem, afinal!? — gritei com o pouco de ar que ainda me restava.

Ele não respondeu de imediato. Apenas respirou fundo, os olhos percorrendo meu rosto com raiva… e algo mais.

Alguma coisa brilhou ali por um segundo. Um lampejo de surpresa. Como se ele não esperasse alguma coisa.

— Aquele carro tá ali porque eu quis — ele disse, com os dentes cerrados. — Precisávamos confirmar quem estava nos seguindo. Se havia mais deles. Você estragou tudo, princesa. Agora eles vão sumir na próxima curva e a gente perde a chance de descobrir o esconderijo.

Eu pisquei, confusa.

— Você queria ser seguido? É mesmo um louco!

— O chefe quer todos mortos — ele disse, como quem comenta o tempo. — Mas não adianta matar um rato e deixar o ninho.

Meu estômago virou.

— Eu sou a isca? É isso?

Ele se afastou um passo, como se minha indignação fosse uma piada.

— Você é a herdeira de Jones. A última peça viva da mesa. Eles vão te caçar até o fim. E eu vou matá-los antes disso. Mas pra isso eu preciso saber onde estão. E preciso que descanse a porra da bunda no banco do carro e me deixe trabalhar.

Ele passou a mão pelos cabelos, irritado.

— Era só mais uma curva… mais uma maldita curva, caralho! E os teríamos alcançado. Mas não — ele cuspiu a palavra — Você tinha que bancar a heroína.

Senti o calor subir no rosto.

— Eu tentei sobreviver! Eu vi aquele carro e achei que você estava me levando direto pra eles!

— Eu podia ter matado você dez vezes desde o portão do internato — ele rebateu, se aproximando de novo, o rosto perto demais. — Mas não matei. Sabe por quê?

— Porque precisava de mim viva? — retruquei, tentando manter a voz firme.

Ele me olhou.

Longo. Como se estivesse avaliando até onde eu conseguia ir com aquilo. Depois sorriu com um canto só da boca. Frio, perigoso.

— Porque não fui contratado pra isso.

Seu olhar desceu para a minha boca por um segundo. Rápido, mas eu vi. E meu coração traiu meu ódio com um tropeço.

— Como não foi contratado? Claro que foi.

Ele estendeu a mão, a mesma que antes me empurrou contra a árvore. Dessa vez, com calma.

— Vamos. Antes que alguém volte pra checar se conseguiu te matar e eu resolva dar um empurrão

— Senti meu braço ser puxado pelo assassino.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App