Capítulo III

Preparei a lancheira do Nico e terminei de organizar suas coisas para a escola, depois que ele tomou o café da manhã. Ele estava muito animado — nem parecia que, até pouco tempo, não queria ir. Caminhamos juntos até o carro da família, que nos levaria até a escola.

— Bom dia, Sr. Javier! — cumprimentei o motorista da família com gentileza.

Javier respondeu ao cumprimento, tanto a mim quanto ao Nico. Entramos em um carro preto, sofisticado, e seguimos em direção à escola.

Após retornar com Javier, fui até o quarto do Nico para arrumar alguns brinquedos espalhados. Ele é adorável, mas também é bem bagunceiro. Enquanto caminhava pelo corredor que levava ao quarto, uma porta se abriu. Dela saiu um rapaz jovem, bonito e elegante. Usava uma calça de alfaiataria bege e uma camisa polo branca. Seu cabelo era liso e castanho, o maxilar bem definido, e os lábios carnudos e rosados. Ele era bonito o suficiente para tirar o fôlego. Todos os homens dessa casa são assim?

Ele parou assim que me viu, fechou a porta atrás de si e deu alguns passos em minha direção.

— Você é a nova babá do Nicolás? — perguntou.

Assenti com a cabeça, um pouco tímida.

— Sim, sou Maya Mendez — respondi, nervosa. Ele era sério, e seu rosto carregava uma expressão um tanto fria.

— Meus cumprimentos. Me chamo Jonas, sou o irmão mais velho da família. Suponho que já tenha conhecido a todos — disse ele, sério e educado.

— Acredito que sim. Muito prazer em conhecê-lo — respondi, tentando ser tão educada quanto ele. Ele ficou alguns segundos olhando meu rosto.

— Está se adaptando bem? O Ravi não incomodou você? — perguntou.

— Estou me adaptando muito bem, obrigada. E… o Ravi não me incomodou — menti.

— Isso me surpreende. Ele ver uma mulher bonita como você e não querer incomodar... — disse ainda com a mesma expressão séria.

Fiquei ainda mais tímida com o comentário. Dei um leve sorriso, abaixando um pouco a cabeça.

— Muito obrigada pelo elogio — agradeci.

Mas ele não sorriu. Pelo contrário — o olhar endureceu ainda mais.

— Por que uma mulher jovem como você estaria trabalhando como cuidadora? Está pagando faculdade ou algo assim? — questionou.

— Não... Estou aqui porque preciso ajudar minha mãe — respondi, tentando não transparecer a tristeza. Ele me encarou por alguns segundos.

— Entendi... Espero que faça um bom trabalho. Até mais — disse, e se retirou.

Terminei de arrumar os brinquedos do Nico e fui para o meu quarto descansar um pouco. Na noite anterior, eu não havia dormido bem. Conversei com minha irmã por mensagem, falando sobre o novo emprego e sobre nossa mãe. Ela está se sentindo tão ferida quanto eu. Não quero sobrecarregá-la — ela ainda tem uma família para cuidar, e eu não poderia deixá-la sozinha bancando as contas do hospital onde nossa mãe está internada. Fico feliz por ter conseguido esse trabalho. Vai aliviar o peso que temos carregado nos últimos meses.

Mais tarde, sentei um pouco no jardim para respirar. A brisa leve, o verde vibrante, as flores... tudo ali parecia mais vivo do que eu havia me sentido nos últimos meses. Por um instante, o mundo silenciou.

— Tá olhando o quê? O nada tá te hipnotizando? — ouvi aquela voz grossa, sarcástica, vinda do meu lado.

Virei devagar. Ravi. Claro. Sentado em uma namoradeira, com um cigarro entre os dedos e aquele olhar insolente de sempre.

— Mas que mania você tem de aparecer do nada — resmunguei.

— Aposto que você adora quando eu apareço — disse, se esticando preguiçosamente no banco. — Só não admite.

— O que eu não admito é você me tratar feito brinquedo. Eu te fiz alguma coisa? O Nico falou alguma coisa de mim pra você?

— O Nico adora você. Fica falando o tempo todo. Isso já me dá motivo pra implicar — respondeu com um meio sorriso, batendo o cigarro contra a lateral do banco e apontando para o espaço ao lado. — Vai sentar ou vai continuar aí se fazendo de difícil?

Sentei, contrariada.

— Então qual é o seu problema comigo, Ravi?

— Meu problema? — ele me olhou de lado. — O problema é que sua boca tá longe da minha.

Fiquei muda. Senti o rosto esquentar. Ele se aproximou devagar, tão perto que eu podia sentir o cheiro de fumaça misturado ao perfume dele. Aqueles olhos estavam cravados em mim, sem qualquer vergonha.

— Você não tem noção, não? Eu sou funcionária do seu pai. Te conheço há, sei lá, dois dias.

— E daí? Você trabalha pra ele, não pra mim.

— Isso não faz a menor diferença. É errado. E você é um... um atrevido.

— É. Me disseram isso ontem também. — Ele soltou uma risadinha seca e jogou a cabeça pra trás. — O mundo é dos atrevidos, Maya. Você devia se arriscar mais. Vai ver, até gosta.

— Você fica melhor calado.

Levantei na hora, mas ele não deixou barato.

— Pra você vir me calar não custa nada — Deu mais um trago e soltou a fumaça devagar, com um olhar preguiçoso.

— Eu hein... Sua boca deve ter gosto de cinzeiro — retruquei, tentando conter o riso.

Ele riu também, mas abafado, como se não quisesse admitir. Saí dali com um sorrisinho escondido. Nico já estava pra chegar da escola. Era melhor ocupar a cabeça com ele... e não com aquele sorriso safado que ficava ecoando na minha memória.

Um tempo depois, após ajudar Nico com a lição da escola, Tereza veio avisar que o jantar seria servido. Então fui com ele até a sala de jantar. Assim que chegamos, ele correu para se sentar, e eu me retirei em seguida para jantar com os funcionários, na cozinha.

Percebi que, na sala de jantar, Lorenzo e Jonas já estavam à mesa — mas Ravi não estava lá.

Sentei junto com Tereza, Javier, Dulce (a outra faxineira da casa) e a cozinheira Maria.

Tereza me entregou um prato e pediu que eu me servisse. Assim fiz.

— O Ravi já veio pegar a comida dele? — questionou Tereza, olhando para Maria.

— Sim, ele já passou aqui. Às vezes tenho pena desse rapaz — comentou Maria.

— Essa casa virou de ponta-cabeça desde que a senhora Estela se foi — disse Javier, com um tom melancólico.

— Tenho certeza de que a Sra. Estela deve estar se revirando no caixão, vendo o rumo que essa família tomou. Isso sim! — comentou Dulce, ríspida e amarga.

— Quem é essa Sra. Estela? — perguntei, curiosa. Todos viraram seus olhares para mim.

— Ah, querida… você não a conheceu. Ela era a senhora desta mansão — falou Tereza, com gentileza.

— A esposa falecida do Sr. Lorenzo — explicou Javier, antes de enfiar um garfo cheio de macarrão na boca.

— Depois que ela morreu, todo mundo aqui parece ter enlouquecido — comentou Dulce, ainda com aquele ar de desgosto.

— Daqui a pouco até eu vou ficar louca! — disse Maria, arrancando risos do pessoal ao redor.

— Por que o Ravi não janta na mesa com os outros? — perguntei, um pouco receosa.

Eles trocaram olhares como quem carrega um segredo pesado. O ambiente ficou tenso.

— Sabe o que é, querida… ele não tem se dado muito bem com o irmão mais velho e com o pai. Sempre que estão juntos, acabam discutindo. Por isso, ele evita se sentar à mesa com eles — explicou Tereza. Notei uma tristeza sutil em seu olhar.

— Aquele rapaz é muito complicado. Isso sim — retrucou Javier, sem rodeios.

Tereza imediatamente mudou a expressão, visivelmente aborrecida. Encarou Javier como se enxergasse dentro da alma dele.

— Não fale assim. Você sabe o que ele passou. Ele já sofreu demais nessa casa — rebateu Tereza, firme.

— Então que vá embora logo. Ele não é mais criança, pode tomar o rumo dele — respondeu Javier, indiferente ao incômodo dela.

— Concordo. Ele vive criando confusão, Tereza — acrescentou Dulce, entrando na discussão.

— Vocês são dois insensíveis. Eu vi aquele menino nascer e crescer aqui. Conheço ele melhor do que ninguém. Sei que vocês dois só sabem julgar o rapaz. Não têm vergonha de não ter um pingo de empatia? — retrucou Tereza, ríspida.

— Ihhh! Já começou a advogada do Gallardo-problema — brincou Javier, debochado.

— Urgh! — resmungou Dulce, revirando os olhos, enquanto Maria ria da discussão como se estivesse assistindo a um espetáculo.

Depois daquela conversa, me peguei pensando:

Essa mansão, apesar de tão imensa e sofisticada, carrega dores profundas.

O que será que aconteceu aqui para que cada um viva como se estivesse preso dentro de si mesmo?

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