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Capítulo IV - Quando o Destino Tem Cheiro de Pinho

Narrado por Aurora:

Caminhava por um vale escuro, o chão cheio de fendas. No céu, nenhuma estrela, só uma aurora verde que pulsava devagar. De repente, a Deusa Artemins surgiu, vestindo um manto que juntava prata de lua e ouro de sol.

— Filha da luz e do fogo — disse ela, com a voz ecoando direto na minha mente. — Tua alma acaba de se ligar ao Filho da noite e da neve. Juntos, vocês podem curar ou destruir o mundo.

Ela abriu as mãos. À direita, vi florestas vivas, rios limpos e gente em paz. À esquerda, o mesmo lugar queimado e em ruínas.

— O caminho depende das escolhas de vocês — continuou. — Mantenha o coração longe do medo e da vingança. Proteja quem sofre, mesmo que doa.

Então, tocou meu rosto, bem no ponto onde carrego o sol da nossa linhagem. Um calor se espalhou dali, firme e suave. No segundo seguinte, um clarão tomou tudo, e o cheiro de pinho invadiu o sonho, puxando-me de volta.

Tudo começou com um aroma.

Antes que a claridade chegasse aos meus olhos, senti o ar cheio de pinho-alpino fresco, cedro-branco morno e âmbar-cinzento suave. Meu corpo reconheceu na hora: meu companheiro está perto.

Esse perfume... quando o sinto, é como se o vento das montanhas trouxesse o calor de uma lareira acesa, e o meu coração repousasse ali.

Abri os olhos com calma. A luz baixa do quarto deixava tudo pálido. Ao lado da cama, um rapaz dormia numa cadeira, corpo inclinado. Cabelos loiros caíam sobre a testa. A mão dele segurava firme a minha.

Apertei seus dedos. Ele despertou num susto, olhos azuis se abrindo em surpresa e alívio.

— Você... acordou — disse, com a voz rouca.

— Companheiro — respondi, fraca, mas firme.

Ele respirou fundo.

— Tive medo de não ouvir você de novo.

— Seu cheiro me guiou — expliquei. — Soube que era você antes de enxergar qualquer coisa.

Ele levou minha mão até o rosto e deixou-a ali. O formigamento quente que senti bastou para confirmar tudo que o sonho tinha prometido.

Minha garganta arranhou. Ele notou na hora.

— Quer água? — perguntou.

Assenti. Vlad pegou o copo na mesinha, encheu, apoiou minha nuca com cuidado e encostou o vidro nos meus lábios. A água desceu fresca.

— Melhor? — quis saber.

— Muito — respondi, relaxando no travesseiro.

Piscaram-me alguns pensamentos soltos.

— Quanto tempo eu fiquei inconsciente? — perguntei, a voz já menos áspera.

Vlad lançou um olhar para a janela; lá fora era profunda madrugada, o castelo inteiro em silêncio.

— Uma semana completa. Sete dias — respondeu.

Ele fechou os olhos por um breve momento, como quem se concentra, e emitiu um chamado silencioso através do link mental.

— Dr. Elric está vindo — disse, voltando a me encarar com um toque de tranquilidade na voz.

— Enquanto isso, podemos conversar baixinho — disse, arrastando a cadeira para mais perto.

— Já está se acostumando a acionar o médico da corte solar como se fosse da sua própria matilha? — brinquei, arqueando uma sobrancelha.

Ele deu um meio sorriso.

— O que posso fazer? Já me sinto em casa — disse ele, dando uma piscadela e um sorriso brincalhão em troca.

Sorri de lado e ergui um pouco o queixo.

— Então você é o infame Vlad que não sai das manchetes nem do feed do I*******m?

Ele arqueou a sobrancelha, ainda segurando o copo vazio.

— Depende. Infame por salvar princesas ou por causar dores de cabeça a diplomatas?

— Pelos dois, ao que parece — retruquei.

Ele riu, um som baixo que lembrava cascalho rolando em rio.

— Vlad Drăculea Romanov — disse ele, levando a mão livre ao peito numa saudação brincalhona — herdeiro de Dorian, alfa da Matilha Lunar. Mas pode me chamar só de Vlad.

— Aurora di Savoia von Habsburg — respondi com a mesma formalidade leve — filha de Leopold e Celina, ainda com dores graças aos vampiros e salva pelo seu perfume.

— Perfume e teimosia — corrigiu. — Se não se importar, pretendo permanecer por perto.

— Aceito a companhia — falei, sentindo as pálpebras pesarem de novo. — Mas da próxima vez que for me visitar, traga algo mais forte que água.

— Chá de pinho? — provocou.

— Contanto que venha com você, aceito.

Ele colocou o copo na mesinha e arrastou a cadeira um pouco mais para perto.

— Então descanse, princesa. Quando acordar, prometo uma bebida melhor e... menos infâmia.

Sorri antes de adormecer outra vez, segura naquela promessa simples.

... algumas horas depois

Antes de acordar, senti o cheiro forte de pinho e mel. Abri um sorriso e encarei uma xícara de chá na mesa do quarto. Antes que eu dissesse algo, a porta deslizou com um chiado suave. O médico entrou e disse:

— Princesa Aurora, que alívio vê-la desperta — disse, aproximando-se. — Vamos checar seus sinais.

Passou um scanner sobre meu peito; gráficos se formaram no ar transparente. Minha frequência subiu um pouquinho — culpa da mão de Vlad ainda entrelaçada à minha.

— Oxigenação boa, pressão regular para quem dormiu sete dias — concluiu o doutor, sorrindo. — Vai precisar de nutrientes e muito repouso, mas está fora de perigo imediato.

— Obrigada, doutor — murmurei.

— Volto em duas horas — garantiu ele, registrando tudo na prancheta digital antes de sair.

Quando a porta se fechou, olhei para o lado e vi novamente a xícara fumegante. Sorri. Vlad inclinou-se de novo.

— Você sempre sorri quando vê chá de pinho ou fui eu o sortudo da vez? — brincou.

— Um pouco dos dois — respondi, rindo. — Mas admito que me surpreendeu. Não achei que fosse lembrar.

— Eu prometi, não prometi? — Ele levantou da cadeira. — Além disso, nunca subestime o poder de um bom chá para manter uma promessa.

Ele pegou a xícara e me entregou. Peguei-a e levei até os lábios. O chá ainda estava morno. Dei um gole pequeno, sentindo o gosto amadeirado e familiar se espalhar pela boca. Era o meu favorito, mas aquele era o melhor de todos.

— Forte, mas bom — comentei.

— É uma receita antiga da minha família. Curativa e, segundo meu avô, digna de alianças eternas. Eu que fiz — disse ele, pegando a outra xícara.

— Então estamos oficialmente ligados por chá? — brinquei.

— Por chá, destino e... um certo empurrão da deusa — respondeu, tocando sua xícara à minha num leve brinde.

— Está aprovadíssimo — falei.

— Eu sou um lycan de palavra — respondeu.

Rimos juntos, e pela primeira vez em dias, senti leveza.

— Obrigada por ficar — falei, mais baixo.

— Eu disse que não sairia até você acordar. E agora que acordou... acho que só saio quando você me expulsar.

— Então vai ter que ficar — murmurei, fechando os olhos por um instante, após entregar a xícara vazia para ele.

Após nossa pequena interação, adormeci novamente.

Quando acordei, senti um cheiro suave de hortênsias com mel. Abri um pequeno sorriso e, então, os olhos:

— Mãe — disse, ao vê-la sentada na cadeira de Vlad.

Ela sorriu e deixou algumas lágrimas caírem.

— Você está acordada, meu amor. Eu fiquei tão preocupada — disse ela, emocionada.

A porta se abriu, e a figura do meu pai surgiu. Os olhos cansados denunciavam o quanto ele estava preocupado e dormia pouco.

— Não só sua mãe ficou preocupada, filhote — disse ele, após me dar um beijo na testa.

Ele olhou ao redor, franziu o nariz e brincou:

— Inclusive, precisei expulsar o rapaz daqui mais cedo. Estava começando a feder a lycan suado.

— Leopold! — repreendeu minha mãe com um olhar de leve censura, embora o sorriso nos lábios a entregasse.

— O que foi? Só estou dizendo a verdade — retrucou ele, rindo. — Mas, falando sério, ele achou melhor deixarmos a sós com você, nós merecemos esse momento.

Não demorou muito para a porta se abrir novamente, revelando Vlad retornando com o mesmo sorriso de sempre e os cabelos levemente desarrumados e molhados.

— Espero que a ausência temporária tenha sido perdoada — disse ele, entrando com naturalidade.

— Já estava achando que ia fugir — provoquei.

— E perder mais uma xícara de chá? Jamais.

Trocamos um sorriso antes que outra presença preenchesse o ambiente.

Os pais de Vlad entraram em silêncio. Dorian, imponente e de presença marcante, e sua companheira, Liana, mantinham a postura firme, mas os olhos demonstravam um tipo sereno de curiosidade e expectativa.

As apresentações aconteceram com naturalidade, sem formalidades exageradas, e a conversa fluiu de forma leve e respeitosa. Após algumas palavras de boas-vindas e sorrisos trocados, meus pais e os deles decidiram nos deixar a sós.

Quando tudo voltou a ficar quieto, Vlad se sentou de novo na cadeira ao lado da cama.

— Agora é só você e eu — disse ele, com aquele tom que me fazia sorrir mesmo sem querer.

Eu encarei os olhos dele e quando eu iria responder a porta se abriu novamente com um leve aviso sonoro. Fiorella entrou no quarto com roupas confortáveis e seus coturnos pretos de sempre. Apesar da expressão levemente cansada, ainda mantinha a postura ereta e o olhar firme. Havia algo mais leve em sua presença — não como uma subordinada em missão, mas como uma prima preocupada fazendo uma visita necessária.

— Desculpem interromper — disse, oferecendo um sorriso breve. — Mas achei que a princesa gostaria de saber como estão as coisas.

Vlad se levantou automaticamente e puxou outra cadeira para ela, que agradeceu com um aceno da cabeça.

— Fiorella — cumprimentei, tentando me erguer um pouco. — Sente-se, por favor.

Ela se acomodou devagar.

— A situação está controlada — começou. — Depois do ataque, as patrulhas foram reforçadas e a fronteira. Nenhum outro movimento hostil foi registrado nos últimos dias.

— E... os outros? — perguntei, hesitante.

Ela respirou fundo, mantendo o tom calmo:

— Vittoria já deixou a UTI. Está nos aposentos dela, descansando sob supervisão médica. Ainda sente dores, mas está bem. Leonas, por outro lado... ainda está em coma. A mordida foi profunda, e o veneno desacelerou a recuperação dele. O Dr. Elric está monitorando tudo de perto.

Ela me lançou um olhar que mesclava pesar e alívio.

Eu assenti, aliviada.

— E os responsáveis pelo ataque?

— A guarda solar identificou os líderes do grupo invasor. Eram parte de uma facção dissidente de vampiros do leste, provavelmente ligados a um clã antigo exilado. As investigações continuam, mas há indícios de que não agiram sozinhos. Há algo maior por trás disso.

— Claro que há — murmurou Vlad, os olhos estreitando-se por um instante.

Fiorella o encarou, depois voltou os olhos para mim.

—Eu queria te agradecer. Se não fosse você e sua lycan estariamos mortos. Me perdoe por não conseguir proteger você.

A encarei como se fosse um alienigena.E disse:

_ Eu sou uma princesa e sempre será meu dever proteger vocês. Apesar de ser uma guerreira e guarda costas. Eu sou sua soberana e jamais deixaria os meus desamparados. Não tem nada a se perdoar. Além disso, você e familia. - digo a ela firmemente.

Ela balança a cabeça em afirmativo tentando absorver minhas palavras e diz através do nosso elo:

"Ele é bonito. E bem persistente... fico feliz por ter encontrado seu companheiro minha prima..."

Ela deu uma pequena risada e diz:

 — Agora vou deixá-los. Você precisa descansar.

Ela se despediu com um leve abraço e um último olhar para Vlad do tipo cuide bem dela ou eu te dou uma surra... antes de sair do quarto. 

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