O amanhecer tingia o céu de cinza quando Dominic bateu na porta do quarto onde Valentina tinha passado a noite. Não havia batidas apressadas, apenas três toques firmes, ritmados, como se estivesse avisando que não era um pedido.
— Levanta, princesa. Temos um lugar para visitar.
Ela abriu a porta e o encontrou encostado no batente, camisa social preta dobrada até os cotovelos, o perfume amadeirado dominando o ar. Atrás dele, Victor segurava uma pasta e um coldre preso na cintura.
— Isso é sobre as fotos de ontem? — perguntou ela, cruzando os braços.
Dominic deu um meio sorriso. — Digamos que… é um teste. Quero ver até onde você consegue ir sem se queimar.
O carro preto os levou por ruas que pareciam ainda adormecidas. Dentro, o silêncio era cortado apenas pelo som do motor. Valentina fingia observar a paisagem, mas cada esquina que passava ela memorizava mentalmente. Se precisasse fugir… cada detalhe poderia ser útil.
Quando chegaram, Victor abriu a porta para ela. Estavam diante de um prédio comercial discreto, sem letreiros, mas com seguranças na entrada. Dominic caminhou à frente, postura relaxada, como se pertencesse àquele lugar.
— Hoje você vai me apresentar como um contato seu — disse ele, baixo, sem virar a cabeça. — Quero ver como improvisa.
Valentina sentiu o alerta subir pela espinha.
— E se eu não quiser mentir por você?
— Então vamos ver o quão convincente você é… quando a verdade te coloca na linha de tiro.
Eles atravessaram o hall e entraram num elevador espelhado. Dominic encostou-se na parede, observando-a como quem mede o tempo até a próxima jogada.
— Lembre-se, princesa… — murmurou, a voz quase roçando seu ouvido — …cada palavra sua hoje decide se sai daqui andando… ou carregada.
As portas se abriram no último andar.
E à frente deles… estava o primeiro homem das fotos.
O homem das fotos estava parado junto à mesa de vidro, conversando com outra pessoa. Terno azul-marinho impecável, cabelo penteado para trás, um sorriso treinado para negócios — mas o olhar… esse era frio e calculista.
Valentina sentiu o sangue gelar. Ela conhecia aquele olhar. Era o mesmo que vira em encontros com gente que não hesitava em destruir vidas por lucro.
Dominic diminuiu o passo, dando a ela o espaço para assumir a liderança. Era o tipo de gesto que parecia cortesia, mas na verdade era pressão: se ela não conduzisse a cena, ele veria isso como fraqueza.
— Valentina? — o homem a reconheceu com um tom curioso. — Não esperava te ver por aqui.
Ela forçou um sorriso controlado, cada músculo treinado para não demonstrar nada além de segurança.
— Achei que estava na hora de apresentar um… aliado.
O olhar do homem passou para Dominic, avaliando-o. Dominic não disse nada, apenas sustentou o contato visual como se estivesse desafiando o outro a tentar medir seu valor.
— Aliado em quê, exatamente? — perguntou o homem, a sobrancelha erguida.
Valentina respirou fundo, sentindo o peso da presença de Dominic ao lado.
— Em oportunidades… que não aparecem todos os dias.
Houve um silêncio breve, quase imperceptível, mas suficiente para ela saber que o homem estava tentando decifrar as entrelinhas. Dominic, porém, parecia relaxado, como se já tivesse previsto cada palavra dela.
— Interessante — respondeu o homem, gesticulando para que se sentassem. — Então vamos conversar.
Enquanto tomavam lugar à mesa, Dominic inclinou-se levemente para Valentina, falando tão baixo que só ela pôde ouvir:
— Até agora… você está sobrevivendo. Vamos ver se sai viva dessa sala.
O homem cruzou as mãos sobre a mesa, inclinando-se para frente.
— E me diga, Valentina… como exatamente você conheceu o seu “aliado”?
O tom parecia casual, mas havia um peso oculto na pergunta. Não era curiosidade. Era sondagem.
Ela manteve o olhar firme. — Em um evento privado, fora do país. Um contato mútuo nos apresentou.
— Nome do contato? — insistiu ele.
Por dentro, Valentina sentiu a tensão subir. Inventar era arriscado, mas dizer a verdade não era opção. Antes que ela respondesse, Dominic interveio, sua voz baixa e segura:
— É irrelevante. O que importa… é que eu estou interessado no que você pode oferecer.
O homem desviou o olhar para Dominic, estudando-o com atenção. A sala parecia encolher, o ar ficando mais pesado.
— E o que exatamente acha que eu tenho para oferecer?
Dominic sorriu, aquele sorriso que não revelava nada.
— Informação. E eu pago bem por ela.
A troca de olhares entre os dois homens parecia um duelo silencioso. Valentina sabia que estava no centro de algo maior do que esperava — e que uma palavra errada poderia transformá-la em alvo.
Então, o celular do homem vibrou sobre a mesa. Ele atendeu, o rosto mudando ligeiramente ao ouvir a voz do outro lado. Quando desligou, o sorriso dele voltou… mas agora havia algo frio, cortante.
— Curioso… — disse ele, os olhos fixos nela. — Acabei de saber que você esteve fazendo perguntas sobre mim, Valentina.
O coração dela disparou. Dominic, porém, apenas recostou-se na cadeira, um brilho quase satisfeito nos olhos.
— Parece que seu teste começou de verdade, princesa — murmurou ele, sem desviar o olhar do homem à frente.