A imagem da pequena porta de serviço nos fundos do Banco Rossi & Filhos não saía da mente de Leonardo. Era uma dissonância na sinfonia de segurança ostensiva do edifício, uma nota aparentemente insignificante que, para um ouvido treinado como o seu, soava como uma promessa de vulnerabilidade. Passara os últimos dias imerso em plantas baixas genéricas da área, cruzando informações com os horários de entrega da empresa de catering que anotara. A passividade da observação à distância já não era suficiente. Ele precisava se aproximar, sentir o pulso daquele ponto cego.
A decisão de agir amadureceu durante uma madrugada de insônia, o silêncio do seu quarto temporário quebrado apenas pelo gotejar de uma torneira mal fechada – um lembrete constante das pequenas falhas em sistemas aparentemente perfeitos. Seu objetivo misterioso, a razão pela qual se submetia àquele jogo perigoso com os Costello, exigia que ele não fosse apenas um peão, mas um jogador ativo, capaz de influenciar o tabuleiro. E o Banco Rossi, por uma ironia cruel do destino, tornara-se o epicentro de seus planos e de seus tormentos.
Na manhã seguinte, Leonardo trocou seu disfarce de arquiteto pelo de um entregador genérico. Um boné desbotado sombreava seus traços, e um uniforme simples, adquirido sem muitas dificuldades no submundo dos contatos certos, completava a transformação. Ele não carregava nenhuma encomenda real; sua carga era o peso da observação atenta e dos riscos calculados. Posicionou-se num café barato do outro lado da rua dos fundos do banco, um lugar com visão privilegiada para a porta de serviço e o beco que a servia.
Por horas, ele mapeou a rotina. O caminhão de catering chegava pontualmente às 10h30. Dois entregadores descarregavam caixas e entravam por um leitor de cartão, seguido por um código numérico. A porta permanecia aberta por não mais que trinta segundos. Um guarda de segurança fazia uma ronda externa a cada duas horas, mas sua atenção parecia mais voltada para a rua principal. Leonardo notou a ausência de câmeras cobrindo o ângulo imediato da entrada de serviço, uma falha surpreendente.
Enquanto ele mergulhava nas sombras de seu planejamento, Sabrina Rossi vivia um raro momento de triunfo. Após semanas de insistência e uma apresentação apaixonada, conseguira convencer um dos diretores mais influentes do conselho do banco, um velho amigo de seu avô, a interceder por seu programa de reforço escolar. O projeto não seria cortado; receberia, inclusive, um pequeno aumento de verba.
"Eu sabia que você conseguiria, querida!" disse Eleonora Rossi, abraçando a filha no jardim da mansão. "Sua paixão é contagiante." Sabrina sorriu, aliviada. "Foi difícil, mas valeu a pena. Ver o rosto daquelas crianças… não tem preço." Seu pai, Lorenzo, embora ainda visivelmente tenso com suas próprias preocupações, ofereceu um raro sorriso de aprovação. "Você tem o espírito de sua avó, Sabrina. Uma lutadora." Contudo, a sombra em seus olhos não desapareceu. Naquela mesma manhã, ele havia autorizado a instalação de um novo sistema de monitoramento interno no banco e a contratação de mais dois seguranças para as rondas noturnas. A sensação de perigo iminente não o abandonava.
À noite, no quartel-general dos Costello, Leonardo apresentou suas observações iniciais a Don Vincenzo e Tulio. Rocco também estava presente, o desprezo em seu rosto mal disfarçado.
"A segurança da fachada é robusta, quase impecável," Leonardo começou, a voz neutra, enquanto desenrolava um croqui detalhado da área dos fundos do banco sobre a mesa do Don. "Mas há uma entrada de serviço com um protocolo de acesso previsível e cobertura de vigilância deficiente." Ele detalhou os horários, a falta de câmeras diretas, a rotina do guarda.
"Previsível?" Rocco zombou. "Você acha que vai entrar pela porta dos fundos como se fosse um rato?"
"Ratos costumam sobreviver em lugares onde leões famintos não conseguem entrar, Rocco," Leonardo retrucou, o olhar frio encontrando o do outro mafioso. "Eles são discretos e eficientes."
Don Costello observava a troca com um interesse calculado. "Continue, Leonardo."
"Com o disfarce certo e o timing preciso, é possível obter acesso à área de serviço," Leonardo prosseguiu. "Dali, dependendo da arquitetura interna, pode-se ter acesso a pontos menos protegidos, talvez até aos dutos de ventilação ou às plantas baixas detalhadas do sistema de segurança."
Um silêncio pesado pairou na sala. A audácia da sugestão, vinda de um recém-chegado, era palpável. Mas a lógica fria por trás dela era inegável.
"Isso é arriscado," ponderou Tulio, os olhos fixos no croqui. "Um erro, e todo o plano vai por água abaixo antes mesmo de começar."
"Todo grande prêmio envolve grande risco, Tulio," disse Don Costello, um brilho nos olhos. Ele se virou para Leonardo. "Você parece confiante em sua avaliação, rapaz."
"Confio em minhas observações," Leonardo corrigiu, sutilmente.
O Don sorriu, um sorriso fino e predatório. "Gosto disso." Ele bateu com os nós dos dedos na mesa. "Mas observações não enchem nossos cofres. Precisamos de ação. Precisamos de uma prova de que suas teorias funcionam na prática." Ele se inclinou para frente, a voz baixando para um tom conspiratório, mas carregado de autoridade. "Quero aquelas plantas baixas detalhadas do sistema de segurança do Banco Rossi. As verdadeiras, as que mostram cada câmera, cada sensor, cada ponto cego que seus olhos de 'arquiteto' ainda não viram."
Era isso. A tarefa. A prova de lealdade que o consolidaria ou o destruiria dentro da famiglia. Não era um pedido, era uma ordem. Obter os projetos de segurança de um dos bancos mais protegidos da cidade era uma missão quase suicida.
Leonardo sentiu o sangue gelar, mas seu rosto permaneceu uma máscara de impassibilidade. Aquilo o colocaria diretamente dentro do ninho da serpente, e o risco de exposição era imenso. Mas, por outro lado, aquelas plantas eram exatamente o que ele precisava, não apenas para o Don, mas talvez para seu próprio e misterioso objetivo.
"Considere feito, Don Costello," ele disse, a voz firme, selando seu destino.
Rocco bufou, incrédulo. "Ele nem piscou. Ou é muito bom, ou é um completo idiota."
"O tempo dirá qual dos dois ele é, Rocco," disse o Don, os olhos ainda fixos em Leonardo. "Mas, por enquanto, ele tem minha confiança. E minhas expectativas." Ele fez um gesto de dispensa. "Tulio, providencie o que ele precisar. Mas lembre-se, Leonardo," o Don acrescentou, quando Leonardo já estava na porta, "falhas, neste nível, não são toleradas. O preço é alto demais."
Leonardo apenas assentiu, sentindo o peso daquelas palavras como uma sentença. Ao sair da sala, a imagem de Sabrina Rossi voltou a assaltar seus pensamentos, seu sorriso inocente contrastando brutalmente com a escuridão da missão que ele acabara de aceitar.
Ele estava prestes a mergulhar de cabeça no coração do império dela, não como um observador, mas como um ladrão, um violador de segredos. E o preço daquela lealdade forçada aos Costello poderia muito bem ser a perda de qualquer resquício de humanidade que ainda habitava sua alma atormentada.
A grande tarefa fora dada. E ele, por motivos que iam muito além da simples obediência à máfia, estava pronto para cumpri-la.