Mundo de ficçãoIniciar sessãoPorter
O incômodo começou cedo, bem antes de eu chegar ao escritório. Meu celular pessoal não estava comigo — lembrava perfeitamente de tê-lo deixado no carro da Hanna na noite anterior, numa distração incomum. E, ainda que eu tentasse me convencer do contrário, havia um motivo óbvio para o desconforto no fundo da minha mente. O celular estava com ela. Com as mensagens. Apertei os dedos contra o volante, tentando afastar a inquietação. Hanna dificilmente mexia nas minhas coisas — ela sempre respeitou meu espaço, até demais. Mas e se…? Assim que sentei na minha mesa, mandei uma mensagem rápida para Alicia através do telefone corporativo: “Oi, Alicia. Estou sem meu celular pessoal no momento. Você me enviou algo hoje de manhã?” A resposta veio em segundos, carregada de malícia: “Enviei sim. Mas já que você não viu… quer que eu apague? Ou prefere deixar assim? Gosto de te imaginar tentando resistir.” E então a porta se abriu sem aviso, como se ela tivesse esperado exatamente esse timing. Alicia entrou com seu andar calculado e perigoso. A blusa justa, o perfume doce, os olhos escuros que sabiam exatamente onde mirar para desmontar qualquer defesa. Meu corpo reagiu antes da minha consciência. — Bom dia, Porter — disse ela, apoiando uma pasta sobre a mesa, com o quadril encostando levemente na madeira. — Achei melhor vir pessoalmente. Algumas coisas… são mais fáceis quando ditas cara a cara. Meu autocontrole derreteu como cera quente. Eu sabia que era errado. Sabia do risco. Sabia de Hanna. Mas Alicia tinha essa habilidade — me arrastar para um ponto onde o racional não existia. — Eu recebi sua mensagem — consegui murmurar, mesmo sentindo a pulsação acelerar. — Só queria confirmar. Ela mordeu o lábio, provocando. — Se quiser, eu paro. — … — Só precisa pedir. Foi o suficiente. Segurei sua cintura, puxei-a contra mim, e o beijo explodiu com a intensidade acumulada de dias. Ela correspondeu sem hesitar, como quem já sabia que venceria aquela batalha de autocontenção. O desejo era proibido, urgente, e justamente por isso irresistível. Quando finalmente nos afastamos, ela sorriu com um brilho presunçoso. — Não queria atrapalhar sua manhã — disse, ajeitando a blusa de propósito devagar. — Mas eu precisava te ver. Precisava. Essa palavra ecoou dentro de mim. Ela saiu da sala caminhando com a mesma confiança perigosa com que tinha entrado, e eu respirei fundo, tentando reorganizar meus pensamentos. Minha cabeça girava entre adrenalina, desejo e um medo frio: e se Hanna tivesse visto algo? Peguei o telefone e escrevi para ela: “Amor, você vai almoçar em casa hoje?” “Vê pra mim se meu celular ficou no carro.” Segundos depois, a tela permaneceu silenciosa. A preocupação virou um nó no estômago. Eu precisava daquele celular de volta antes de qualquer desastre. O horário do almoço se aproximou como uma sentença. Dirigi até em casa rápido demais, tentando parecer natural quando estacionei. Hanna já estava lá. Quando entrei, ela colocou meu celular sobre o aparador. Meu coração parou por um momento — mas a expressão dela era indecifrável. Não dava para saber se ela tinha lido, se tinha ignorado, se estava escondendo algo. Seu silêncio era… mais ameaçador do que qualquer grito. — Oi, amor — cumprimentei, beijando seu rosto e tentando manter a máscara de normalidade. — Que dia longo, hein? Ela respondeu com um sorriso mínimo. Quente o suficiente para parecer educado. Frio o bastante para me arrepiar. Sentamos à mesa. Comemos como dois estranhos representando papéis antigos. Eu falava sobre trabalho, projetos, reuniões. Ela respondia de forma curta, educada, mas… distante. Como se estivesse em outro lugar. Como se estivesse me observando de fora. — Você está bem? — perguntei, tentando sondar. — Estou — respondeu, sem hesitação. — Apenas cansada. Havia algo errado. Terrivelmente errado. Eu apenas não sabia o quê. Ou talvez soubesse. E estivesse fingindo que não. Quando o almoço terminou, senti algo dentro de mim esmorecer. Aquele silêncio dela… aquele distanciamento… a forma como me olhou antes de levantar da mesa… Era como se algo tivesse se quebrado. Eu só não sabia se já estava quebrado antes. Ou se ela tinha acabado de encontrar os estilhaços. E, enquanto Hanna saía com passos lentos e controlados para o trabalho, a verdade me atingiu com força: Se ela tinha visto alguma coisa— Se ela tivesse lido qualquer mensagem— Então eu estava prestes a perder tudo. E não fazia ideia de como evitar isso.






