6. O Toque no jaleco.

O corredor do 15º andar parecia mais silencioso naquela tarde. Os passos de Isabela ecoavam com leveza pelo piso encerado, misturando-se ao som abafado do sistema de ventilação. Havia acabado de concluir a limpeza da copa executiva e empurrava seu carrinho em direção ao elevador de serviço, quando ouviu vozes se aproximando.

Rafael Arantes, acompanhado de dois executivos, caminhava em direção oposta, em ritmo apressado, como era costume. Terno impecável, gravata cinza-prata, a expressão séria de quem carregava não apenas decisões, mas o peso de mantê-las em segredo.

Isabela recuou instintivamente para encostar o carrinho contra a parede, como sempre fazia para dar passagem aos superiores. Manteve a postura firme, o olhar para o chão — mas algo naquele momento parecia diferente, como se o ar estivesse mais denso.

Ao passar por ela, Rafael virou-se ligeiramente para cumprimentar um dos executivos atrás de si. O gesto o fez desviar meio passo da rota… e então, de leve, o ombro de seu paletó tocou o tecido do jaleco de Isabela.

Foi um toque quase imperceptível. Um roçar acidental. Mas suficiente.

O choque veio como uma descarga morna, não física — ao menos, não inteiramente — mas real. Um arrepio percorreu a espinha de Isabela. Seus olhos se arregalaram antes que pudesse controlar a reação.

Rafael parou.

Os executivos seguiram por mais alguns passos antes de perceber, mas ele já havia se virado.

Isabela permaneceu imóvel, sentindo o local do toque como se algo invisível pulsasse ali. Os dois se encararam por um instante que pareceu suspenso no tempo. O rosto dele, geralmente impenetrável, agora carregava surpresa contida. E curiosidade.

— Me desculpe — disse ele, baixo, como se aquele pedido não fosse apenas por cortesia.

Ela abriu a boca para responder, mas não houve som. Em vez disso, assentiu, o coração acelerado. Não pelo toque em si, mas pelo efeito. Um calor estranho se espalhava por seu peito, e uma sensação nova — reconhecimento.

Não dele como CEO. Não como figura distante de autoridade.

Mas algo mais antigo. Mais… familiar?

Rafael manteve o olhar nela por mais um segundo. Seus olhos não eram frios como costumavam parecer nas reuniões — estavam escuros, sim, mas atentos. Como se procurassem algo que ele próprio não sabia nomear.

— Isabela — disse seu nome com uma entonação suave. Não como chefe. Quase como quem testa uma palavra antiga.

Ela piscou, surpresa por ele lembrar. Desde o episódio do café, ele não havia voltado a chamá-la diretamente.

— Sim, senhor.

Ele hesitou, como se fosse dizer mais. Mas então os outros o chamaram, e a distância entre eles se impôs novamente.

— Continue o bom trabalho — foi tudo o que disse antes de se afastar.

Isabela permaneceu ali, como se ainda sentisse sua presença ecoar. Só voltou a respirar com normalidade quando a porta do elevador se fechou atrás do grupo.

Mais tarde, no vestiário do subsolo, enquanto trocava de roupa ao final do turno, Isabela tocou o local exato onde o jaleco havia sido tocado. Ainda havia uma leve vibração, uma memória no tecido. E no fundo de sua mente, uma sensação estranha — como se aquele momento tivesse acontecido antes, em algum lugar além da lógica.

Não era paixão. Não era medo. Era… uma chave virando em alguma porta interior.

Na noite anterior, sonhara com corredores brancos, portas que se abriam sozinhas e vozes sussurrando nomes que ela não conhecia — ou achava não conhecer. Agora, o toque parecia ter vindo direto daquele sonho.

O que estava acontecendo?

Antes de sair do prédio, passou pela sala de segurança para deixar um item esquecido. Lá, o velho Sr. Rômulo, um segurança de olhos atentos e poucas palavras, a cumprimentou com um aceno discreto.

— Você viu o que aconteceu lá em cima? — ele perguntou, em tom confidencial.

— Onde?

— No 15º. Uma das salas bloqueou o acesso remoto por cinco minutos. Ninguém sabe por quê. — Ele a olhou com desconfiança disfarçada de curiosidade. — Foi justo na hora em que o senhor Rafael estava voltando de uma reunião.

Isabela não disse nada, mas o arrepio voltou.

Cinco minutos. O tempo entre o toque e o retorno de Rafael.

Coincidência?

Ou…

— Cuidado com quem acredita em você. — O bilhete anônimo parecia ainda mais enigmático agora.

Naquela noite, ao chegar em casa, retirou o jaleco da mochila e o colocou sobre a cama. Olhou para ele como se esperasse que falasse. Como se um objeto comum carregasse agora algo que não devia.

O toque.

O choque.

O olhar dele.

Isabela fechou os olhos, inspirando profundamente. Algo estava mudando. Ela podia sentir. Como se fios invisíveis a estivessem puxando para dentro de uma rede que começava a se revelar — lentamente, sutilmente, e de forma irreversível.

E no centro dessa teia estava Rafael Arantes.

E um reconhecimento que ainda não fazia sentido — mas que, de algum modo, era real.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP