Capítulo V

Fiquei imóvel, olhando para Ravi. Aquela expressão assustadora no rosto dele não desaparecia. Eu tive medo, sem saber o que fazer a partir daquele momento. Foi quando finalmente ouvi sons de passos apressados se aproximando. Para a minha felicidade, logo Tereza surgiu no corredor com semblante de preocupação.

– Ah! Ainda bem, Tereza. Ajuda aqui! – chamei por ela, aliviada por tê-la visto.

– O que está acontecendo? Que confusão... O que aconteceu com os rostos de vocês dois? – Ela fez seus questionamentos, ainda preocupada, e ajudou Jonas a se levantar do chão.

Jonas ajustou o terno que estava vestindo de maneira suave e elegante. Devagar, começou a tocar no rosto, no lugar onde estava machucado. Sua expressão era de frieza e raiva.

– Desculpa, Tereza… – Ravi finalmente disse algo.

Ele estava de cabeça baixa e seus punhos ainda estavam fechados. Parecia estar tentando conter as emoções. Um pouco tarde para isso.

– Vocês quase acordaram o Nicolás com essa confusão – falei, gaguejando.

Eu ainda estava muito nervosa, ainda sentia meu corpo fraco. Como aquele olhar do Ravi pode ter causado esse impacto em mim?

– Sinto muito… Eu vou pro meu quarto – Ravi falou com a voz rouca e baixa.

Ele se retirou, adentrando seu quarto porta adentro.

– Menino… Vocês não se entendem, mas já são rapazes formados. Não tem cabimento… O que sua mãe pensaria vendo vocês dois assim? Vocês têm que parar de se tratarem como inimigos. Vocês são família – Tereza dizia sem parar, insistente e cansada, como se estivesse suplicando para Jonas. Porém, ele a interrompeu.

– Chega disso, Tereza. Ponha-se no seu lugar e pare de se meter nos nossos assuntos. Você não está sendo paga pra isso – falou firme e ríspido. Ainda estava muito aborrecido.

Tereza calou-se no mesmo instante. Olhou para Jonas com um olhar de pena e logo se retirou do local, deixando-o ali. Fiquei ainda no mesmo lugar, olhando para ele. Senti medo de dizer qualquer coisa depois de ver o sermão que ele deu em Tereza. Mas ele próprio começou a falar.

– Desculpa ter te assustado. Você não precisava ter visto isso – falou, voltando a alisar seu terno com as mãos delicadas.

– Você está bem? Quer que eu busque o kit de primeiros socorros? O seu rosto está... – Fui interrompida.

– Não precisa. Eu tenho aqui no meu quarto. Vá pro seu quarto e não se preocupe com mais nada – falou com a mesma frieza de sempre.

Virou-se para a porta de seu quarto e, ao tocar a maçaneta, falou comigo de novo.

– Por favor… Esqueça o que viu aqui – concluiu.

Adentrou seu quarto e se fechou lá dentro antes mesmo que eu pudesse responder alguma coisa.

Deitada na cama, eu não conseguia parar de pensar nem por um segundo no que acabara de acontecer. A voz do Jonas ecoava constantemente em minha cabeça: “Essa é a sua especialidade.” O que ele quis dizer com isso? O que o passado de Ravi esconde? Ele só tem apoio do Nico e da Tereza. Fora eles dois, ninguém aqui mal olha na cara dele. Ele vive sozinho e sempre com o mesmo olhar de cansaço, como se estivesse carregando o peso do mundo nas costas. Qual pecado ele pode ter cometido? Tem algo muito errado nesse lugar. Até que eu dormisse, não pude pensar em outra coisa.

Na manhã seguinte à fatídica noite, fiz como em todas as manhãs: acordei o Nico, ajudei-o a se aprontar para a escola, esperei que ele tomasse o café da manhã junto ao Lorenzo e Jonas. O acompanhei até a escola e retornei à Mansão Gallardo com Javier ao volante.

Pouco tempo depois, entrei no quarto do Nico para organizar os brinquedos que ele sempre deixava espalhados. Ao adentrar o quarto, pude ver Tereza arrumando a cama. Ela virou-se com o barulho da porta abrindo.

– Tudo bem, querida? – perguntou, abrindo um sorriso singelo.

Comecei a pegar alguns brinquedos do Nico que estavam no chão.

– Ah, filha, não precisa se incomodar. Deixa isso aí que eu arrumo – disse, fazendo sinal com as mãos para que eu os soltasse ali.

– Tudo bem. Não tenho muito o que fazer enquanto o Nico está na escola – falei e continuei a arrumar os brinquedos.

– Ah, obrigada, filha – agradeceu, sorrindo.

Sentei um pouco na cama e criei coragem para falar sobre o que eu queria.

– Aqueles dois sempre foram daquele jeito? Ontem foi bem chocante pra mim – questionei.

Ela parou um pouco, pensativa, mudou a feição para uma de preocupação e veio me ajudar com os brinquedos ao terminar a cama.

– Jonas sempre foi muito ciumento com o Ravi e a Sra. Estela, mas não é como se ele o odiasse. Depois da morte dela, tudo começou a ficar do jeito que você viu. Logo que ela morreu, eles brigavam igual dois cachorros. Não podiam se ver que já saíam se mordendo, mas com o tempo só passaram a se ignorar. Não sei o que pode ter acontecido ontem para eles resolverem brigar desse jeito – explicou.

– Foi uma briga feia… A senhora chegou a ver o Ravi hoje? – questionei.

– Não, querida. Vi que ele saiu ontem à noite com aquela droga de moto e até agora não voltou. Nem sei onde esse menino se enfia quando está irritado, mas sempre volta bêbado e acaba levando bronca do pai. Ele ainda resolveu fazer isso hoje que o Sr. Lorenzo está trabalhando em casa – falou.

– Sério? Eu nem percebi ele saindo – falei.

– Essa casa é enorme. Quase não se percebe a presença um do outro. Vi ele sair porque já imaginava que faria isso depois daquela briga. Conheço esse menino desde que nasceu. Ele não me surpreende em nada – indagou.

Eu queria perguntar sobre o que ouvi Jonas falar na noite passada, sobre matar ser a especialidade do Ravi. Aquilo não sai da minha cabeça, mas não acho que a Tereza vá se abrir comigo sobre isso, então resolvi deixar de lado por enquanto. Pensei em investigar de alguma outra forma.

– Espero que ele esteja bem – falei, e logo quis mudar o assunto. – Tem alguma foto da Sra. Estela? Todos sempre falam dela. Às vezes fico curiosa de saber como ela era – perguntei.

– Ah! Tem um álbum de fotos enorme lá embaixo, na sala. O Sr. Lorenzo pediu que tirassem todos os porta-retratos grandes que tinham com a foto dela da casa… Mas no álbum tem várias fotos dela com a família – falou com um olhar de tristeza.

Cheguei a me arrepender de ter perguntado. Ela parecia ter muito apreço pela Sra. Estela.

– Ah, que droga! Esqueci o aspirador de pó lá no quarto do Sr. Lorenzo. Vou lá pegar, minha filha. Pode ir fazer outra coisa, eu arrumo o resto do quarto – falou e saiu às pressas.

Não pude fazer outra coisa além de descer até aquela sala imensa para ver o álbum de fotos, pois a curiosidade estava me chamando. Assim que cheguei à sala, comecei a procurar pelo álbum. Ele estava na estante. Era um livro grande, com várias páginas. Sentei na poltrona com o álbum, morrendo de medo de alguém aparecer e me ver bisbilhotando, então resolvi ser rápida.

Comecei a folhear uma a uma. Tinha uma mulher que aparecia em várias fotos, com certeza era a Sra. Estela. Ela era linda, com um sorriso enorme em todas as fotos. Os cabelos eram castanho-claro, os olhos cor de mel, um rosto comprido com traços delicados. Em muitas das fotos ela aparecia grávida de algum dos irmãos Gallardo. Em outras, ela estava em um barco com o Sr. Lorenzo e um garoto que aparentava ter uns treze anos e outro que parecia ter uns dez.

– Jonas e Ravi… – sussurrei baixinho e abri um leve sorriso.

Eles eram uma graça quando crianças. Mudaram pouca coisa. De fato, o álbum era repleto de lembranças felizes da infância dos dois. Entendo agora o porquê de o Nico se sentir como se fosse tratado com diferença. É lamentável que as coisas tenham tomado uma direção tão fora da curva. Eles são muito bem-sucedidos, mas suas vidas ainda parecem arruinadas.

Ouvi a porta da sala ser aberta e uma voz estranha falando algo que não entendi direito. Meu corpo gelou. Não queria que ninguém visse que eu estava bisbilhotando. Fechei o álbum e rapidamente o devolvi para o mesmo lugar. Ao virar-me, vi que era o Ravi entrando. Ele estava cambaleando, claramente bêbado, e falando coisa com coisa. Corri até ele para ajudá-lo a andar melhor.

– Credo, o que aconteceu com você? Você estava bebendo até agora? – perguntei, fazendo cara feia pelo cheiro da bebida forte que senti vindo dele.

Coloquei um dos braços dele sob o meu ombro e comecei a guiá-lo até as escadas que levam aos quartos da mansão.

– Eu mal encostei uma garrafa de cerveja na boca – falou e começou a rir descontroladamente enquanto andava quase se arrastando pelo chão.

– Para de rir alto assim, seu idiota. Quer que o seu pai apareça aqui e te veja assim, é? – falei baixo.

– Tô nem aí pra isso. Ele que venha me enfrentar como homem. É só pra me falar merda que ele tem coragem de olhar na minha cara mesmo – falou e começou a rir mais ainda.

– Cala a boca – falei e tampei a boca dele para tentar abafar o som do riso que ecoava pela sala inteira.

– Tem jeito melhor de você fazer isso – falou, rindo, enquanto tentava tirar minha mão da boca.

– Já vai começar com isso? Anda, segura o corrimão também – falei.

Ajudei ele a terminar de subir as escadas. Foi uma tarefa árdua. Ele não parava quieto, falava mil e uma besteiras e mal conseguia se aguentar de pé. Até que finalmente chegamos ao quarto dele. Coloquei ele na cama, ele logo se deitou com metade das pernas para fora. Tirei os sapatos dele e as meias.

– Você deve ter sujado a casa toda com esses sapatos. Vou dizer pra Tereza que foi você – falei, brincando.

– Tira a minha roupa também – falou baixo, com a voz rouca e cansada.

– Se toca, idiota! Vê se dorme logo – falei.

– É sério, eu tô com calor – Ele se sentou por um instante e tirou a camisa que estava vestindo.

Ele jogou a camisa longe e voltou a cair com as costas na cama. O corpo dele era escultural. Por um momento, cheguei até a perder o raciocínio. Como ele pode ser tão atraente? Me esforcei pra parar de olhar pra onde não devia e ajudei ele a se ajeitar na cama para conseguir dormir melhor. Porém, senti a mão dele me puxar pelo pulso. Caí direto em cima dele. Nossos rostos ficaram cara a cara, tão perto que podia sentir a respiração dele no meu rosto e aquele cheiro de bebida. Fiquei tão nervosa que comecei a sentir meu corpo fraquejar. Ele estava tão quente e macio. Sentir ele me envolvendo em seus braços foi o que me deixou ainda mais fraca. Ele me apertou contra si levemente em um abraço caloroso que fez meu coração disparar.

A essa altura é difícil negar que ele realmente mexe comigo. Eu sabia que era errado, mas não queria sair dali. Queria que aquele momento durasse horas.

– Fica aqui um pouco – ele pediu com a voz baixa e rouca em meu ouvido.

Senti meu corpo estremecer.

– Ravi, eu não posso fazer… – Ele me interrompeu.

– Shiii! – ele fez, enquanto fazia minha cabeça se apoiar no peitoral dele.

Eu me deitei na cama e fiquei ali com a cabeça apoiada nele.

– Onde você estava? – questionei.

– Eu estava em um dos meus lugares preferidos – falou, com aquela voz típica de bêbado.

– O bordel? – perguntei, sarcástica.

– Não exatamente. Gosto de ir lá pra esquecer os problemas – falou, se esforçando um pouco.

Os olhos dele estavam praticamente fechados. Ele falava baixo, com o rosto virado pra mim.

– Duvido que funcione – falei, firme.

– Funciona enquanto a bebida faz efeito – respondeu.

Senti a mão dele começando a acariciar meu cabelo.

– Para, Ravi. A gente nem tinha que estar assim – falei, tentando me levantar. Porém, ele me puxou de volta para a posição em que estávamos.

– Por que não? Se os dois querem... – falou.

– Você só está bêbado e eu sou só uma funcionária. Você também já deve ter se divertido bastante com outras mulheres essa noite, então para quieto – falei, sentindo um pouco de ciúmes.

– Eu até tentei, mas não rolou. Tava pensando em você – falou.

– Mentira – retruquei.

– Tô falando sério. Eu fiquei mal ontem. Não queria que você tivesse visto aquilo. Sabe que não precisa ter medo de mim, né? – falou, quase com a voz cansada.

– Não tenho medo de você – falei.

– Desde que você chegou aqui, tenho vontade de você. De todas as mulheres que vi ontem, nenhuma tinha a sua beleza e o seu jeito. O tempo todo fico imaginando a sensação de beijar a sua boca – falou bem perto do meu ouvido.

Aquela voz grave e rouca que ele tinha me fez arrepiar inteira. Meu corpo parecia que ia derreter.

– Você é doido – falei, gaguejando tanto que me deu até vergonha.

– Ninguém vai saber – disse, chegando ainda mais perto.

Eu deveria sair dali correndo, mas não conseguia mexer nem um dedo. Me senti paralisada pelo enorme desejo de que ele realmente me beijasse. E ele beijou. Encostou sua boca na minha e começamos a nos beijar em um encaixe perfeito. Meu corpo vibrava com a vontade de continuar e não parar nunca. Eu nem estava acreditando que aquilo estava acontecendo. Ele segurou minha cintura com uma das mãos e me puxou firme contra ele. Nem sei de onde ele tirou essa força do nada, mas eu estava começando a querer muito mais do que só beijos naquele momento. Quando senti a mão dele subir da minha cintura, devagar, até agarrar meu seio, quase enlouqueci. Eu me desfiz em prazer, mas logo caí na real de que aquilo poderia me prejudicar grandemente.

Levantei na mesma hora e fiquei de pé, o que fez ele me olhar com frustração.

– Não posso… Vai dormir, por favor. O Nico já vai chegar – falei, tentando me recompor.

Fui andando às pressas para sair do quarto, mas assim que abri a porta, o pior que poderia acontecer aconteceu. Dei de cara com o Sr. Lorenzo, que estava parado ali na frente como se fosse entrar no quarto. Fiquei travada, olhando para ele. Devo ter ficado até pálida. Ele franziu o cenho assim que me viu.

– Maya? O que estava fazendo aí dentro, no quarto do Ravi? – ele perguntou.

Seu olhar era frio, com ar de desaprovação.

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