Mikhail Petrov é o mercenário mais temido de toda a Rússia. Para ele, apenas duas coisas importavam: proteger seu irmão mais novo, Dimitri, e manter sua reputação como um verdadeiro fantasma — imbatível e inalcançável. Mas tudo desmorona quando um promotor da Califórnia falsifica provas e condena Dimitri à prisão, desencadeando uma sequência de tragédias que culminam na morte de seu irmão. Consumido pela sede de vingança, Mikhail decide atingir o promotor onde mais doeria: sequestrando sua filha mais nova, Mia Walker. No entanto, ao invés de terminar rapidamente com a vida da garota, ele percebe que sua dor pode ser explorada de formas muito mais profundas. Manter Mia como prisioneira parecia ser apenas mais uma estratégia. Mas, no ódio que os une, nasce um desejo obscuro e incontrolável — e Mikhail logo descobre que, ao poupar a vida dela, selou a própria perdição. Em um mundo onde amor e ódio se confundem, quem sobreviverá ao toque do inimigo?
Ler maisNarrado por Mikhail Petrov
O cheiro de óleo, pólvora e ferrugem impregnava o ar do porão. Uma sala enorme, com paredes de concreto rachado, estantes de metal abarrotadas de armas de todos os calibres e caixas marcadas com símbolos que o mundo nunca deveria conhecer. A luz amarelada piscava de tempos em tempos, criando sombras nas paredes que pareciam monstros se contorcendo no breu. Era o meu templo. Meu santuário. Meu esconderijo. Abaixei-me para examinar a mira de um dos rifles de precisão quando o celular vibrou no bolso da minha calça jeans surrada. O número na tela me fez franzir a testa. Nikita não ligava sem motivo. Peguei o telefone e atendi, sentindo uma tensão involuntária subir pela minha espinha. — Fala — minha voz saiu grave, seca. — Mikhail... — a voz do outro lado parecia hesitante, pesada — você precisa saber disso. É sobre o Dimitri. Fechei a mão em volta do telefone com força suficiente para fazer meus nós dos dedos ficarem brancos. Dimitri era tudo que me restava. Meu irmão mais novo. A única pessoa que ainda fazia meu sangue frio aquecer por algo além da morte. — Fala logo — rosnei, cada segundo de silêncio entre nós me corroendo. — Ele foi preso, Mikhail. Armaram para ele. Um promotor da Califórnia, James Walker, alegou conspiração e associação ao crime. Plantaram provas. Eu juro, ele é inocente. Pela primeira vez em anos, senti o chão tremer sob meus pés. Dimitri não era como eu. Ele tinha saído da Rússia para escapar da sombra suja da nossa família. Queria uma vida normal, longe das balas, longe das mortes. E agora estavam tentando manchar o nome dele. Pior: colocá-lo para apodrecer em uma cela. — Estou indo agora — respondi, já me erguendo e guardando o celular no bolso. Saí do porão às pressas, subindo os degraus de concreto dois a dois, como se o próprio inferno estivesse me seguindo. Eu seria capaz de destruir a Califórnia inteira para trazê-lo de volta. [...] O vento cortava como navalhas no pátio do aeroporto, mas eu mal sentia. O jato comercial era lento demais para a urgência que consumia meu peito. Na primeira fileira, no canto da janela, fiquei imóvel, a mandíbula cerrada, os olhos fixos no horizonte que se tornava dourado com o pôr do sol. Los Angeles era meu destino. E sangue seria o preço. Durante o voo, fechei os olhos, permitindo que as memórias viessem. Meus pais, mortos em uma emboscada covarde. A maneira como segurei a mão de Dimitri naquela noite, prometendo a ele, ainda criança, que nunca mais o deixaria sozinho. E agora... Eu havia falhado. Quando o avião tocou o solo, um peso invisível caiu sobre meus ombros. Algo dentro de mim sabia. Antes mesmo do celular vibrar no bolso da jaqueta, eu já sabia. Atendi sem hesitar. — Mikhail... — a voz de Nikita hesitou — Dimitri... ele... foi morto. Dentro da prisão. Fechei os olhos. Respirei fundo. Nenhum som saiu da minha garganta. Nem um grito, nem um suspiro. Apenas o silêncio absoluto. Eu já sabia. Desde que entrei naquele avião, a sensação de morte pairava sobre mim como uma maldição inevitável. Mas saber não aliviava. Saber apenas alimentava o monstro dentro de mim, aquele que passara anos dormindo, esperando. Desliguei o celular sem dizer nada. O mundo parecia distante. As vozes ao redor eram apenas ecos distorcidos. Peguei minha mala pequena, atravessando a pista com passos calculados. Do outro lado, afastada do terminal, uma SUV preta esperava, o motor roncando baixo como um predador de olhos fechados. A porta se abriu e lá estava ele. — Mateo Morelli — murmurei, jogando a mala no banco de trás antes de entrar. Mateo era mais que um aliado. Era um velho amigo, alguém que entendia o código silencioso em que eu vivia. Crescemos em mundos diferentes, mas a violência nos tornava irmãos de sangue. Eu matava para quem pudesse me pagar pagar uma pequena fortuna pelos meus serviços, Mateo era um dos homens mais poderosos que eu conheci o próximo herdeiro da máfia Italiana. Ele me olhou por um segundo, aquele olhar duro de mafioso que já viu a morte de perto e a chamou de velha amiga. — Sinto muito, irmão — disse, sua voz pesada, sincera. Assenti, sem conseguir formar palavras. A SUV começou a se mover, devorando a estrada vazia em direção ao nada. — Você vai travar uma guerra fora de casa? — ele perguntou após alguns minutos de silêncio tenso. Olhei pela janela. Los Angeles brilhava ao longe, uma miragem de promessas quebradas e sonhos corrompidos. Respirei fundo, deixando a fúria preencher cada célula do meu corpo. — A guerra começou na primeira ligação que recebi — murmurei, com uma certeza tão sólida quanto o aço. Mateo soltou um sorriso amargo e, sem dizer nada, puxou algo do bolso interno da jaqueta. Estendeu para mim uma foto, velha, impressa às pressas, amassada nas bordas. Peguei a imagem. Era uma garota. Olhos verdes intensos, cabelos castanhos caindo em ondas desalinhadas sobre os ombros. Jovem. Talvez uns vinte e poucos anos. Estava rindo em algum jardim, completamente alheia ao mundo sujo que orbitava ao seu redor. Mia Walker. O nome estava rabiscado no verso da foto, como se alguém tivesse feito isso com raiva, querendo marcar. A filha do promotor James Walker. — Se quiser vingança — disse Mateo, seus olhos encontrando os meus no espelho retrovisor — pode começar daqui. Segurei a foto por mais alguns segundos antes de dobrá-la com cuidado e enfiá-la no bolso da jaqueta. Mia Walker. A porta de entrada para o inferno. Eu já não tinha mais nada a perder. Não existia mais limite, nem código, nem misericórdia. James Walker destruiu meu irmão. Agora, eu destruiria tudo que ele amava. E começaria pela sua filha.Narrado por Mikhail Petrov O amanhecer trouxe um silêncio estranho. Do tipo que antecede uma tempestade, mesmo que o céu esteja limpo. Desci as escadas com passos lentos, sentindo algo diferente pairar no ar. Era como se a casa, sempre cheia de presença, tivesse parado no tempo. Mas ao virar o corredor, o impacto foi imediato. Ali, sentado no meu sofá, com a mesma postura altiva e o mesmo olhar de quem não teme nem Deus, estava ele. Dimitri. Meu irmão. Meu inferno pessoal. Meu erro mais profundo. O homem por quem toda essa guerra começou. Meu irmão mais novo, meu protegido. — Você... — Não parece muito feliz em me ver, Mikhail — ele respondeu, cruzando as pernas com a naturalidade de quem não havia desaparecido por meses. — Você estava enterrado. — Não bem. Eu me meti com coisa errada, mesmo sempre tentando fugir dessa vida, com pessoas erradas. Precisei fugir. Recomeçar. — E volta assim depois de tudo o que você fez? Mia... o pai dela... Daniil... Você destruiu tu
Narrado por Mia WalkerSessenta e nove dias.Era inacreditável como o tempo podia escorrer entre os dedos como a neve derretendo no parapeito da janela. Sessenta e nove dias desde que eu aceitei entrar naquele avião com Mikhail Petrov. Desde que ele me olhou com aqueles olhos de guerra e me ofereceu uma chance de ver a vida sob outra perspectiva. Um acordo. Noventa dias. Noventa dias para ele me mostrar o que significava viver.Agora, faltavam apenas vinte e um. E a verdade é que não existia mais acordo. Não existia mais condição. Existia nós. E eu não queria voltar. Não tinha mais pra onde voltar.Estávamos em um parque perto da mansão. Um lugar silencioso, reservado, onde Daniil podia correr livremente sem que houvesse o perigo de olhos e bocas do submundo. De onde eu estava, observava os dois. Daniil estava no colo de Mikhail, com um carrinho de brinquedo nas mãos, e Mikhail fingia que o fazia voar, girando no ar como um avião. A risada de Daniil era leve, solta, como sinos em uma
Narrado por Mikhail PetrovA linha ficou muda por alguns segundos, até a voz de Mateo surgir do outro lado, carregada de sono e surpresa.— Mikhail? Que inferno... você sabe que horas são aqui? — a voz de Mateo veio rouca e cansada do outro lado da linha, mas com aquele tom seco característico dele. Aquele tom que sempre dizia: estou aqui. Mesmo de longe.— Eu sei. Mas isso não pode esperar.O tom da minha voz pareceu o bastante. Ele ficou em silêncio por dois segundos, depois suspirou fundo.— Fala.— Recebi um chamado. Um duelo. Volkov. Hoje. Meia-noite. Ruínas de Zavidovo.Do outro lado, apenas respiração pesada. Um suspiro carregado, depois:— Alexey Volkov? Você está de sacanagem...— Ele quer resolver da forma antiga. Disputa direta. Quem vencer, vive.Mateo não falou de imediato. Conhecíamos bem esse tipo de jogo. As leis não escritas da máfia. Não há misericórdia. Não há empate.— E você vai?— Tenho que ir.— Mikhail... esse cara é um tubarão, e você é um lobo. Isso não vai s
Narrado por Mia Walker— Você mentiu pra ele! — gritei, atravessando a cozinha com os punhos fechados e o coração acelerado. — O Daniil é uma criança de três anos, e você fez ele achar que ia ganhar um passeio e depois sumiu por horas, o deixando sozinho lá fora! Lana estava de costas para a pia, as mãos cruzadas sob o peito e uma expressão que beirava o deboche.— Ele se distraiu, é só isso. Crianças esquecem. Você está exagerando.— Eu sou mãe dele! Eu não esqueço. E se você pensa que pode brincar com a cabeça do meu filho, está muito enganada.Ela deu um passo à frente.— Filho? Ele foi adotado tem o quê, dois dias? Você não sabe nada sobre cuidar de uma criança. E ainda por cima se acha dona da mansão porque dorme na cama do Mikhail. Ela conseguiu o que queria, entrou na minha cabeça e ainda conseguiu alugar um triplex. Eu ia quebrar as asinhas dessa desmiolada antes que ela levantasse vôo demais. — Eu não preciso da cama dele pra ter lugar aqui. — me aproximei, com os olhos cr
Narrado por Mikhail PetrovA noite começava a cair com lentidão quando saímos pela entrada principal da mansão. O frio ainda cortava, mas não com a mesma fúria dos dias anteriores. Mia ajeitava o casaco sobre os ombros enquanto se curvava para se despedir de Daniil. Ele estava sentado na escada com um carrinho de brinquedo na mão e o olhar triste.— A gente não vai demorar, prometo — ela disse, beijando o topo da cabeça dele.Lana, a sobrinha de Irina, estava escorada na porta, com os braços cruzados.— Pode deixar comigo. A gente vai assistir desenho e tomar chocolate quente. Nada de mais.Observei as interações em silêncio, mas com olhos atentos. Sempre atento.Entramos no carro, e Mia se encostou no banco, me olhando de lado.— Você parece desconfortável.— Não gosto de lugares com muita gente.— E mesmo assim vai me levar para uma balada?— Você disse que queria viver. Estou cumprindo minha promessa.Ela sorriu, mas percebi a ansiedade nos dedos tamborilando no colo. A roupa que u
Narrado por Mia WalkerA mesa estava posta com um cuidado silencioso. A louça era simples, mas elegante, e Irina havia deixado pequenos ramos de alecrim sobre os guardanapos dobrados. O aroma do ensopado de carne preenchia o salão, misturado com o som de talheres se ajeitando e da risada leve de Daniil, sentado entre mim e Mikhail. Ele balançava as perninhas curtas na cadeira, ainda um pouco grande demais para ele, com um guardanapo amarrotado preso como babador.Nunca imaginei que essa cena, essa sensação, pudesse um dia me pertencer.Mikhail estava mais calado do que o habitual. Seus olhos seguiam os movimentos do menino com uma espécie de admiração contida. Entre uma colherada e outra, Daniil contava, com palavras confusas e gestos exagerados, como o suco de uva — que agora tintava seus lábios — tinha um gosto melhor do que qualquer outro suco da vida. Mikhail apenas observava. Seus ombros, normalmente tão tensos, pareciam mais baixos. E por um instante, eu vi nele um homem cansado
Último capítulo