Inicio / Lobisomem / A babá sequestrada pelo alfa / Capítulo 2: Fique longe do meu filho
Capítulo 2: Fique longe do meu filho

A escola primária Maplewood estava em festa naquela tarde luminosa. Balões coloridos dançavam presos às laterais da quadra, faixas desenhadas com lápis de cera pendiam das paredes, e pais se espremiam nas arquibancadas improvisadas para ver o coral das crianças. Era o Dia dos Pais, e a energia alegre preenchia o ar como um perfume doce.

Mas nem todo coração estava feliz.

Kian, com seus cabelos negros bagunçados e os olhos mais azuis que o céu do lado de fora, mexia nervosamente nos suspensórios da fantasia enquanto esperava sua vez no palco. Ele olhou para o público mais uma vez, os pequenos dedos apertando as bordas da camisa, e procurou pr toda parte por todos os rostos. 

Mas não estava lá.

No lugar onde deveria estar seu pai, grande, imponente, impossível de ignorar, havia apenas Sandra, sentada na ponta da arquibancada com um sorriso falso, fotografando tudo como se fosse a mãe do ano. Os cabelos loiros bem alinhados e um vestido elegante demais para a ocasião.

Kian sentiu a garganta fechar.

— Papi disse que ia vir… — sussurrou para si mesmo.

Mas não veio.

De novo.

A música começou, as outras crianças cantavam alto, algumas desafinadas, outras rindo, outras acenando. Kian tentou cantar, tentou mesmo, mas as palavras travara em sua gargantinha, com o bolo subindo e as lágrimas começando a se acumular nos olhinhos claros..

O pai não estava lá.

Sandra estava.

Só ela.

E ele odiava Sandra.

Quando a apresentação acabou, as crianças correram animadas para seus pais. Risos, abraços, fotos. Kian ficou parado, com o rosto duro, tentando segurar as lágrimas como o pai dizia que um “lobo de verdade” deveria.

Mas era difícil, muito difícil. Tinha perdido sua mamãe e com ela seu papi também tinha esquecido dele…

Sandra veio correndo com o salto alto tropeçando no piso.

— Kian! Amor! Você cantou tão lindo, bebe! Eu gravei tudo, olha só…

Ele nem esperou ela terminar.

— Sai daqui, sua bruxa! — Pisou com força no pé dela, fazendo o salto entortar e Sandra soltar um grito de dor e indignação.

E então correu.

— Seu pestinha! KIAN! VOLTE AQUI AGORA MESMO! — ela gritou.

Mas o pequeno lobo era rápido demais, e sumiu no meio do estacionamento, desaparecendo para dentro da rua antes que ela conseguisse sequer ajeitar o sapato quebrado.

***

O chacoalhar do ônibus arrancou Liana de um sono pesado, o pescoço dolorido pela posição desconfortável.

— Ei. Moça. Chegou — o motorista falou, grosso. — Última parada.

Ela piscou algumas vezes, confusa, até o cenário além do vidro entrar em foco. A cidade era maior do que imaginava, com luzes brilhando apesar do sol ainda estar alto. Havia um parque de diversões logo ao lado, as cores vibrantes girando devagar contra o vento.

Storm City.

Ela realmente tinha fugido para Storm City.

Ainda meio sonolenta, desceu do ônibus com a mochila nas costas, sentindo o peso do seu material da faculdade, puxando a respiração como se tentasse reorganizar a própria alma.

Mas não deu tempo.

Porque assim que tirou o celular da bolsa para tentar entender onde estava, a tela se inundou de notificações.

Justin: 23 chamadas perdidas

Justin: 12 mensagens

Vem pra casa, por favor

A gente precisa conversar

Eu errei, amor, volta

Sua irmã te provocou, você sabe como ela é

Liana? Atende. Estou preocupado.

Ela sentiu o estômago virar, ódio, dor e nojo tudo misturado.

— Vai se preocupar no inferno — murmurou, apertando o aparelho tão forte que a mão tremeu.

E foi por isso, por aquele turbilhão cruel dentro dela, que não percebeu o homem se aproximando por trás.

Um puxão rápido.

Uma mão áspera.

Um cheiro de álcool e suor.

— Ei! — Liana gritou, mas tarde demais.

O homem arrancou sua bolsa e o celular de sua mão, correu entre carros e desapareceu na multidão como se tivesse se dissolvido no ar.

— NÃO! Seu desgraçado! Volta aqui! Meu celular! — gritou, disparando atrás dele, mas não havia chance alguma.

Quando percebeu que ninguém ia ajudar, que ninguém sequer se importava, parou no meio-fio, respirando fundo, engolindo lágrimas, sentindo o desespero rasgar seu peito.

Então enfiou a mão no bolso da calça.

Dez dólares.

Dez.

Miseráveis.

Dólares.

Liana soltou uma risada que virou soluço, e então caiu sentada na calçada, cobrindo o rosto com as mãos.

— Eu sou uma idiota… — sussurrou, a voz embargada. — Uma completa idiota…

Fugiu da traição, fugiu daquele bicho idiota, fugiu da própria vida, e agora estava sozinha, sem dinheiro, sem celular, sem direção, em uma cidade desconhecida.

“Que merda eu estava pensando?”, brigou consigo mesma, batendo o pé no chão com força o suficiente para fazer seu calcanhar doer.

As lágrimas finalmente vieram, correndo quentes pelas bochechas. O parque brilhava à sua frente, cheio de risos e vida, enquanto ela estava caída num canto esquecido, como um pedaço de lixo descartado pela própria história.

Foi então que ouviu.

Pequenos passos apressados, depois um soluço.

Um garotinho passou correndo por ela, os olhos azuis inundados de lágrimas, a camisa social amassada e suja como se tivesse rolado no chão. Ele tropeçou, caiu de joelhos no asfalto, ralando as mãozinhas,  e começou a chorar mais alto ainda. 

A ruiva olhou ao redor e não viu ninguém vindo até ele esperou apenas alguns segundos a mais e nada… Então decidiu agir. 

— Ei! Tudo bem, pequeno? — Liana se levantou rapidamente, esquecendo seu próprio caos por um momento. — Você se machucou? Está perdido?

O menino ergueu o rosto, e ela lhe deu um pequeno sorriso, limpando as lágrimas que escorriam pelas bochechas do menininho que era uma gracinha, mesmo triste.

— E-ele… ele não veio… — o garotinho sussurrou, soluçando. — Eu cantei e… e o papi não veio de novo…

Liana se abaixou ao nível dele, limpando as lágrimas que escorriam com os polegares suaves.

— Quem não veio, amor?

— Meu… meu papi… — Kian choramingou, cobrindo o rosto com as mãos pequenas. — É dia dos pais… e… e eu esperei… mas só veio aquela mulher chata… e eu não gosto dela… ela não é minha mamãe… e… e eu fiz tudo certinho… fiz tudo certinho e ele não veio mesmo assim…

O choro do menino era tão desesperado que Liana sentiu lágrimas queimarem seus próprios olhos, era tão triste ver um menininho chorando assim. Ela entendia aquele sentimento, também não teve um “papi”, era orfã e sempre foi ela e sua irmã a vida inteira… 

“Aquela vadia”, pensou, engolindo o bolo na garganta. 

— Ei… — sussurrou, puxando-o para seu peito, abraçando-o com cuidado. — Você fez tudo certo, eu tenho certeza. Às vezes os adultos… erram. Mas não tem nada a ver com você, ouviu?

Ele chorou mais forte, agarrando a blusa dela com mãozinhas trêmulas.

Liana respirou fundo, acariciando seus cabelos.

— Qual o seu nome?

— K-Kian… — ele fungou.

— Kian… — ela repetiu, com delicadeza. — Eu sou Liana.

Ele a olhou com os olhinhos tristes e ela pensou um pouco suspirando imaginando que se arrependeria do que iria fazer, mordeu o lábio e suspirou, antes de falar:

— Sabe o que eu acho, Kian? — ela disse, levantando-se e segurando a mão dele. — Que hoje ainda pode ser um dia muito feliz.

— N-não pode… — ele fungou.

— Pode sim — ela sorriu, um sorriso verdadeiro pela primeira vez em horas. — E eu vou provar. Quer um sorvete?

Kian piscou.

A tristeza ainda pesava nos olhos, mas a esperança brilhou ali, tímida.

— Quero… — murmurou.

— E depois vamos em um brinquedo. O que você quiser.

— S-sério? — ele perguntou, segurando a mão dela com força.

— Sério — ela afirmou. — Hoje eu sou sua babá de emergência.

E assim, com apenas dez dólares e um coração destruído, decidiu transformar a tarde daquele menino, e sem saber, transformar sua própria história também.

***

O parque estava vivo, cheirava a algodão doce e tinha música pra todo lado.

Kian correu com ela entre as barraquinhas, escolhendo o sorvete mais colorido, lambendo a casquinha enquanto Liana fazia piadas e tentava manter os pensamentos escuros longe. Eles foram no carrossel, já que ela só tinha dinheiro para uma casquinha e um brinquedo, e Kian ria, se divertindo como se aquele fosse o melhor dia de sua vida.

Quando o sol começou a se pôr, pintando Storm City em tons alaranjados, Kian sentou-se num banco com outro sorvete nas mãos, cortesia de um vendedor que “não resistiu ao sorriso dele” e a um charminho de Liana, já que ela não tinha mais dinheiro pra pagar nada. 

— Viu? Eu falei que hoje ainda podia ser um bom dia! — ela sorriu carinhosamente, acariciando os cabelos escuros do menininho, que assentiu várias vezes lambendo a casquinha. 

Liana pensou que talvez… talvez aquele dia não fosse tão ruim assim, até pra ela.

Até que ouviu uma voz masculina, profunda, grave, cortante como lâmina embebida em gelo.

— Tire as mãos do meu filho. Agora.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP