O Complexo da Penha acordou com o gosto de pólvora ainda no ar. As paredes traziam as marcas de tiros recentes, janelas quebradas denunciavam a noite de guerra, e o silêncio dos becos dizia mais do que qualquer notícia. Não era o primeiro confronto, mas algo naquela madrugada tinha sido diferente: tinha sido pessoal.
Priscila abriu os olhos devagar, o corpo ainda rígido pelo medo. A lembrança dos estampidos ecoava em sua mente, como se cada bala tivesse atravessado também sua pele. Rute estava ao seu lado, exausta, mas firme.
— Dorme mais um pouco, mana. — Rute passou a mão nos cabelos dela, tentando transmitir calma. — A manhã vai ser longa.
Mas Priscila não conseguiu. Levantou-se, caminhou até a janela, e viu homens armados descendo pela escadaria. Alguns riam, outros limpavam sangue que não sabiam nem de quem era. Um garoto de não mais de 17 anos carregava o fuzil maior que ele próprio, o olhar duro de quem já tinha visto mais morte do que deveria.
Ela sentiu o estômago embrulhar.