Capítulo 1: Onde Não Se Pertence O copo de cristal antigo rangia sob o pano de algodão, e Isadora o limpava com uma precisão quase desesperada. Cada curva polida era um lembrete: se não fosse perfeita nos detalhes, seria invisível no todo. Talvez já fosse. A transparência do vidro refletia seu rosto, mas o distorcia como um espelho quebrado — um olho maior, a boca desalinhada, o nariz desfigurado pela curvatura. Às vezes, era assim que ela se sentia: um erro de perspectiva. Uma peça fora do lugar. Descalça, os pés sujos sobre o mármore da mansão Diniz, ela suava dentro da camisa branca, larga demais, emprestada da lavanderia. Cada passo era um lembrete de que estava ali de favor. E, ainda assim, queria sumir menos do que queria pertencer. — Senhorita Isadora, a senhora quer que eu leve os vinhos agora? — perguntou o novo ajudante, um garoto de olhos gentis e camisa amarrotada. Ela mal abriu a boca para responder quando a voz da governanta cortou o ar como um chicote: — Não a cha
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