A noite parecia ter mudado de textura. A cidade ainda fazia seus ruídos de sempre — sirenes distantes, o ronco de motores, passos indecisos nas calçadas —, mas havia algo a mais, uma vibração fina, como quando um copo de cristal começa a vibrar antes de quebrar. Aline sentiu primeiro. O relatório que chegou ao tablet, pouco depois das 22h, tinha a marca de quem sabe onde encostar o dedo: áudio claro o bastante, nomes demais, promessas demais.
César tinha perdido a compostura em um encontro reservado com dois “aliados” e um intermediário do tipo que sempre chega sorrindo e sai calado. Bebeu mais do que devia, falou mais do que podia. E alguém gravou. No trecho que importava, a voz dele se ouvia nítida: “Eu abro a porta, os meninos passam; vocês só mantêm as luzes apagadas.” Não citou “cartel”. Não precisava. A frase carregava a arquitetura do crime.
Aline ouviu três vezes. Na primeira, com profissionalismo. Na segunda, como quem confere costura. Na terceira, por respeito às consequênci