POV: ISADORAO copo de cristal antigo rangia sob o pano de algodão, e Isadora limpava cada curva como se sua vida dependesse disso. Talvez dependesse. A superfície translúcida refletia seu rosto, mas distorcido — o que ela mais reconhecia nele. Um olho mais largo, a boca fina puxada para o lado errado, o nariz achatado pelo ângulo do vidro. Ela olhou por alguns segundos, hipnotizada. Às vezes, era assim que se sentia: um erro de forma, uma presença deslocada no lugar errado. Estava descalça. Os pés sujos pelo mármore lustroso da mansão Diniz. Suava sob a camisa branca de manga longa, que era dois números maiores e emprestada da lavanderia. Invisível — como sempre.— Senhorita Isadora, a senhora quer que eu leve os vinhos agora? — perguntou o novo ajudante, um adolescente com olhos gentis e a camisa amassada. Ela abriu a boca para agradecer, mas antes que qualquer som saísse, a governanta cruzou o salão com passos firmes.— Não a chame assim — disse, ríspida. — Ela não é da famíl
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