Dia de trabalho

NARRAÇÃO DE LARA GASPAR

NARRAÇÃO DE LARA GASPAR

Ai, que maravilha. O Uber parou em frente à loja de conveniência, que fica dentro de um posto de gasolina. E quem estava ali, me encarando de braços cruzados? Meu patrão. A expressão dele não era das melhores. Olhei o relógio no meu pulso. É… ele tem motivos. Quinze minutos de atraso — culpa do trânsito, que parecia uma lesma.

Suspirei, pronta para a bronca, e passei por ele fingindo que estava tudo certo. Meu patrão é um homem acima do peso, já passou dos cinquenta, dá pra ver pelas rugas e pelos cabelos brancos.

Ele segurou meu ombro, impedindo minha entrada.

— Já viu a hora?!

— O trânsi...

— Não quero desculpas! Se continuar se atrasando, vou descontar do seu salário! Agora se apresse — você precisa lavar o banheiro e depois preparar os pães de queijo. Daqui a pouco os clientes chegam famintos!

— Não seria melhor fazer os pães de queijo primeiro? — perguntei. — Faz mais sentido, né? Como posso enfiar as mãos num vaso sanitário público e depois mexer com o café da manhã dos clientes?

Meu patrão se calou, como se tentasse assimilar o que eu tinha acabado de dizer. Outra funcionária o julgou com os olhos enquanto ligava a cafeteira.

— Só faça logo! — resmungou, irritado, e saiu da loja. Sorri, satisfeita. Olhei para minha colega de trabalho. Ela é discreta, fala pouco… mas trabalha direitinho.

— Bom dia! — falei animada, colocando minha bolsa atrás do balcão.

— Bom dia — respondeu sem olhar pra mim. Eu até queria dizer o nome dela, mas esqueci faz tempo… agora tenho vergonha de perguntar. Não me julguem! Acho que é algo tipo Abigail… ou Billi… ou algo assim. Só sei que termina com “il” ou “iu”. No fim das contas, acostumei a chamá-la de "colega".

Comecei o trabalho colocando a touca, depois pus os pães de queijo pra assar. Coloquei uma música baixa.

Enquanto passava um pano no chão, cantarolando, parei incomodada. Alguém abriu a porta de vidro e pisou no chão úmido com sapatos sociais. A desvantagem desse trabalho? A gente não pode xingar os clientes.

Olhei aqueles sapatos e, de baixo para cima, o encarei. Quase derrubei a vassoura quando reconheci meu vizinho. Disfarcei, me apoiando no cabo da vassoura. Ele olhou para o chão, depois levantou um pé, claramente constrangido.

— Me desculpe, não sabia que o chão estava molhado. — Ele parecia distraído. Só me reconheceu depois de olhar bem para o meu rosto. Sorriu.

— Lara! Não sabia que você trabalhava aqui.

— É... — respondi apenas isso, ainda segurando firme o cabo da vassoura. Acho que, no fundo, estava constrangida por estar de touca e uniforme.

— Normalmente só paro nesse posto pra reabastecer. Mas como não dormi bem esta noite, resolvi parar pra tomar um café.

Arqueei as sobrancelhas, forçando um sorriso.

— Eu posso servi-lo — disse minha colega de trabalho, sorrindo. Sorrindo! Ela nunca sorri… muito menos é simpática com clientes. Ele retribuiu o sorriso.

— Obrigado, aceito um café sem açúcar.

O julguei com o olhar. Quem toma café sem açúcar? Isso é coisa de gente que mata.

Nunca vi minha colega tão empolgada. Perguntou até se ele queria chantilly na xícara! Ele riu, negando.

— Qual é o seu nome? — ela perguntou. Já estava passando dos limites. Ela nunca pergunta o nome dos clientes. Nunca!

— Matias Lopes.

— Gosto desse nome. Eu me chamo Abigail Martins.

Eu sabia! Sabia que era alguma coisa com Abigail. Eles se cumprimentaram. Depois, Matias olhou de novo pra mim.

— Lara, amanhã é sexta. Podemos marcar o jantar com seu amigo?

Meu rosto adormeceu. Jantar? O que eu vou fazer?

— Claro… — respondi, sentindo o olhar de Abigail sobre mim.

— Legal — disse ele, tomando todo o café e deixando a xícara no balcão. Sorriu.

— Até logo, Lara Gaspar — falou, deixando uma nota de cem reais sobre o balcão e saindo.

Abigail vibrou com a gorjeta. Pelo menos ele é generoso. Mas aí me toquei: Espera aí… ele disse "Lara Gaspar"? Ele sabe até meu sobrenome! Então por que, no elevador, perguntou meu nome?

Pensando bem, ele me mandou um convite na rede social… Ele não me engana. Aposto que já sabia meu nome e só queria puxar assunto.

— Ele é um gato — comentou Abigail, se escorando no balcão e se inclinando o máximo possível pra ver se ele já tinha entrado no carro de luxo.

— Uhum — murmurei, ainda segurando a vassoura.

— Ele é o quê seu?

— Vizinho — comentei, voltando a passar pano no chão.

— Queria um vizinho desses...

A encarei. Ela não sabe o que fala. Se soubesse como eu o vi pela primeira vez, pensaria duas vezes antes de dizer isso… no mínimo chamaria a polícia.

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