Apollo não dormia há dois dias.
Desde o momento em que fechou a porta e viu Laura ir embora, com os olhos cheios de mágoa e a alma quebrada pela sua mentira, algo dentro dele se partiu. Ele repetia mentalmente tudo o que disse, cada palavra fria, cada olhar desviado. Tinha sido covarde. Tinha deixado o orgulho falar mais alto que o coração. E agora… ela estava longe. Mas o que doía mais era saber que talvez já fosse tarde demais. --- Na manhã de domingo, Apollo andava sem destino pelas ruas da cidade, o coração pesado. Pensou em mandar uma mensagem, ligar, aparecer na porta dela e dizer a verdade. Que tinha mentido porque tinha medo. Que não sabia amar do jeito certo, mas que mesmo assim, a amava. Ele passou em frente à praça onde costumavam andar quando eram adolescentes. E foi ali que o mundo dele parou. Laura estava lá. Sentada no banco de madeira pintado de branco, as pernas cruzadas, rindo. Rindo de novo. E ao lado dela estava Davi. A cena era um soco no estômago. Apollo se aproximou, devagar, com os punhos cerrados. A raiva misturada com ciúmes corroía sua calma. Davi tocava no braço de Laura de forma carinhosa, inclinando o corpo para mais perto. E ela não se afastava. O sangue ferveu. Ele nem percebeu quando começou a andar mais rápido. — Que cena bonita — Apollo disse, a voz carregada de veneno. Laura virou, surpresa, o sorriso apagado num segundo. — Apollo? O que você tá fazendo aqui? — Eu podia te perguntar a mesma coisa. Mas acho que já entendi a resposta. — Ele olhou para Davi. — Pelo visto, você não perdeu tempo. Davi se levantou devagar, os olhos firmes. — A gente só tá conversando, cara. Relaxa. — Conversando? Engraçado… parece mais um teatrinho. Você sempre teve esse dom, né, Davi? De aparecer quando não é chamado. — E você sempre teve o dom de ferrar com as coisas boas que tem — retrucou Davi, dando um passo à frente. — Ela tava chorando por sua causa, sabia? E agora quer bancar o macho protetor? O tapa não veio. Veio um soco. Rápido. Instintivo. E completamente impensado. Apollo avançou, empurrando Davi com força. O outro revidou, e logo os dois estavam se socando ali mesmo, no meio da praça. Laura gritou, correu para tentar separar, mas os dois estavam cegos, dominados por orgulho, frustração e tudo o que ficou entalado nos últimos dias. — Parem! — ela gritou, se colocando entre os dois, com as mãos abertas. — Apollo, para com isso! Você tá louco? Apollo ainda respirava pesado, o lábio sangrando. Davi estava com a camisa rasgada, o olhar inflamado. — Isso é o que você chama de arrependimento? — ela perguntou, encarando Apollo. — É assim que você resolve as coisas? — Ele tava com você! Tocando em você como se fosse dele! — Eu não sou de ninguém! — ela gritou, a voz tremendo. — E você… depois do que me disse? Depois de dizer que não sentia nada? Apollo fechou os olhos, como se as palavras dela fossem facas. — Eu menti. Silêncio. Davi olhou para os dois e se afastou, sem dizer mais nada. Laura permaneceu ali, parada, respirando fundo para não desabar. — Eu menti, Laura — Apollo repetiu, mais baixo. — Eu falei aquilo porque estava com medo. Medo de te perder. Medo de me perder em você. E quando te vi com ele… eu surtei. Eu estraguei tudo. Ela engoliu em seco. As lágrimas já estavam nos olhos, mas ela as segurava com força. — Então você prefere me afastar com uma mentira do que me deixar entrar? Apollo, eu te esperei. Esperei que você fosse corajoso. Que você me escolhesse de verdade. Mas no primeiro sinal de dúvida, você fugiu. E agora acha que um pedido de desculpas conserta tudo? — Não. Eu sei que não. — A voz dele estava embargada. — Mas eu não podia mais guardar isso. Eu te amo, Laura. Não sei como lidar com isso ainda, mas é real. E não suporto te ver com ele. — Você não pode me amar e ao mesmo tempo me machucar desse jeito. Ele se aproximou, devagar. — Eu não sabia o quanto te magoei até te ver indo embora. E agora… agora eu só quero a chance de tentar acertar. Laura respirou fundo, sentindo o coração em guerra com a razão. — Eu preciso pensar. Apollo assentiu, respeitando o espaço que nunca soube dar antes. E ela, com lágrimas nos olhos, se virou e foi embora. Dessa vez, ele não tentou impedi-la. Mas, no fundo, sabia que aquela não era a última página da história dos dois. Era só o capítulo mais doloroso.