O dia passou como uma névoa persistente. Selena tentou se ocupar. Organizou gavetas que não usava, varreu o jardim, ajudou a Anciã a separar ervas. Mas nada funcionava.
Darian ainda estava ali.
Não fisicamente. Mas dentro dela.
A cada minuto, a memória do encontro se arrastava como um toque invisível sobre a pele. Os olhos dele, a voz grave, o calor no ar... Era como se a floresta inteira ainda respirasse com o cheiro dele.
No início da tarde, ela tentou caminhar até a trilha de pedra que levava ao riacho. Queria distância. Ar. Mas o colar no pescoço queimava a cada passo que dava — como se dissesse: não fuja.
Ela voltou.
Frustrada. Confusa. E com raiva de si mesma por sentir falta de um estranho.
— Está começando — disse a Anciã, sem que ela dissesse uma palavra.
Selena parou no batente da porta, o coração ainda acelerado.
— O quê, exatamente?
A mulher mais velha não respondeu de imediato. Estava mexendo um líquido âmbar em um vidro escuro.
— O chamado. O laço. O despertar.
Você pode chamá-lo do que quiser. Mas o que está dentro de você… já escutou.
— E se eu me recusar a ouvir?
— O corpo vai ouvir mesmo assim.
Antes da mente.
Antes do coração.
Selena cerrou os dentes. Aquilo tudo parecia uma armadilha feita com seda: delicada, mas firme. E quanto mais lutava… mais presa se sentia.
Do outro lado da floresta, Darian estava de pé na varanda de pedra da fortaleza. As mãos apoiadas no corrimão frio, os olhos fixos na linha onde o céu tocava as árvores.
Ele sentia a respiração dela.
Mesmo distante.
Era como se houvesse um fio invisível entre seus corpos, esticado até o limite. E qualquer mudança no humor dela... puxava seu próprio peito com força.
— Ela está resistindo — disse Eleonora, aproximando-se em silêncio.
— Eu sei.
— E você está sofrendo por isso.
Darian fechou os olhos por um segundo.
— O vínculo está puxando antes que ela entenda o que significa.
Ela não devia sentir tudo tão rápido.
— Mas sente.
— Ela não vai confiar em mim.
Não agora.
Eleonora suspirou, séria.
— Então dê a ela o que nunca recebeu: tempo.
— O tempo não é mais meu aliado — respondeu ele, com a voz carregada de tensão.
Ela não retrucou. Apenas observou. O Alfa estava mais sombrio do que nunca — mas por trás da rigidez, havia um homem em conflito. Um homem tentando não perder o controle.
Na sala inferior da fortaleza, Theron observava tudo de longe.
As conversas abafadas, os movimentos de Darian, a presença cada vez mais constante de Eleonora.
Ele sabia o que estava por vir.
E não gostava.
Sozinho, ele puxou o pergaminho escondido sob o manto e o abriu em cima da mesa. Os símbolos antigos tremiam sob a luz da lamparina.
— Então... ela apareceu — murmurou.
— A peça que faltava.
Um sorriso torto desenhou-se no canto da boca.
— Vamos ver quanto tempo leva até se tornar... uma fraqueza.
À noite, Selena não suportou mais o peso da dúvida. Saiu da casa com o colar queimando sob a blusa fina, os pés movendo-se por instinto.
Dessa vez, não levou nada. Nem desculpas. Nem justificativas.
A floresta a envolveu sem resistência.
Os galhos não pareciam mais ameaçadores. Os sons noturnos não soavam como alerta. Era como se a natureza abrisse caminho para ela.
Na beira do bosque, o ar mudou.
Mais denso. Quase elétrico.
Selena parou.
Sentiu o arrepio subir pelas costas antes de perceber o que era.
Ele estava ali.
Darian.
Não surgiu imediatamente. Esperou nas sombras. Observou o modo como ela respirava, como o coração dela acelerava mesmo antes de vê-lo.
E então, saiu das árvores.
A presença dele era ainda mais poderosa à noite. Como se a escuridão não o escondesse — apenas o amplificasse.
Selena o encarou, sem se mover.
— Eu não devia estar aqui — disse, quase num sussurro.
— Mas está.
Ela mordeu o lábio inferior, raiva e desejo dançando dentro do peito.
— Isso… não é normal.
Não é lógico.
— Mas é real.
Ela desviou os olhos por um instante. Mas logo voltou a encará-lo.
— Eu ainda não acredito em você.
— Não precisa. Seu corpo já acredita por vocês dois.
A resposta a atingiu como um golpe manso — e verdadeiro.
Selena quis gritar. Chorar. Beijá-lo. Fugir.
Mas não fez nada.
Apenas ficou ali.
Com o coração batendo como tambor e o mundo inteiro reduzido àquele instante.
No alto da colina, Theron observava de longe.
E sorriu.
Porque onde há fogo...
Há oportunidade de destruição.