Lorena
Tem noite que o silêncio grita.
Grita tão alto que até os ossos escutam.
Aquela foi uma dessas noites.
Kaíque dormia ao meu lado, o corpo jogado na cama como quem acabou de travar uma batalha. E ele travou. Mas na favela, as guerras não têm hora de acabar. Nem data pra começar. Elas só vão mudando de forma — de tiro pra ameaça, de soco pra silêncio, de fuga pra sobrevivência.
Eu não consegui pregar o olho. Fiquei deitada, olhando pro teto mofado, como se pudesse ver através dele. Cada som virava um alerta: Moto passando devagar demais. Latido que não parava. Um passo no beco, depois dois… depois o nada. Mas o nada era o mais assustador. Porque às vezes, o que mata é o que você não vê chegando.
Meu corpo tava na cama.
Mas minha alma?
Minha alma tava armada, em pé, esperando o próximo baque.
Quando o sol começou a clarear o barraco, me levantei devagar, tentando não acordar ele. Kaíque precisava de descanso. E eu precisava fingir que estava tudo bem.
Fiz café, botei a água do fei