O quarto era bonito demais. Cortinas esvoaçando com o vento salgado do mar, lençóis brancos impecáveis, uma poltrona azul em um canto, e o silêncio… Deus, o silêncio.
Mas era um silêncio estranho. Denso. Quase afiado. O tipo de silêncio que avisa: você vai lembrar disso pelo resto da vida. Isadora estava sentada na beirada da cama, espremendo a barra do casaco. Não entendia como tinha chegado ali. Ou pior: por que ainda estava. Enzo estava perto — mas parado. Encostado na parede, como se tivesse medo de quebrá-la com um gesto errado. — Está tudo bem? — ele perguntou, voz baixa, rouca. Uma fresta na tensão. Ela hesitou. Não sabia. O peito apertava de um jeito estranho. Como se algo estivesse prestes a acontecer… e já fosse tarde demais para impedir. — Se quiser ir embora, eu levo — continuou. — Eu só… queria fugir. Um pouco. Com você. Ela assentiu, mas não falou. O coração batia rápido demais para sustentar palavras. Ele caminhou até ela e se sentou. Próximo o suficiente para que ela sentisse o calor, mas longe o bastante para que fosse escolha dela. — Às vezes, parece que vivo a vida de um fantasma — ele murmurou. — Tudo ao meu redor grita poder, herança, sangue. Mas eu? Eu só obedeço. E finjo que não estou sufocando. Isadora o olhou de lado. — A Valentina é perfeita no papel. Mas não é... real. É política. Aliança. Aparência. Silêncio. — Mas você — ele disse, virando-se para ela — você é a única coisa de verdade que encontrei em muito tempo. E foi aí que o chão começou a ceder. Enzo tocou os dedos dela com uma delicadeza que contradizia tudo o que ele parecia ser. As mãos dele, tão seguras, agora hesitavam — como se pedissem permissão. — Você é o que eu queria. Mas não devia. Ela prendeu a respiração. Ele se aproximou mais. Devagar. Os olhos nos dela. As mãos em seu rosto. E então, ele a beijou. Não foi apressado. Nem faminto. Foi terno. Demorado. Como se ele estivesse tentando memorizar o gosto dela. Mas aquilo não durou. Porque logo o beijo se intensificou. E quando ele a puxou para o centro da cama, ela foi. Por escolha. Por necessidade. Por um desejo que ela fingia não conhecer. As roupas caíram como promessas quebradas — uma a uma. Era a primeira vez dela. E mesmo sem dizer, ele parecia saber. — Você é linda — ele sussurrou. — Eu juro que ninguém vai machucar você de novo. Ela acreditou. O corpo dela reagiu como se estivesse sendo curado. Tocada por mãos que pediam e não tomavam. Amada por um momento que parecia infinito. Quando ele a penetrou, ela chorou. Mas não de dor. Chorou pela menina esquecida, pela adolescente invisível, pela mulher que, por um instante, foi escolhida. Depois, deitada sobre o peito dele, traçou círculos lentos na pele com a ponta dos dedos. — E a Valentina? Ele demorou. — Eu resolvo isso — murmurou. — Você merece mais. Ela sorriu. E dormiu achando que, talvez, merecesse mesmo. *** O sol já havia subido quando ela acordou. A cama ainda estava quente, mas vazia. A camiseta dele — que antes estava na poltrona — havia sumido. O relógio também. O cheiro dele… desaparecera. Isadora se sentou devagar. O silêncio agora era outro. Gélido. Um aviso. Vestiu o casaco com as mãos tremendo. Desceu as escadas com o estômago já em queda livre. Na garagem, um carro a esperava. — Ele mandou você? — perguntou ao motorista desconhecido. — Tenho ordens de levá-la de volta, senhorita. Só isso. Ela entrou sem dizer nada. O peito doía de um jeito que não dava para explicar. Durante o trajeto, tentou racionalizar: ele só saiu para resolver algo urgente. Voltaria. Ligaria. Daria explicações. Mas nenhuma desculpa silenciava o alerta no peito: você foi usada. *** Assim que chegou à mansão, um funcionário a interceptou. — Senhora Clarisse quer vê-la. Agora. Na sala principal. Isadora congelou. O mundo estava prestes a ruir. E ela sabia.