Capítulo IV

Mais de uma semana se passou desde que estive aqui, no clima frio e acinzentado da mansão Gallardo. Nesse meio tempo, todos os dias têm sido iguais. Mal se vê o Sr. Lorenzo, Jonas apenas me cumprimenta educadamente quando me vê, mas está sempre com um olhar infeliz e expressão de seriedade. O idiota do Ravi continua com as mesmas provocações de sempre. Nico e eu nos aproximamos bastante — acho que ele é um pequeno sol que traz luz a esse lugar. Nunca imaginei que fosse possível me sentir acolhida em uma casa tão fria. Mas Nico... ele aqueceu tudo.

Eu estava no escritório do Sr. Lorenzo — hoje foi um dos poucos dias em que ele decidiu trabalhar de casa.

— A partir de hoje, você é oficialmente a babá do Nicolás. Ele está bem melhor com você aqui, só fala de você durante as refeições. Devo reconhecer que ele precisa de você — disse o Sr. Lorenzo, direto e sério.

— Eu fico grata, senhor. Estou muito feliz com essa notícia. É importante pra mim estar aqui — falei, sorrindo e aliviada por ter conseguido ficar.

Ele me pediu algumas documentações e dados bancários para depositar a quantia correspondente à semana como adiantamento. Fiquei feliz por finalmente ter algum dinheiro na conta. Vou poder pagar alguns custos hospitalares sem ficar completamente quebrada. Após acertarmos os detalhes do trabalho, levantei-me e saí do escritório.

Dei de cara com Jonas, que estava entrando. Ele me olhou por alguns segundos como se quisesse dizer algo, mas no fim apenas me cumprimentou educadamente e adentrou o escritório de seu pai, fechando a porta logo em seguida.

No quarto de Nico, ele estava debruçado na cama, com uma carinha tristonha — como sempre ficava após jantar com o pai e o irmão. Resolvi ceder à curiosidade e perguntar o que atormentava aquele coraçãozinho.

— Ei! Por que você fica assim, hein? Sempre que janta com seu pai, você volta e faz essa carinha triste que parte o meu coração — questionei, forçando uma expressão de tristeza para diverti-lo.

— Sinto falta do papai. Ele não gosta de brincar comigo. Eu já vi fotos dele com o Ravi e o Jonas, quando eles eram crianças como eu. Ele sempre aparece brincando com eles nas fotos... e a mamãe também. Mas comigo... ele nem liga — desabafou. Seus olhinhos começaram a encher de lágrimas, mas elas não escorreram.

Ele virou-se e deitou de costas para mim.

— Não fala assim. Ele ama você, assim como ama seus irmãos. Só está muito ocupado ultimamente — tentei aliviar a tristeza dele. Pra quê eu fui perguntar?

— Ele está ocupado desde que eu nasci. Ele não gosta do Ravi, só do Jonas, aquele chato — disse, começando a emburrar.

— Por que você acha o Jonas chato? — perguntei, curiosa.

— Ele nem liga pra mim, e quando fala comigo, fica me fazendo parecer um bobão. Tenho medo dele. Ele parece um vampiro — respondeu como se a razão fosse óbvia.

— Só porque ele é sério? — tentei conter o riso.

Ele ficou pensativo.

— Se for assim, como é que você gosta tanto do Ravi? Ele não é a pessoa mais animadora do mundo — retruquei.

— Você é boba — ele falou espontaneamente, como se eu tivesse dito a maior besteira do universo. — Ele é legal. Ele não é bravo de verdade. Só fica triste às vezes. Acho que ele sente mais falta da mamãe do que todo mundo, mas não gosta de falar disso — concluiu.

— Entendi... Olha, seu pai ama você, mesmo que tenha desaprendido a demonstrar. Ele só está cansado e, por isso, me chamou para brincar com você quando ele não puder fazer isso. O Jonas não é um vampiro, e você não precisa ter medo dele. Ele também é só ocupado e muito sério. Mas tenho certeza de que também te ama. E o Ravi já cuida de você. Então, não fica triste — tentei consolá-lo.

Ele assentiu com a cabeça, demonstrando conformação com o que eu disse, mas duvido que tenha funcionado de verdade.

Mais tarde naquele mesmo dia, eu tinha acabado de tomar banho e já ia ver se Nico estava realmente dormindo. Estava ventando muito; as cortinas da janela se sacudiam agitadas. Fui até a janela para fechá-la. Ao olhar brevemente para fora, vi o jardim dali de cima — Ravi estava sentado na mesma namoradeira, fumando aquele bendito cigarro. Ele olhava para o nada, com um olhar perdido. Parecia triste. Por que ele estava ali sozinho aquela hora? Resolvi ir até lá.

— O que foi? O nada tá hipnotizando você? — falei atrevida, mas com um pouco de receio.

Ele virou-se imediatamente, os olhos alertas.

— Que susto! Ficou maluca? — respondeu bravo, tentando se recompor.

Eu ri descontroladamente.

— Vai rindo... depois quem vai rir sou eu. Tá fazendo o que aqui essa hora? E em território inimigo — questionou, ainda com feição de aborrecimento, mas já no tom sarcástico de sempre.

— Faça isso. Você precisa mesmo botar um sorriso de verdade nessa sua cara carrancuda. E eu que te pergunto o que você tá fazendo aqui. Eu vim aqui pra saber isso — falei, me recuperando do riso.

— Virou minha amiguinha agora, foi? — ele perguntou, sarcástico.

— Não. Só não tenho mais energia pra duelar com você — respondi, dando um sorriso forçado.

— Que pena. Eu tava contando com isso — respondeu, colocando o cigarro na boca.

— Lamento por você. Mas... é sério, você sempre fica aqui nesse jardim sozinho. No que fica pensando? — questionei, com a voz mais suave.

Ele olhou pra mim com o rosto sereno. Ficou assim por alguns segundos, parecia que estava olhando para a minha boca.

— Eu fico pensando... que horas você vai aparecer naquela janela distraída e vai se trocar sem se dar conta de que ela tá aberta — disse, apontando para a janela do meu quarto.

Logo aquele maldito sorriso de canto surgiu em seu rosto.

Dei um leve tapa no ombro dele, ficando impaciente.

— Você é sem noção. Isso só vai acontecer nos seus sonhos — falei, irritada.

— Não. Nos meus sonhos acontecem coisas melhores — disse, parecendo se segurar para não rir.

— Por que você é assim, hein? Sabia que, se não fosse por você plantado aqui dia e noite como se fosse uma dessas árvores, esse também seria o meu lugar preferido da mansão? — falei, tentando não me irritar mais.

Ele suspirou e parou de me olhar. Parecia carregar o peso do mundo nas costas.

— Eu só... estou tentando fugir do clima pesado da casa. Fico pensando em coisas do passado. Nada demais — confessou, quase sem querer.

— Ultimamente também sinto vontade de fugir. Não da casa, mas de tudo — falei, pensando nos meus problemas.

— Por quê? — ele foi rápido em perguntar.

— Eu... estou trabalhando aqui porque a minha mãe está em coma... os custos hospitalares são caros, e aqui foi a melhor oportunidade que encontrei. Eu queria poder fugir dessa realidade, do medo do que pode acontecer com ela — uma lágrima teimosa escorreu no meu rosto.

Ele me olhava com empatia, mas ao mesmo tempo parecia confuso. Esticou o braço e enxugou a lágrima do meu rosto com delicadeza. Em seguida, se afastou e jogou o cigarro fora. Virou-se novamente pra mim.

— Não tem por que fugir nem sentir medo. Ela ainda está aqui... e vai acordar logo. Você não vai perdê-la. Fique confiante, mesmo sendo difícil — disse, sentando-se mais próximo de mim. — Eu não sabia que você estava passando por um momento tão difícil. Como pedido de desculpas, vou permitir que esse jardim seja seu lugar preferido sem te incomodar — falou, olhando fixamente pra mim.

Sorriu, mas não era aquele mesmo sorriso sarcástico de sempre — era um sorriso genuíno e solidário. Senti conforto. Queria abraçá-lo, mas não podia tomar essa iniciativa. Então só agradeci.

— Obrigada... eu vou tomar mais cuidado com aquela janela — falei, olhando para a janela do meu quarto, tentando quebrar o clima melancólico.

Ele abaixou a cabeça e riu, soprando o ar pelo nariz.

— Vou dar uma olhada no Nico... — falei, me levantando e me retirando, deixando-o lá, pensativo como estava antes de eu aparecer.

No quarto do Nicolás, organizei alguns brinquedos que estavam espalhados silenciosamente, pois ele já dormia sereno na cama. Sentei em uma poltrona de urso que tinha perto da porta e fiquei pensando na conversa espontânea que tive com Ravi. De fato, ele não é de todo ruim. Jamais pensei que ele seria a primeira pessoa a me acolher diante de tudo que estou passando. A me aconselhar e cuidar de mim de alguma maneira. Inevitavelmente, abri um sorriso enquanto pensava nele, atormentada pelo fato de que eu não queria ter saído do jardim. Queria ter ficado ali, com ele.

Ouvi a voz de duas pessoas discutindo, vindo do corredor dos quartos. Era Ravi discutindo com Jonas. Fiquei à espreita, tentando absorver o que estavam dizendo.

— Não tem nada melhor pra fazer? Por que tá enchendo minha paciência uma hora dessas? — Ravi dizia, visivelmente irritado.

— Você nunca vai crescer. Desse tamanho e ainda continua o mesmo idiota de sempre. Não tem pena do nosso pai? Não basta o que você fez? — Jonas esbravejou.

— Você ama falar disso. Qual é o seu problema? Ele é seu pai agora? Ou só o seu chefe? — Ravi respondeu.

Dava pra sentir a raiva na voz dos dois.

— Se não fosse por você, talvez ele ainda seria um pai. Você não cansa de ser esse fardo? Vira homem e acorda pra vida! Eu odeio ter que olhar pra sua cara, ter que suportar você aqui, ter que saber da sua existência — disse Jonas, com ódio.

Fiquei perplexa. Quis acreditar que o sono me fez ouvir tudo errado. Como pode um irmão dizer algo assim para o outro?

— E você vai fazer o quê, Jonas? Vai me matar? — Ravi respondeu, com a voz tensa.

— Eu não. Essa é a sua especialidade... — Jonas retrucou.

Tudo ficou em silêncio por alguns segundos e então...

— Seu merda! — Ravi gritou.

Ouvi um som seco, de pancada. Depois outro. E outro. Eles estavam se agredindo.

— O que eu faço? — murmurei para mim mesma, em pânico.

Olhei para Nico — ele dormia profundamente. Criei coragem e abri a porta do quarto.

A cena me atingiu em cheio: os dois estavam trocando socos. Jonas tinha uma vermelhidão na maçã do rosto. O lábio de Ravi estava partido. Ravi estava em cima do irmão, completamente fora de si. Jonas, caído e quase sentado no chão, foi o primeiro a me notar.

— Para! O que é isso?! — gritei em desespero. Tentei puxar Ravi pela camisa.

Ele parou. Virou-se para mim.

O rosto dele dava medo. Uma fúria sombria tomava conta de cada traço. Senti minhas pernas fraquejarem.

E, ali mesmo, enquanto o encarávamos — Jonas ferido e eu, paralisada — eu comecei a me perguntar: quem, de fato, era Ravi Gallardo? Até onde essa raiva poderia levá-lo? Eu deveria me aproximar... ou me proteger?

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