CAPÍTULO 2 – FOGO E TRÉGUA

Viena – 08h03

O café esfriava na xícara de porcelana, intocado. A cidade começava a pulsar lá fora, mas dentro da Mansão Santorini, o tempo parecia imóvel — como se esperasse o estopim de algo prestes a explodir.

Isadora estava sentada à cabeceira da mesa de reuniões, vestida com roupas limpas que uma das empregadas trouxera. Um vestido preto simples, mas justo, que moldava seu corpo de forma perigosa demais para alguém que deveria ser inimiga. Os cabelos agora soltos, ainda úmidos do banho, e os olhos… mais perigosos do que nunca.

Leonardo a observava da extremidade oposta da mesa. Não havia mais amarras, nem ordens gritadas. Havia silêncio. E naquele silêncio, um pacto tácito — ou talvez um jogo.

— Está me tratando bem demais para quem deveria estar morta — disse ela, tocando a borda da xícara com os dedos, mas sem beber.

— Talvez eu esteja curioso — respondeu ele. — Ou talvez eu só esteja te observando quebrar por dentro.

Ela arqueou uma sobrancelha.

— Vai ter que fazer melhor que isso, Santorini.

Ele sorriu de leve.

— Tenho tempo.

O que eles tinham não era diálogo. Era um duelo. De vontades. De provocações.

Leonardo se levantou. Foi até ela com passos lentos. Parou às suas costas, inclinando-se devagar, fazendo com que sua respiração tocasse a pele do pescoço dela. Isadora permaneceu imóvel, mas seus dedos se contraíram sobre a mesa.

— Você gosta de provocar — ele murmurou. — Mas há uma diferença entre provocação e desafio direto. E você está começando a cruzar a linha.

Ela se virou lentamente, o rosto a milímetros do dele.

— E o que você vai fazer? Vai me punir… ou me usar?

Leonardo não respondeu. Apenas se afastou.

— Vista algo discreto. Vamos sair.

— Aonde?

— Você é minha convidada agora. E Viena inteira vai saber disso.

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VIENA — CENTRO HISTÓRICO — 10h22

Isadora caminhava ao lado de Leonardo, cercada por dois seguranças discretos a distância. Estavam entre vitrines caras, turistas e cafés finos. Ela usava óculos escuros e um sobretudo cinza sobre o vestido. A cidade nem suspeitava quem passava entre eles — a filha de um homem executado por traição… e o herdeiro que assinou a ordem.

— Isso é teatro? — ela perguntou, ao perceber que todos os olhares se voltavam para eles com curiosidade, sem reconhecimento.

— Isso é domínio — ele respondeu. — Mostrar ao mundo que até a herdeira Vasquez caminha sob meus passos.

Ela riu, amarga.

— Então é isso que excita você? Controle?

Leonardo parou diante de uma vitrine de joias.

— Não. O que me excita é a reação de alguém que odeia ser controlado… mas mesmo assim continua aqui.

Ela deu um passo à frente, ficando de frente para ele.

— Não confunda presença com rendição, Santorini. Eu ainda sonho em cortar sua garganta.

— Então continue sonhando. Mas aproveite a vista enquanto isso.

Ele abriu a porta da joalheria, como um cavalheiro. Ela entrou com o queixo erguido.

JOALHERIA ZELLMANN – 10h34

Isadora se perdeu por alguns segundos entre as vitrines iluminadas. Havia colares com diamantes da Antuérpia, relógios suíços que valiam mais do que um apartamento, e anéis que pareciam ter sido arrancados de tronos.

Mas o que mais a chamou atenção foi um colar simples de ouro branco com uma pedra vermelha no centro — uma granada, provavelmente. Pequena, violenta. Como ela.

— Gosta? — a voz de Leonardo surgiu ao seu lado.

— É discreto demais para alguém com o ego do seu tamanho.

Ele sorriu e fez um gesto para a atendente.

— Esse. Embale.

— Está brincando?

— Não. Presentes não significam posse. Apenas marcação de território — disse ele, provocativo. — E você já pisa demais nas minhas fronteiras.

Ela se aproximou dele.

— Você é muito bom em mascarar desejo com arrogância.

— E você é boa demais em esconder medo com sarcasmo.

Houve um segundo de silêncio, carregado.

— Por que está fazendo isso, Leonardo?

Ele a encarou de perto, e por um instante, não era o herdeiro da máfia. Era um homem de vinte anos que não escolheu a guerra que herdou.

— Porque quando a guerra chegar — e ela virá — quero saber quem estará ao meu lado.

Ela segurou o colar na mão, sentindo o metal gelado contra a pele.

— Eu nunca estarei ao seu lado. Mas talvez... eu esteja atrás de você, observando se vacila.

— Justo.

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MANSÃO SANTORINI — VARANDA SUPERIOR — 16h18

O dia já dava sinais de fim quando Isadora apareceu na varanda, sozinha. A mansão era grande, silenciosa, e mesmo cercada por guardas, ela sabia que podia fugir. Mas não fugia.

Leonardo estava ali, de costas, com um copo de whisky na mão, fitando a cidade.

— Nunca se cansa de controlar tudo? — ela perguntou, aproximando-se.

— E você nunca se cansa de tentar entender alguém que diz odiar?

Ela se sentou ao lado dele, descalça, com as pernas cruzadas sobre o banco.

— Talvez eu apenas queira saber por que ainda estou viva.

Leonardo a encarou. A vulnerabilidade dela era crua. Real. E perigosa.

— Porque se você morrer, eu nunca saberei se poderia confiar em você. Ou amá-la.

O silêncio caiu como uma lâmina entre eles.

Isadora respirou fundo. Estava claro que ele falava sério. Não era uma jogada. Era um abismo entre dois monstros criados por famílias que só sabiam matar ou obedecer.

Ela se aproximou. Encostou a testa na dele, num gesto de guerra e desejo.

— Você não me ama, Leonardo. Você só reconhece em mim o que odeia em si mesmo.

Ele sorriu de leve.

— Pode ser. Mas se isso não for amor... então que seja o veneno mais doce.

E ela o beijou.

Não foi um beijo suave. Foi possessivo, doloroso, brutal. Um choque entre dois furacões. Ele a segurou pela cintura, puxando com firmeza. Ela o arranhou, como se cada toque fosse uma promessa de destruição.

Mas por alguns minutos... esqueceram o mundo. O sangue. A vingança.

Só restaram eles.

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