Amélia Moreira
Acabei tomando o café da manhã sozinha, o silêncio daquela casa imensa era quase tão opressor quanto a presença de Inácio. Estava assistindo à televisão, sem realmente prestar atenção ao que passava, quando uma sombra loira parou na soleira da porta da sala. Minha postura imediatamente se enrijeceu. — Quem é você? — A voz era estridente, e os olhos azuis da mulher me percorreram de cima a baixo com um desprezo óbvio. Empinei o nariz e a encarei da mesma maneira, devolvendo o olhar com uma pitada de desafio. — Eu que te pergunto. Você está na minha casa! — rebati, o peito estufado, mesmo sabendo que meu "casamento" com Inácio era uma farsa. No papel, eu era a esposa. Então, sim, podia me considerar a dona daquele lugar. Certo? A loira soltou uma risada debochada, com os olhos se estreitando. — Como assim? Então é você, a mulherzinha que está tentando roubar o meu Nacho! — Ela concluiu, com a voz carregada de raiva e nojo. — Não sou eu, não! — disparei, apressada, meu cérebro já registrando a loucura da situação. — Claro que é você, sua sonsa! Agora mesmo vou te ensinar uma lição para não roubar mais o homem dos outros, sua putinha! — A loira berrou, e, sem aviso, partiu para cima de mim, as unhas afiadas em riste, puxando meu cabelo com força. A dor irradiou pelo meu couro cabeludo, e um acesso de fúria se acendeu em meu peito. Eu não era de levar desaforo para casa. E, principalmente, não deixaria ninguém me bater e sair impune. Revidei no mesmo instante, puxando o cabelo dela com a mesma intensidade. Era um emaranhado de gritos e puxões, um verdadeiro cabo de guerra capilar. — Mas o que está acontecendo aqui?! — A voz de Inácio explodiu, alta e furiosa, e ele estava parado na porta da sala, observando a cena patética. Me soltei da loira com um puxão final, arrumando meu cabelo bagunçado. A fulana, com uma agilidade surpreendente, se fez de vítima em segundos. — Nacho! Eu não fiz nada! Eu apenas perguntei por você e, do nada, essa louca me atacou! — ela choramingou, apontando para mim com um dedo acusador. — Até parece! Foi você que veio para cima de mim primeiro! — me defendi, indignada com a desfaçatez dela. — Não quero saber quem começou! A minha casa não é nenhum puteiro para ficarem se atracando! — Inácio bradou, a voz carregada de nojo, o rosto contorcido em uma carranca séria. Ele então virou-se para a loira, a expressão se suavizando minimamente. — Monique, o que faz aqui? — Como assim, "o quê"? Eu vim te ver, amor! — Monique falou, com uma voz melosa, e, sem perder tempo, foi na direção dele, abraçando-o com uma intimidade que me fez revirar o estômago. — Senti saudades, e você? Sentiu saudade minha também? Senti uma onda de raiva me consumir ao ver aquela cena. A ousadia daquela mulher e a passividade de Inácio me irritavam profundamente. — Já conversamos sobre isso, Monique. Não vou repetir — Inácio disse, com uma voz fria, e se soltou da mocreia com um empurrão discreto. — Não me toque novamente. — Sua voz era um aviso. — Ai, querido, deixa de ser careta! — Monique riu, tentando disfarçar o constrangimento. Ela então virou-se para mim, um ar de superioridade. — Aí, me diz, quem é ela? Um sorriso diabólico brotou em meus lábios. Essa era a minha chance de apimentar as coisas. — Ele não te contou? Sou a esposa dele, prazer, querida. Amélia Moreira Hall. — Minha voz saiu doce, mas carregada de veneno, só para provocá-la. O rosto de Monique empalideceu. — Ela realmente é...? — Sim. Agora que já sabe quem é ela, pode ir embora e não se preocupe em voltar — Inácio falou, sério, a voz cortante como lâmina. — O que você quer dizer com isso? E nós? — Monique perguntou, incrédula. — Nós? Nunca existiu "nós", Monique. Se toca. Você era apenas uma distração. Agora que sou casado, não vou precisar me distrair — disse ele, com uma frieza que me deu calafrios, mesmo que as palavras fossem para ela. — Isso é um absurdo! Não vou aceitar que acabe tudo por causa de umazinha! — Monique esbravejou, histérica, o rosto vermelho de raiva. — O que disse?! Tá querendo levar na cara de novo?! — falei, dando um passo em sua direção, pronta para a briga. — Ela não tem nada a ver com isso, Monique. Como eu disse, nunca existiu "nós". Então não tem por que colocar a culpa nos outros. A partir de hoje, o nosso relacionamento será unicamente sobre trabalho. Fora isso, não precisa me procurar — Inácio falou, sua voz tão fria que poderia congelar o inferno. — Bom, já que vocês terminaram a conversinha de vocês — disse, sentindo um prazer sádico. — Caia fora da minha casa, sua vaca! Já estou cansada de olhar para sua cara de puta! — Sem pensar duas vezes, agarrei o cabelo dela novamente e a arrastei até a porta. — Foi um prazer, viu? Espero nunca mais te encontrar! — E bati a porta na cara dela com um estrondo satisfatório. Virei-me para Inácio, fervendo de raiva, o sangue pulsando em minhas têmporas. A cena com Monique havia acendido uma nova chama em mim, uma necessidade de estabelecer limites. — Posso não gostar da ideia de estar casada com você, mas já que não tem jeito de anular esse casamento, espero que me respeite. Não vou admitir que traga as suas "fodas" para dentro da minha casa. Aliás, é bom que eu não descubra nem um chifre! Caso contrário, darei o troco — falei, a voz firme, meus olhos fixos nos dele, desafiando-o. Os olhos de Inácio se arregalaram. Ele me agarrou pelos braços, apertando com força. — O que está dizendo, Amélia?! Seria capaz de me trair?! — Seu olhar era raivoso, mas não me assustava. Não sou nenhuma idiota. Não abaixaria a cabeça para esse ogro de gelo. — Isso mesmo! É bom você pensar muito bem antes de agir, querido. Pois, como dizem por aí: "chifre trocado não dói" — falei, um sorriso desafiador em meus lábios, e me soltei dele, indo em direção ao meu quarto, deixando-o para trás. Me tranquei e me deitei na cama. Eu precisava dar um jeito na minha vida. Não podia passar o dia todo trancada naquela casa, naquele quarto. A raiva de Monique e a declaração a Inácio me deram um novo fôlego. Tomei um banho rápido, a água fria ajudando a clarear a mente. Ao terminar, me enrolei na toalha e entrei no closet, disposta a encontrar uma roupa que não fosse os vestidinhos que Inácio havia comprado. Essa noite, eu sairia e me divertiria. Era uma promessa a mim mesma. Inácio me esperava na sala. — Para onde vai vestida desse jeito? — perguntou ele assim que pus meus lindos pés para fora do quarto, com o vestido de festa que eu havia encontrado, com brilhos e uma fenda lateral. — Caso não tenha percebido, Inácio, eu vou sair! — falei, sarcástica, dando uma volta para que ele pudesse ver a roupa. — Não sem mim e nem com essa roupa — ele disse, a voz séria, um tom que não aceitava discussão. Revirei os olhos. Era só o que me faltava. Além de me aprisionar em um casamento sem amor, agora queria mandar nas minhas roupas também? — Ninguém manda nas minhas roupas! E depois, se não queria que eu usasse, por que comprou então? — disparei, lembrando-me de ter encontrado o closet repleto de roupas para mim, já compradas. O rosto de Inácio se contorceu. — Eu comprei? Xz, eu te mato! — resmungou ele, claramente irritado com Xz por ter escolhido aquela roupa ousada. Ele respirou fundo, tentando se acalmar. — Troca de roupa. Eu te levo para onde quiser. — Sua voz estava mais calma, mas a ordem ainda estava lá. — Me leva mesmo, Inácio? Porque não conheço nada aqui e não quero correr o risco de me perder. Mas não vou trocar de roupa — falei firme, impondo minha condição. Ele voltou a sentar no sofá, e um sorriso de escárnio surgiu em seus lábios. — Então não vou te levar! Olhei para ele, incrédula. Esse babaca! — Escuta aqui, seu babaca! Nem pense que vou ficar trancada nessa casa o dia todo. Eu vou sair com ou sem você! — Rosnei, e, sem esperar resposta, saí de casa batendo a porta com força. No caminho para o portão principal, encontrei o rapaz de hoje mais cedo, Xz. Ele estava encostado em um carro esportivo, mexendo no celular. — Oi — comentei, sem graça, meio hesitante. — Eh, você disse mais cedo que se eu precisasse era só te chamar, né? Um sorriso enorme se espalhou pelo rosto de Xz. — Manda, Chefinha! No que posso te ajudar? — Então, eu quero sair — fui direta. Para que ficar enrolando, né? O sorriso dele vacilou um pouco. — O Chefinha já sabe? Ele deixou? Juro que aquele ogro ia me pagar. Onde já se viu! Eu precisava de permissão para sair? Eu iria sair e pronto. Ninguém ia me segurar. — Olha para minha cara, Xz. Acha mesmo que vou pedir permissão? Um brilho de diversão surgiu em seus olhos. — Gosto muito de você, Chefinha. Simbora! — ele falou, entusiasmado, e abriu a porta do carro para mim. — Como? — olhei para ele confusa, surpresa com a facilidade. — O quê? Não quer mais? — Ele riu. — Mas você não vai ter problemas depois? — Relaxa, Chefinha. Deixa que depois eu me entendo com a fera. Agora, vou te levar para se divertir. Conheço um lugar muito bom — ele falou, empurrando-me gentilmente para dentro do carro. — Obrigada! — respirei aliviada, sentindo um raio de esperança depois de tanto caos.