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Capítulo I - Aurora. O Nome da Guerra

Narrado por Aurora:

O território solar, sob a liderança da Casa Habsburg, abrange cinco grandes nações: Itália, Áustria, Alemanha e Eslovênia. São terras marcadas por equilíbrio, ordem e diplomacia, protegidas sob o símbolo sagrado do sol. É nesse cenário de montanhas imponentes, vales ancestrais e tradição milenar que repousa o castelo da família real solar — Sonnenberg.

O castelo de Sonnenberg despertou sob tensão, mesmo banhado por luz. Localizado na região norte da Itália, entre os Alpes italianos e o Tirol do Sul (Alto Ádige), próximo à fronteira com a Suíça, sempre fora símbolo de estabilidade e prestígio. Mas naquela manhã, nem as flores frescas nos corredores, nem a luz dourada filtrada pelos vitrais conseguiam dissipar a inquietação. Algo havia se rompido no equilíbrio dos reinos — e todos dentro dos muros reais sabiam disso.

Durante o café da manhã, eu sentia o clima pesar. À cabeceira da mesa, meu pai, o rei Leopold, mantinha a postura firme, os dedos entrelaçados. Ao seu lado, minha mãe, a rainha Celina, observava tudo em silêncio. À esquerda dele, meu tio Ferdinand August von Habsburg, o beta da coroa, trocava olhares rápidos com sua esposa, Giuliana Teresa di Savoia, irmã da rainha e beta pessoal dela. Próximas a mim, minhas primas gêmeas, Vittoria e Fiorella, minha beta e minha gamma, estavam alertas, apesar do silêncio.

Mais adiante, o general Alaric Friedrich von Habsburg, nosso gamma e irmão mais novo do meu pai, mantinha o semblante fechado. Ao lado dele, Veronica di Savoia, gamma da rainha e irmã gêmea de Giuliana, permanecia impassível. E, discretamente, mas presente, Leonas Lorenzo di Savoia von Habsburg — filho de Alaric e Veronica, meu guarda pessoal e instrutor de parte das tropas — mantinha-se sentado, com uma xícara de café entre as mãos e os olhos sempre atentos.

Foi então que um mensageiro entrou apressado, interrompendo o silêncio com um tablet. Meu pai leu o conteúdo, e quando ergueu o olhar, a tensão se instalou de vez. Meus pais se conectaram através do seu link mental — uma habilidade compartilhada entre lobos e Lycans, desde que pertençam à mesma matilha. Esse vínculo permite a comunicação direta por pensamentos, como se uma voz clara fosse ouvida dentro da mente, mesmo no mais absoluto silêncio. O link mental é uma rede ancestral que une membros de uma matilha por instinto, emoção e comando silencioso. É por meio dele que ordens são dadas, sentimentos são partilhados e decisões urgentes são comunicadas em meio ao caos.

— A Família Real Lunar chegará para uma reunião. — anunciou minha mãe, com serenidade.

Mas havia mais. A mensagem continha outra informação: tropas vampíricas haviam saído de Estrasburgo e avançavam pelas florestas da Alsácia, aproximando-se da fronteira com a Suíça — território neutro. Isso foi passado pelo meu pai através do link mental de todos os presentes.

— Isso é uma provocação clara, Majestade — disse Alaric, rompendo o silêncio. — Permita-me reunir nossas forças e interceptar essa ameaça antes que atravessem a linha da neutralidade.

Meu pai assentiu, mas antes que ele falasse, eu me adiantei.

— Com todo respeito, tio — disse, erguendo o olhar —, precisamos de mais do que força. Precisamos de estratégia. Proponho uma missão de reconhecimento, rápida e discreta. E quero liderá-la.

Todos se voltaram para mim.

— Aurora… — disse minha mãe, preocupada.

— Um dia, eu liderarei. E preciso aprender a tomar decisões difíceis. Quero levar minha equipe de confiança. Não será ataque. Será observação. Inteligência. É isso que esperam de uma futura rainha, não é?

— Você está se arriscando demais — retrucou Alaric.

— Talvez. Mas se eu não confiar no meu julgamento agora, quem confiará em mim no futuro?

Meu pai me observou em silêncio. Então, finalmente, falou:

— Vá. Mas leve Leonas com você. E não ultrapasse os limites do território solar.

Assenti com respeito, mas acrescentei com firmeza:

— Levo também Vittoria e Fiorella. Confio nelas com minha vida. E quinze soldados bem treinados. Nada além disso. Seremos rápidos, discretos e organizados.

Assenti. A decisão estava tomada.

A guerra havia começado a se mover — e eu daria o primeiro passo rumo ao desconhecido.

Horas depois, nossa comitiva embarcou em um jato em direção à Suíça. Nas proximidades da cidade de Saint-Louis, na fronteira entre a França e a Suíça, descemos discretamente e seguimos em jipes adaptados, mantendo o máximo de sigilo. Quando nos aproximamos ainda mais da zona de risco, abandonamos os veículos e continuamos a pé, em silêncio absoluto. Cada passo era cuidadosamente calculado. Não podíamos ser vistos. Não podíamos ser reconhecidos.

O silêncio era tenso, cortado apenas pelo farfalhar leve das folhas sob nossas botas. Foi Leonas quem percebeu primeiro. Ele ergueu o punho, sinal de alerta.

— Pare — sussurrou ele. — Há movimento à frente.

Nos abrigamos entre a vegetação densa e observamos. A poucos metros, acampados em formação tática, estavam pelo menos quinhentos vampiros armados. Era uma tropa inteira — bem equipada, organizada, e claramente em marcha.

— Isso não é uma patrulha — murmurou Vittoria. — É um exército.

— Eles estão prontos para atacar — completou Fiorella, os olhos atentos.

Antes que pudéssemos recuar, um estalo traiçoeiro soou sob um dos pés dos soldados. Um galho seco. Pequeno, mas suficiente. As cabeças se viraram. Olhos rubros brilharam na penumbra.

— Fomos descobertos — sussurrei, sentindo o sangue gelar.

O silêncio que se seguiu durou apenas um suspiro antes de se romper em caos. Gritos dilaceraram o ar quando os vampiros avançaram com velocidade brutal. Disparos ecoaram, garras se chocaram, e o cheiro denso de sangue logo se espalhou. A clareira virou um campo de guerra.

Em resposta instintiva, minha comitiva se transformou. Um a um, os corpos ao meu redor assumiram formas de lobo — pelagens claras, cinza e prateadas, refletindo a herança solar. Eram guerreiros leais à coroa, preparados para lutar até o fim. Vi Leonas à frente, ao lado de Vittoria e Fiorella, já em suas formas de combate, liderando com destemor.

Minha transformação veio por último. Senti minha estrutura se romper e a energia de Serena — minha loba — tomar o controle. E então, me vi: uma loba branca como a neve, com um sol dourado brilhando em minha testa. Um símbolo. Um alvo. Todos os olhares se voltaram para mim. Eles sabiam eu era a princesa.

A batalha se tornou um caos de sangue e instinto. Vi Fiorella ser arremessada contra uma árvore — ela caiu desacordada, o corpo coberto por cortes profundos. Vittoria sangrava ao meu lado, ainda de pé, protegendo minha retaguarda. Leonas rugiu ao me ver cercada, atravessou o campo com fúria. — Atrás de você, Aurora! — gritou pelo link mental. — Mova-se!

Ele se lançou contra três vampiros, rasgando e mordendo, lutando com o que tinha de mais puro: lealdade. Salvou minha vida. Vi quando o último inimigo o alcançou e cravou os dentes em seu ombro. O uivo que Leonas soltou me gelou por dentro.

Vi Leonas desaparecer sob uma onda de corpos. Quis correr até ele, arrancá-lo dali, mas outro inimigo surgiu. E mais um. E mais outro. Eu não podia salvá-lo. Não com as mãos presas ao dever.

Ele caiu, imóvel. Por um instante, o mundo parou. Parecia morto — e aquela imagem me atravessou como uma lâmina invisível. O guerreiro mais leal, o amigo mais presente, o meu primo — ali, vencido, enquanto eu ainda estava em pé. Um pedaço de mim desabou com ele.

— Leonas! — gritei, sentindo minha concentração se despedaçar.

Continuei lutando, mesmo com os ossos doendo, mesmo com a visão turva. Rasguei e ataquei, usando tudo o que tinha. Minha visão se estreitava como se o mundo ao redor desvanecesse em sombras. A dor já não era mais localizada — era total. O som dos meus próprios batimentos era mais alto do que o caos da batalha. Meus sentidos começavam a falhar, mas eu não permitia que meu corpo cedesse. Cada inimigo derrubado era uma batida a menos no meu próprio coração. Estava coberta de sangue — meu e deles. E mesmo com todos caídos ao meu redor, eu ainda permanecia em pé.

Todos pareciam mortos. Todos. Mas eu não podia ceder. Mesmo quando a dor me consumia, mesmo quando meu corpo tremia, eu continuava defendendo aquele território, defendendo aqueles que eu nem sabia se ainda estavam vivos.

A dor era insuportável. Cada respiração era um tormento. Sentia as costelas fraturadas pressionarem os pulmões. Meu braço esquerdo não respondia, e minha perna direita falhava a cada movimento. Havia cortes profundos em meu abdômen, no rosto, nos ombros. O sangue empapava meus pelos. E mesmo assim, Serena — minha loba — resistiu até onde pôde, até recuar para dentro de mim.

Ela se foi em silêncio, deixando-me exposta, em forma humana. E ali fiquei, cambaleante, com garras ainda projetadas nas mãos, os joelhos quase cedendo. Minha pele era um mapa de dor e sobrevivência. E eu, quase morta, me recusei a cair. Se aquele fosse o meu fim, que fosse em pé — por todos eles. Pela luz que carrego na testa e no sangue.

Antes de apagar, olhei ao redor. Vi os corpos dos meus — imóveis, sangrando. Leonas estava entre eles, inerte. A dor foi maior do que a física. Meu grito foi silencioso. Minha alma, em pedaços.

Todos estavam estirados no chão, como se a vida tivesse abandonado seus corpos. Nenhum vampiro restara — todos haviam sido mortos na fúria da batalha. Mas o preço foi alto.

Meu corpo estava despedaçado. Eu sentia cada osso fraturado, especialmente nas costelas, no braço esquerdo e na perna direita. Havia cortes profundos por todo o meu tronco e rosto, e o sangue empapava minha roupa rasgada. Minhas mãos ainda guardavam garras, mesmo em forma humana — uma lembrança da loba que havia sido obrigada a se recolher, vencida pela exaustão e pela dor.

Mesmo quase morta, permaneci em pé enquanto pude. Sozinha. Defendendo um território, defendendo aqueles que eu nem sabia se ainda respiravam. Eu lutei até o fim, até o último inimigo cair, até a última gota de energia se esvair.

E então, caí de joelhos.

Pai... ajuda, pedi pelo link mental, a mente enfraquecida, tremendo.

E compreendi:

A guerra havia começado. E desta vez, ela tinha meu nome.

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