As semanas entre o pedido de casamento e o grande dia passaram como uma neblina perfumada de flores e protocolos. Richard e eu estávamos sempre cercados de sorrisos, brindes e promessas que, embora vazias de emoção crua, eram preenchidas por uma sensação reconfortante de pertencimento. Ele era bom. Dedicado. Cortês.
— Eu farei de você a mulher mais feliz desse mundo — ele me disse certa noite, após colocarmos juntos a última pedra do convite de casamento. E, por algum motivo, eu acreditei.
A preparação para a cerimônia ocupou todas as mulheres da casa. Minha mãe comandava tudo como uma verdadeira geral: da escolha dos pratos à paleta de cores da decoração.
— Lavanda, Lucy. Lavanda traz paz e elegância — dizia, como se estivesse revelando o segredo da vida eterna. Eu apenas sorria, porque sua empolgação era mais importante do que minhas opiniões sobre flores.
Dois dias antes da cerimônia, realizamos o ensaio na villa toscana onde aconteceria a festa. A propriedade, pertencente a um antigo duque amigo da família, era quase irreal: jardins com fontes esculpidas, pérgolas cobertas de glicínias e uma piscina de borda infinita que parecia tocar o céu.
Era ao lado dessa piscina que eu estava com minha mãe, enquanto os garçons praticavam a entrada com bandejas de champanhe. Sentadas em espreguiçadeiras, eu e ela trocamos impressões sobre o vestido, o clima, e — inevitavelmente — sobre Richard.
— Ele é bonito — ela comentou, com aquele olhar de quem analisava mais do que apenas a aparência. — Mas o que mais gosto nele é que ele parece saber o lugar dele no mundo. Isso é raro.
— E eu pareço saber o meu? — perguntei, mais por provocação do que por insegurança.
Ela sorriu, virando o rosto para mim.
— Você sempre soube, Lucy. Desde pequena. Você nasceu para liderar, não para ser conduzida.
Antes que eu pudesse responder, ouvimos um grito.
— Adivinha quem ganhou o torneio de esgrima no colégio? — disse Jasper, correndo em nossa direção com o uniforme desabotoado e um sorriso de raposa.
— Aposto que você trapaceou — provoquei, rindo.
— Eu prefiro chamar de estratégia de ataque rápido.
Jasper fazia piadas enquanto pulava entre as pedras do jardim, perto da piscina. Mas então, ao fingir um golpe de esgrima imaginário, tropeçou em uma das almofadas decorativas. Desesperado para não cair, ele se jogou em minha direção.
— Jasper, não! — gritei.
Tarde demais.
Ele me agarrou pela cintura e, no impulso, me desequilibrei. A única coisa que vi foi o céu girando — e então, meu corpo colidindo contra algo quente e sólido antes de ambos mergulharmos na água.
O impacto foi tão repentino que me tirou o ar.
Emergi arfando, com os cabelos colados ao rosto, e quando tentei abrir os olhos, dei de cara com um homem. Um homem molhado. Um homem muito bonito. Seus olhos eram escuros, suas sobrancelhas arqueadas em um misto de surpresa e diversão. Ele me segurava em seus braços com firmeza, como se fosse natural me proteger de qualquer coisa.
— Você tem o costume de cair em cima de estranhos ou é uma técnica nova de flerte? — ele perguntou, a voz baixa e carregada de ironia.
— Me larga! — disse, tentando sair dos seus braços, mas meu corpo não colabora.
Ele riu, um som rouco que me causou arrepios.
— Claro. Mas vou sentir falta da sua forma dramática de dizer olá.
Consegui me soltar, e saí bufando dali. Fui nadando até a borda e saí da piscina com a dignidade de uma princesa afogada. Minha mãe correu até mim com uma toalha, mas eu mal conseguia falar. Não pelo tom debochado dele — embora tenha sido irritante —, mas pela maneira como seu toque me incendiou. Nunca, nem nos momentos mais íntimos com Richard, meu corpo reagirá assim.
— Quem é ele? — perguntei, ainda recuperando o fôlego, enquanto Jasper se desculpava de novo e de novo.
— Silas Desmond — disse minha mãe, entregando a toalha. — Primo de Richard. Veio dos Estados Unidos. Não sabia que ele viria para o ensaio, por quê, querida?
— Nem eu. E podia muito bem ter ficado lá, que inconveniente!
Ela me olhou de lado, rindo baixinho. Eu não consegui acompanhar. A presença dele era como um raio de calor num dia de primavera: inesperado, e impossível de ignorar. Mas eu tinha muitas outras coisas para me preocupar e esse incidente tinha que ficar para trás.
O tempo passou rápido demais. Me recuperei do banho inesperado e do "moreno mal educado" com ajuda da minha melhor amiga, Chiara — uma herdeira ítalo-brasileira de riso fácil e coração leal. Nós éramos amigas há anos e claro que ela não ia ficar longe de mim em um momento tão importante. Estávamos juntas, e passamos a véspera do casamento rindo no quarto, entre camadas de cremes, música clássica suave e confissões sussurradas.
Na manhã seguinte, a igreja era uma visão. Vitrais coloriam os bancos com luzes que dançavam ao som do coral. Meu pai me ofereceu o braço com um olhar emocionado.
— Você está deslumbrante, minha pequena. Sua mãe vai chorar.
— E você?
— Vou me controlar. Talvez.
Caminhei até o altar como quem mergulha em um sonho antigo. Richard estava lá, me esperando, e quando seus olhos encontraram os meus, eu me senti... segura. Não apaixonada, mas ancorada. Como se ele fosse o porto onde minha alma pudesse repousar.
O “sim” saiu dos nossos lábios em uníssono. A festa foi exuberante, cheia de sorrisos, danças, taças erguidas e promessas sem palavras.
Mas o que ficou gravado em mim foi o momento no jardim, mais tarde, quando mamãe me abraçou de lado e disse:
— Esse é o começo, Lucy. Não o fim. Lembre-se disso.
Foi a última vez que a vi sorrir daquele jeito.
Na noite da lua de mel, Richard e eu estávamos na mansão nova — uma casa de campo reformada, que era puro mármore e cortinas de seda. Eu estava no quarto, sentada na beirada da cama, quando ele entrou.
— Você está linda — disse ele, sua voz mais rouca do que nunca.
Me aproximei.
— E você está nervoso.
— Um pouco — ele admitiu, tirando a gravata. — Mas no melhor sentido.
Nos beijamos devagar. O toque dele era familiar, mas agora mais urgente. As mãos dele deslizaram pelas minhas costas nuas, e pela primeira vez senti um tipo de curiosidade nova.
Nos deitamos, e quando ele se debruçou sobre mim, com os olhos cheios de desejo, deixei o vestido escorregar pelos ombros.
Naquele instante, Richard era meu marido.
Mas, por um milésimo de segundo, meu corpo se lembrou de outro toque. O toque quente, forte, irreverente que eu preferia não ter conhecido, e a qual afastei o mais rápido que consegui.
Mesmo assim, essa lembrança me fez arfar.