Mundo de ficçãoIniciar sessãoRAVELLI…
O silêncio é uma arma subestimada. A maioria das pessoas teme palavras duras, mas é no silêncio que a mente implode. Eu aprendi cedo que, quando você cala, os outros gritam por dentro. É assim que eles se entregam. É assim que eu venço. A cidade lá embaixo pulsava como um organismo vivo, milhares de luzes disputando espaço com a escuridão. Manhattan é assim, um palco perfeito para predadores que sabem jogar. E eu sempre soube. Na cobertura, cada detalhe refletia aquilo que eu era, ou que preferiam acreditar que eu era: imponente, refinado, perigoso. Um homem de aparência fria, mas que calcula cada movimento antes mesmo que os outros percebam que estão no tabuleiro. Miguel estava sentado no sofá, com uma taça de vinho na mão, rindo de algo que só ele achava engraçado. Sempre leve, sempre fazendo piada daquilo que eu levava a sério. MIGUEL: Você está com essa cara há meia hora. Não me diga que está pensando nela. Ella Fontana está tirando o juízo do meu grande amigo. Eu desviei os olhos da cidade e olhei para ele, devagar. Miguel sabe quando deve calar, mas às vezes esquece que há perguntas que não precisam ser feitas. “Estou pensando em resultados, Miguel. Só isso. Ella é só mais uma peça no tabuleiro.” Ele sorriu de canto, como quem não acredita. Mas eu não expliquei. Não precisava. Porque a verdade é simples: eu não tolero erros e não aceito falhas. Quem está ao meu lado precisa entender isso. Isabella Fontana… ela não entendeu. Não ainda. Hoje ela me enfrentou. No escritório, com o sarcasmo afiado. Na universidade, com a impulsividade estúpida. E, mesmo assim, eu não consegui tirá-la da mente desde então. Não porque gosto de desafios. Eu não jogo por diversão. Mas porque quando alguém sai do script, isso me incomoda. Isso exige ajuste. E Ella… Ela é um ajuste que eu ainda não decidi como fazer. MIGUEL: Tem que admitir, ele é incrível. Inteligente, astuta, e o principal de tudo. Corajosa. A menina te desafia com palavras o tempo todo, e se você é estúpido demais com ela, ela simplesmente se vinga. Miguel dava gargalhadas. Eu olhei novamente para a tv onde estava conectado meu telefone. O vídeo de Ella destruindo meu carro era inacreditável. “Ela nunca mais vai fazer isso… e ainda vai trabalhar noite e dia para pagar os estragos que fez no meu carro.” A campainha soou, interrompendo meus pensamentos. Era hora. Miguel se levantou, curioso. MIGUEL: Aposto que ela vem tremendo. Pega leve com a futura senhora Ravelli, hein! Não vai maltratar a mamãe de seus filhos! “ Cala boca Miguel, ou pode ir embora!” Eu sorri de leve, mas não era um sorriso amigável. Era um sorriso de quem sempre sabe o próximo passo. “Assim é melhor. O medo é um bom começo.” Peguei a pasta sobre a mesa e abri, revelando documentos que não deveriam estar nas mãos erradas. E, naquele instante, a única certeza que eu tinha era que Isabella precisava aprender duas coisas: disciplina… e até onde vai o meu poder quando alguém me testa. ELLA: Boa noite, senhores! Só estou aqui para entregar os documentos e dizer que eu agradeço a oportunidade, mas não pretendo mais trabalhar com vocês. Ela foi rápida, direta e certeira. Esperta… pelo menos achava que era. “Está se demitindo? Acho melhor não fazer isso, senhorita Fontana. Não antes de pagar o conserto do meu carro.” Apontei para a TV e ela parou no mesmo instante. Seus olhos seguiram minha mão até a tela, onde rodava a gravação da câmera de segurança. A imagem era clara: Isabella Fontana, em carne, osso e fúria, murchando os pneus do meu Mustang, chutando o retrovisor e ainda voltando para arranhar a pintura. “Eu quero uma explicação, Ella.” ELLA: Para quê? Não está vendo que eu surtei e descontei no seu carro? Você também não ajuda! É um pé no saco. Quando quer me irritar, consegue… e muito! Ela falou de costas, mas eu vi quando o corpo congelou ao perceber o tom que usou. ELLA: Ah… senhor, eu… desculpa. Não deveria falar assim. “Te garanto que a sua forma de falar, senhorita Fontana, é o menor dos seus problemas. Você me deve mais de cem mil dólares pelos estragos do meu carro.” Os olhos dela se arregalaram, e as pernas fraquejaram até fazê-la despencar no sofá. ELLA: Mas… mas foi só o retrovisor! Não pode ser tão caro assim! “O que você tem na cabeça, Isabella? Que ideia foi essa de destruir meu carro?” ELLA: Eu posso explicar… eu… o senhor foi insensível ao me colocar para fora da sala. Eu me esforcei o dia todo, dei o meu melhor, e na hora de ir para faculdade caiu um dilúvio. Fiquei com raiva, queria poder arrebentar o senhor, mas no ato da fúria acabei tendo essa péssima ideia! Cruzei os braços, respirando fundo. A sinceridade dela não suavizava o absurdo da situação. “Você não está entendendo, Ella. Isso não é um jogo. Você me causou prejuízo e vai pagar. Cada centavo.” Ela abaixou a cabeça, como quem sente o peso do abismo se abrindo sob os pés. “Você quer se demitir? Tudo bem. Mas antes vai quitar essa dívida… e, do jeito que eu conheço advogados recém-formados, você vai precisar trabalhar comigo por muito tempo para conseguir isso.” O silêncio cortou o ar. Só ouvi a respiração dela, pesada, trêmula. Quando falei novamente, minha voz foi um golpe calculado: “Agora, sente-se direito e abra os documentos. Vamos discutir a Rossi Corporation.” Ella obedeceu sem erguer o rosto. Os dedos tremiam ao folhear as páginas. Ela fingia ler, mas eu sabia que não enxergava uma palavra sequer. A tensão no corpo dela era evidente. E então, vi algo que não deveria me afetar, mas afetou: uma lágrima escorrendo pelo canto do olho. Ela secou rápido, mas não rápido o bastante para Miguel, que percebeu. MIGUEL: Já chega de trabalho por hoje. Vamos jantar! Você comeu, Ella? Eu levantei o olhar para ele, pronto para cortar sua intromissão, mas Miguel se adiantou, afastando-se e mostrando discretamente, atrás das costas dela, um gesto claro: ela está chorando. Engoli as palavras. “Tem razão, Miguel. Vamos comer alguma coisa e depois eu levo você para o seu apartamento.” Ella levantou o rosto de repente, séria, quase ferida no orgulho. ELLA: Não há necessidade. E eu não estou com fome. Miguel sorriu de lado, caminhando até a cozinha. MIGUEL: Você vai comer sim. Depois desse dia, se não alimentar esse corpo, vai desmaiar antes de chegar na porta. ELLA: Miguel, eu… MIGUEL: Sem Miguel. Senta aí que eu trago alguma coisa. Ella suspirou, vencida, e apoiou os braços no sofá, exausta. Eu a observei em silêncio, estudando cada expressão, cada reação. Ela não tinha noção, mas naquela noite, mais do que nunca, eu tinha certeza: Isabella Fontana não era só um ajuste no meu tabuleiro. Ela era a peça que podia mudar todo o jogo. A mesa estava posta, mas Miguel fez questão de trazer vinho, pão fresco e um prato quente para tentar aliviar a tempestade que pairava no ar. Ella se sentou na ponta, sem erguer os olhos, enquanto eu me acomodei na outra extremidade, estudando cada movimento dela. Devo admitir que essa garota bagunçou bastante minha vida. “Está uma noite agradável, não acha? Ideal para… despedidas.” Minha provocação atingiu o alvo. Vi os dedos dela apertarem o guardanapo, a respiração acelerando. Continuei, implacável: “Mas despedidas são luxos que só quem não deve nada pode ter. No seu caso, senhorita Fontana, sugiro que mastigue devagar… porque vai precisar de energia para trabalhar muito.” Ella levantou os olhos, e algo neles queimava como fogo. Quando falou, sua voz saiu firme, mas carregada de emoção: ELLA: Eu vou te pagar cada centavo, mas me recuso a ouvir seus desaforos. O fato de eu ser recém formada e estar iniciando agora não te dá o direito de me tratar desta forma. Portanto, senhor Ravelli… Ela ainda falava quando Miguel tentou intervir. MIGUEL: ELLA… ELLA, NÃO! ELLA: Vai para o inferno com sua arrogância! O som do copo batendo na mesa veio antes do impacto gelado no meu rosto. A água escorreu pelo queixo, encharcando a gola da minha camisa. Eu não me movi. Apenas vi, em câmera lenta, Ella se levantar, os olhos faiscando, e sair correndo porta afora. A porta bateu tão forte que ecoou pelo andar inteiro. O silêncio foi quebrado pela risada alta de Miguel, que se dobrou de tanto rir enquanto pegava um pano. MIGUEL: Meu Deus, Ethan! HAHAHA! Eu avisei… eu avisei que ia dar ruim! “Filha da mãe! Eu vou acabar com ela!” MIGUEL: Ei… segura a onda, grandão. Você provocou ela! Ethan, o que está acontecendo com você? Por que tanta implicância com essa menina? “Não é da sua conta, Miguel!” Arranquei a camisa, agora colada ao corpo, jogando-a sobre a cadeira. Meu peito subia e descia com a raiva, mas por dentro… algo mais pulsava. Algo que eu não queria nomear. MIGUEL: É da minha conta sim! Ela é minha funcionária também, e eu não quero que você volte a incomodar. A Ella é muito importante para mim. Tenho interesses no bem-estar dela. Soltei uma risada seca, carregada de sarcasmo. “Hahahahah! Que interesse? Que importância você viu nessa menina? Miguel Santis, não me faça quebrar a sua cara e acabar com a nossa amizade!” Ele riu ainda mais, como se tivesse vencido um jogo secreto, e deu um tapa no meu ombro. MIGUEL: Você tem sim uma queda por Isabella Fontana. Já pensou em conhecer a família dela? Olhei para ele com um sorriso perigoso, aquele que até meus inimigos aprenderam a temer. “Uma mãe submissa ao pai. Um irmão que acha que sabe o que é honra, mas vendeu a alma para pagar as dívidas. E um pai… ah, um pai que prefere esconder a própria sujeira embaixo do tapete do que encarar a verdade.” Miguel arqueou as sobrancelhas, surpreso. MIGUEL: Você… pesquisou a família dela? “Eu pesquiso tudo, Miguel. Antes de colocar alguém na minha equipe, eu sei até o que ela sonhava quando tinha cinco anos.” MIGUEL: Você é um lunático, cara. Um lunático obcecado. “Eu sou um estrategista. E agora, Miguel…” limpei os últimos respingos de água no rosto, fitando meu próprio reflexo na vidraça. “... eu vou ensinar a senhorita Fontana o significado da palavra submissão. E ela será minha de todas as formas possíveis!”






