Alana Silva sempre viveu com perguntas sem respostas — e um passado escondido por trás das paredes de um orfanato. Quando completa 21 anos, uma carta misteriosa revela que seu sangue pode carregar o sobrenome de uma das famílias mais influentes do país. Entre freelas de design gráfico e longos dias como babá, ela cruza o caminho de Leonardo, um viúvo recluso que perdeu a esposa para o câncer e hoje se esconde atrás das paredes da própria dor. Na mansão onde a pequena Lívia vive, cercada de silêncio e saudade, Alana encontra mais do que um trabalho. Há uma governanta amarga demais para uma simples funcionária, uma cunhada protetora que parece esconder segundas intenções, uma ex-noiva que surge do nada com olhos marejados e intenções confusas… E uma meia-irmã que a vê como confidente — sem saber o laço que as une. Mas quem realmente fala a verdade? Entre promessas quebradas, olhares não ditos e sentimentos proibidos, Alana vai descobrir que às vezes o maior segredo não é sobre quem ela é… mas em quem ela pode se transformar quando o amor e a verdade finalmente colidem.
Ler maisCheguei ao escritório cinco minutos antes das nove, hora marcada para a entrevista que mudaria minha vida, ou me levaria de volta a estaca zero. Fazia três semanas que eu havia me cadastrado numa agência de empregos. Assim que completasse 21 anos, precisaria me virar a ser sozinha, ou voltar a ser ninguém.
Eles têm um programa que permite ficar até essa idade, desde que a gente estude ou trabalhe. Aproveitei o tempo: cursei Design Gráfico numa faculdade parceira e fiz uns cursos online, como marketing e administração, tudo para tentar me virar nesse tal "mundo real". Incluí tudo no meu cadastro, mas a moça da agência foi direta: conseguir vaga como designer, sem experiência, não seria fácil. Aceitei qualquer oportunidade. — Bom dia, sou Alana Silva — me apresentei para a recepcionista. Ela consultou a agenda sem me olhar: — Sala dois. Bati na porta e só entrei quando ouvi uma voz feminina me chamar. — Oi, Alana? — perguntou a mulher atrás da mesa, folheando papéis. — Sou eu. — Pode se sentar — disse, indicando a cadeira com um olhar rápido e avaliador. — Eu sou a Regina. Você vive no orfanato Brilhante Luz? Assenti. — Desde os seis anos — complementei. Ela analisou minha ficha com atenção. — Fez cursos, está se preparando para sair do orfanato... E tem experiência com crianças, certo? — Sim. Sempre cuidei dos menores. A gente aprende cedo a dividir o pouco que tem — respondi, tentando soar tranquila. — Tem disponibilidade para se mudar esta semana? — Claro. Estou pronta. Ela anotou algumas coisas. — A vaga é para cuidar da Lívia. Você será responsável por ela quando o pai estiver fora. Nos horarios em que ele estiver em casa, ele assume ou te avisa pra ficar com ela. Folgas aos fins de semana. As vezes terá que trabalhar no final de semana, mas será combinado antecipadamente. Falou da rotina da criança, dos horários do tal Leonardo, o patrão e, por fim, do salário. Meus olhos brilharam. Era mais do que eu esperava. — Se aceitar, pode se mudar amanhã. Enviamos um motorista para buscá-la. — Aceito! — disse, quase sem acreditar. — Ótimo. Assine aqui. Primeiro mês é avaliação, depois experiência de três meses. Assinei com mãos trêmulas. Ao sair, um sorriso mal cabia no meu rosto. Uma nova fase começava, e eu teria onde morar, podendo buscar oportunidades como designer. Voltei ao orfanato pulando de alegria. Corri para contar a Elaine, que me abraçou forte, misturando felicidade e preocupação. — É um mundo completamente diferente do seu, Alana. Uma família riquíssima... Tome cuidado. — Vou ficar bem. Obrigada por tudo. — Não esqueça de mim, hein? Tenho seu número. — Como esquecer? Ainda vamos nos ver muito — garanti, abraçando-a de novo. Partir do orfanato foi mais difícil do que imaginei. Aquele lugar foi meu lar por tanto tempo. Sem mãe ou pai, achei uma família ali: Elaine e as cuidadoras minhas tias de coração, além dos outros funcionarios, meus irmãos. Amor de verdade, mesmo sem laços de sangue. Agora tudo mudaria, e eu não sei se vou mesmo sobreviver a isso. Fizeram uma despedida pequena, e eu chorei muito. Elaine e Cíntia, uma das meninas mais velhas, me ajudaram a organizar as coisas. O motorista chegou às oito. Silvio, um senhor simpático de meia-idade, cuidou das malas com cuidado. Entre abraços e promessas, deixei o orfanato. Rumo ao desconhecido. — Nunca viveu fora do orfanato? — ele perguntou, meio receoso ao dirigir. — Fui para lá aos seis anos. Desde então, é meu lar — respondi, meio sem jeito, mas tentando parecer forte. — Entendi... — silêncio. — Não se preocupe, não tenho problema em falar disso — sorri, tentando deixá-lo à vontade. Ele sorriu meio sem jeito, e seguimos conversando até chegar à casa. Silvio me contou um pouco sobre a rotina da casa, falou sobre alguns funcionarios e sobre o chefe, pelo jeito ele não é do tipo amigo de funcionarios, a não ser a Regina, que deve ser a mesma que me entrevistou. Também me alertou: — Nunca dê sinal de interesse romântico no chefe. Babás que fizeram isso foram demitidas. Assenti franzindo a testa, o patrão deve ser bonito pelo menos, pra funcionarias se arriscarem assim. Chegando à mansão, fiquei boquiaberta. Entramos pelos fundos: portão alto de ferro preto, câmeras, cartão para abrir. Era a entrada dos funcionários. A entrada dava para a área de serviço. Logo apareceu a mulher que falou comigo na agência, firme e impecável. — Obrigada, Silvio. O senhor Leonardo quer falar com ela antes de sair para a empresa. Pode esperar aqui. — Ela disse o olhando. — Traga as malas e deixe no quarto da babá. Silvio assentiu e foi buscar as malas. — Sou Regina, governanta. Funcionários usam sempre esta entrada e porta — apontou com firmeza. — Venha, vou mostrar a casa. Acompanhei seus passos elegantes pela área de serviço, pela lavanderia organizada e pelo corredor até a copa da equipe, um espaço modesto em meio à sofisticação. A cada passo, meu queixo caía mais: pisos de mármore, quadros elegantes, móveis clássicos com toque moderno. Tudo exalava riqueza. Regina me levou até a escada e ao quarto da babá, meu novo lar. O quarto era simples, mas com o mesmo estilo refinado. Paredes em tons neutros transmitiam calma. Cama de casal, criado-mudo com abajur, armário espaçoso e escrivaninha perto da janela, que dava para o jardim. — Vamos descer. O senhor Leonardo quer falar com você — disse Regina, seca. Seu semblante sério e quase impenetrável me apertou o coração. Se a governanta já era assim, imagine o chefe. Descemos as escadas em silêncio. A cada passo, eu me sentia mais uma peça encaixando num tabuleiro onde ainda não entendi as regras. Entrando por de tras da escada havia quatro portas alinhadas. Regina seguiu direto até a segunda, bateu duas vezes e cruzou os braços, esperando. Uma voz firme respondeu do outro lado: — Pode entrar. Regina abriu a porta com aquele ar de quem está prestes a entregar um documento muito suspeito. — A babá da vez está aqui — disse, seca, com um leve suspiro que me fez ter certeza absoluta de que ela revirou os olhos. — Obrigado, Regina. Pode nos deixar a sós — respondeu ele, sem sequer tirar os olhos da tela do computador. Ela hesitou. — Tem certeza? Seu olhar voou de mim para ele, depois voltou para mim com intensidade suficiente pra fritar um ovo. — Tenho. Regina bufou em silêncio, apontou a cadeira à minha frente e murmurou: — Sente-se. Obedeci, e ela saiu, fechando a porta com mais força do que o necessário. Qual era a dela? Achou que eu ia morder o chefe? Ou desmaiar só por estar na presença dele? Me acomodei na cadeira. Leonardo continuou digitando, como se eu não existisse. Olhei em volta, escritório elegante, móveis de madeira envernizados, uma mesa com o notebook e uma garrafa de água, um armario com duas portas tipo armario multiuso, um frigo bar, janela grande com cortinas blackout na cor marrom. O relógio na parede em cima da porta marcava 8h15, mas parecia que o tempo tinha decidido fazer uma pausa só pra me torturar. Com isso consegui reparar melhor nele, cabelo preto impecável, barba bem feita, postura alinhada. Só depois de concluir sua tarefa, com uma calma quase provocadora, ele se recostou na cadeira e finalmente me encarou. Um olhar frio que congelou a minha segurança e me deu inexplicavelmente um grande frio na barriga.Abaixei a cabeça diante do olhar firme de Regina. Ela estava parada na porta, como se fosse a guardiã daquele espaço. Pensei em sair, mas sua voz me interrompeu:— Pode ficar, se quiser.Hesitei. Mas ao ver que seus olhos não estavam duros, apenas observadores, voltei para o lugar, próxima da professora de Lívia. Roberta sorria enquanto olhava pai e filha ao piano, como se testemunhasse um pequeno milagre.— É bom ver o senhor Leonardo tocando novamente — comentou, com uma ponta de entusiasmo.— Ele não tocava há muito tempo? — perguntei baixo, sem desviar os olhos deles.— Desde a morte da esposa.Meu peito apertou. Olhei para Leonardo com mais atenção: seus dedos pressionavam as teclas com delicadeza, mas era nos olhos que o peso estava. Um sorriso contido, marejado, como se cada nota arrancasse lembranças que ele escondia de todos. Pensei em como deve ser doloroso não conseguir tocar nem mesmo por amor à filha.Quando a última nota ecoou, Regina bateu palmas:— Magnífico.— Foi mar
Um mês passou rápido demais, quase como se os dias na mansão seguissem um ritmo próprio, paralelo ao resto do mundo. Nesse tempo, o site de Rafaela já estava quase pronto, e eu me pegava orgulhosa de ter feito parte disso, como se tivesse ajudado a dar vida a algo muito maior que nós duas.Leonardo continuava sendo um mistério. Ainda era reservado, muitas vezes calado, mas… já não me olhava com a mesma desconfiança de antes. Era sutil, quase imperceptível, mas havia algo diferente no jeito que me observava. Não sei se era confiança, ou apenas a constatação de que eu não representava ameaça alguma, mas já era o bastante para deixar meus dias um pouco mais leves.O contrato de três meses de experiência já estava assinado. Oficialmente, eu fazia parte daquela rotina. E, de algum jeito, a mansão começava a se parecer com um lar, mesmo que fosse apenas emprestado.Verônica, por outro lado, era um enigma ainda mais confuso que o próprio Leonardo. De repente, ela decidiu se aproximar de mim.
Cheguei em casa exausto, tive três reuniões essa manhã e ainda tive que analizar relatórios de um dos hotéis que recebeu algumas reclamações nos ultimos meses, ainda quero entender o que está acontecendo por la.Verônica estava na sala mechendo no celular, a cumprimentei e dei um abraço em minha filha, afrouxei a gravata a tirando em seguida e fomos para a mesa.Depois de nos servir com Verônica falando sobre um casal de amigos que vão ter um filho eu me virei pra Lívia.— Como foi seu dia, filha? — perguntei.— A titia me levou na aula e depois a gente foi chupar sorvete.Meu garfo parou no ar. Sorvete? Eu a encarei, surpreso com a informação, antes mesmo de formular uma pergunta. Verônica se adiantou, quase tropeçando nas palavras:— Ora, Lívia, não precisava falar isso...Mas a menina, séria, retrucou:— A babá falou que eu tenho que contar tudo da minha vida pro papai.Meu olhar imediatamente buscou Alana. Ela estava parada na porta da cozinha, observando a cena, e parecia tão sur
Lívia se deitou rindo de algo que Alana disse e disparou:— Você é muito legal.A babá sorriu para ela, mas, ao cruzar os olhos comigo, ficou séria, quase tensa. Anunciei que ficaria com minha filha a partir daquele momento. Ela se levantou rápido e saiu, e Regina, que estava por perto, passou por mim indo em direção à cozinha.— Não seja tão duro com a babá. Ela está indo bem até o momento — comentou sem sequer me dar tempo de responder.Suspirei. Talvez ela tivesse razão. Alana vinha sendo respeitosa... pelo menos nesses dois dias. Mas ainda era cedo demais para qualquer conclusão.— Papai, senta aqui! — Lívia bateu no tapete colorido, me tirando do transe.Ergui a sobrancelha.— Bonecas? Você não prefere brincar de montar?— Não. É a cidade minha e da Alana.Suspirei e peguei a boneca que ela me estendia, tentando não parecer deslocado. Minha mão parecia enorme demais para aquele brinquedo delicado, já brinquei com ela de boneca diversas vezes, mas sempre era uma surpresa diferente
Leonardo*Por um instante, congelei na porta. No meio do quarto, uma barraca de lençóis estava armada, com cadeiras servindo de base e uma luz suave escapando por entre os tecidos. Era impossível não ser transportado para o passado.Minha esposa fazia exatamente aquilo. Quantas vezes eu a encontrei assim, transformando a sala ou o quarto em um castelo improvisado para as filhas da amiga dela. Depois, quando Lívia nasceu, também ganhou seu próprio esconderijo de lençóis, junto de suas amigas. A lembrança atingiu meu peito como uma flecha certeira, trazendo um aperto familiar entre a saudade e a ternura.Mas a cena diante de mim não era do passado.Lívia ria alto dentro da barraca, e, ao lado dela, estava Alana. A babá. Rastejando no carpete, com um sorriso no rosto, completamente envolvida na brincadeira, se metendo onde não devia.Meu estômago revirou. Não era papel dela ser a mãe da Lívia. Não era função dela ocupar um espaço que não lhe cabia.— O que está acontecendo aqui?Apertei
Leonardo estava com a expressão fechada. Livia, alheia à tensão, sorriu ainda mais ao ver o pai.— Olha, papai, nosso castelo! — Ela disse animada.Ele respirou fundo, forçando um sorriso para a filha. Antes que pudesse responder, Regina surgiu atrás dele.— O que houve? — perguntou, olhando de um para o outro.Olhei ao redor, tentando entender o que eu poderia ter feito de errado. Era só uma barraca de lençol... nada demais.— Filha, meu amor, vai com a tia Regina — disse Leonardo.— Mas eu tô no meu castelo... — ela respondeu, com a voz murcha.— Vai com ela, rapidinho. Papai precisa falar com a babá.Regina me lançou um olhar confuso, e eu devolvi o mesmo olhar pra ela quase dando de ombros. Pelo menos não era só eu que não entendia nada. Livia ainda tentou resistir, mas Leonardo a fez sair com Regina. Assim que a porta se fechou, ele me encarou, um olhar que misturava fúria e algo que parecia... dor. Não soube decifrar.— Desfaça essa bagunça agora — disse, respirando fundo e evit
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