4: Brindes e Cacos

As flores eram brancas.

Brancas como véus. Como rendas. Como mentira bem apresentada.

Cada arranjo exalava um perfume doce demais, enjoativo, sufocante. As taças de cristal empilhadas em torre refletiam a luz dourada do lustre como pequenos espelhos distorcidos — bonitos, mas quebráveis.

Isadora entrou com a bandeja nos braços, o corpo rígido, os dedos trêmulos tentando sustentar o pouco de dignidade que lhe restava. Dormira mal — ou quase nada. O corpo ainda carregava o toque dele como uma marca secreta, impossível de apagar.

Mas ele tinha sumido. E agora, ali, o mundo sorria como se nada tivesse acontecido.

— Pegue a bandeja com o champanhe. E sorria. — Clarisse surgiu ao lado como um fantasma disfarçado de anfitriã. O rosto polido, mas a voz cortante. — Está pálida. Vai assustar os convidados.

Ela obedeceu. Pegou a bandeja mais cheia. Endireitou os ombros. E entrou no salão.

A música era um sussurro elegante de violinos. Convidados com taças em mãos, risos contidos, olhares calculados. Tudo muito bonito. Tudo muito podre.

Foi quando o viu.

Enzo.

De pé ao lado de Valentina. Blazer escuro. Postura impecável. Cabelo perfeitamente arrumado. O mesmo sorriso neutro — aquele que não dizia nada.

Ele não olhava para ela.

Ou fingia não olhar. O que doía mais.

Valentina estava deslumbrante. Vestido branco com aplicações douradas. Cabelo preso em coque baixo. A beleza dela parecia feita sob medida para ferir.

O peito de Isadora apertou. Não sabia se era raiva. Ou vergonha. Ou a sensação de que tudo tinha sido uma armadilha.

Clarisse ergueu a taça. O salão silenciou.

— Esta noite é especial para nossa família — anunciou. — Representa uma nova era. Um laço entre nomes fortes. Uma união de honra.

União.

A palavra soou como um tapa.

— Com orgulho, apresento o futuro marido da minha filha Valentina: Enzo Bianchi.

O ar desapareceu.

A garganta de Isadora fechou. O salão girou em câmera lenta. Os aplausos pareciam abafados, distantes, como se ela estivesse submersa.

Valentina ergueu a mão com um anel grotescamente grande. Enzo curvou-se e beijou a mão dela como um cavalheiro de novela barata.

Ele não olhou para Isadora. Nem uma vez.

A bandeja começou a vibrar. O tilintar das taças soava como escárnio.

“Ele vai olhar. Vai explicar. Vai… qualquer coisa.”

Mas ele não fez nada.

Foi Valentina quem se aproximou. Sorriso doce como veneno destilado.

— Não derrame, querida. Sei que suas mãos tremem perto do meu noivo.

Alguns convidados riram. Riram como hienas.

Isadora segurou firme. Por dentro, queria gritar. Chorar. Quebrar tudo. Mas por fora? Um sorriso vazio. Um olhar baixo.

Clarisse passou por ela como uma brisa gelada e sussurrou:

— Acha mesmo que alguém como ele olharia para você? Tire esse brilho idiota dos olhos.

Foi ali que começou o zumbido.

Um som surdo. Crescente. Os rostos viraram manchas. As vozes, ruído. O salão parecia um redemoinho prestes a engoli-la.

Ela precisava sair. Agora.

— Com licença… vou trocar a bandeja — murmurou, sem olhar ninguém.

Subiu as escadas tropeçando em si mesma. Entrou no banheiro. Trancou. Caiu sobre a pia.

O estômago revirou como se quisesse expulsar mais do que comida.

E então vomitou. Com força. Várias vezes.

Era mais do que enjoo. Era rejeição em estado físico. Era o corpo gritando o que a alma tentava calar.

— Isadora?

A voz veio mansa. Clara, a funcionária mais antiga da casa, apareceu como um sopro de lucidez.

Ela correu até a menina no chão e segurou seu ombro, olhos arregalados.

— Meu Deus… você está gelada. Isso é só nervoso ou…?

Isadora não respondeu. Não conseguia.

Clara olhou para ela. Depois para a barriga. E algo mudou no rosto dela. Um tipo de sabedoria antiga se desenhou ali.

Com mãos cuidadosas, tocou o ventre dela por cima do tecido.

— Você precisa ver um médico — disse. — Isso não é normal.

Isadora arregalou os olhos.

E, pela primeira vez, o que parecia impensável… tornou-se possível.

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