Entre Olhares e Instintos

Os dias seguintes se tornaram uma mistura perigosa de rotina e caos interno.

Desde que Augusto apareceu, nada mais parecia o mesmo.

O simples fato de entrar na sala e sentir o cheiro dele já era suficiente para me desestabilizar.

Era como se a presença dele ocupasse cada espaço, cada canto do ambiente, cada pedaço do meu controle.

Ele estava sempre por perto — em silêncio, mas presente.

Não importava o horário ou o lugar, de alguma forma nossos caminhos se cruzavam.

Às vezes, ele apenas passava e me lançava um olhar rápido, carregado de ironia e algo que eu não conseguia decifrar.

Outras vezes, se aproximava o suficiente para que o ar entre nós se tornasse eletricidade pura.

A loba dentro de mim reagia a cada encontro.

Rosnava, pulsava, chamava.

Mas eu me recusava a ceder.

Depois do que vivi com Enzo, prometi a mim mesma que não deixaria outro homem me ferir.

E, principalmente, que não deixaria meu instinto escolher por mim.

Mas Augusto era diferente.

Ele não pedia nada — apenas olhava.

E isso bastava para bagunçar tudo dentro de mim.

Naquela manhã, cheguei mais cedo à biblioteca, tentando me concentrar nos estudos.

As provas estavam próximas, e eu precisava de qualquer distração que me mantivesse longe dos pensamentos perigosos que ele provocava.

Mas o destino, como sempre, tinha outros planos.

— Gosta de acordar cedo? — a voz dele ecoou suave, rouca, bem atrás de mim.

Fechei os olhos por um instante, respirando fundo antes de virar.

— Não sabia que a biblioteca era o seu tipo de lugar — retruquei.

— Meu tipo de lugar é onde você está — respondeu, com aquele meio sorriso que fazia o coração disparar.

Revirei os olhos, tentando esconder o calor que subia pelas bochechas.

— Você devia arrumar outro passatempo, Augusto.

— Já arrumei — disse, apoiando-se na mesa à minha frente. — Você.

O tom dele não era brincadeira, e isso me desarmou completamente.

Tentei ignorá-lo, folheando o livro à toa, mas o cheiro dele me cercava, invadia tudo.

A loba se agitou, e uma parte de mim — a parte que eu lutava para suprimir — queria apenas se render.

— Não estou interessada em jogos — murmurei.

Ele se inclinou um pouco mais, os olhos fixos nos meus.

— Quem disse que isso é um jogo?

Por um segundo, esqueci como respirar.

O olhar dele era intenso, quase perigoso, como se ele pudesse enxergar tudo o que eu tentava esconder.

Me levantei bruscamente, recolhendo minhas coisas, tentando fugir.

Mas antes que eu pudesse dar um passo, ele sussurrou próximo o bastante para que só eu ouvisse:

— Não adianta correr de algo que já é seu, Hellena.

Meu corpo inteiro congelou.

O som do meu nome em sua voz me atingiu como um choque.

Não consegui responder.

Apenas saí, o coração descompassado, tentando recuperar o ar.

O resto do dia foi uma confusão.

E como se o universo quisesse piorar tudo, Enzo reapareceu.

Era a primeira vez que o via desde… desde aquela noite.

Desde a rejeição.

Ele estava diferente.

Olhar mais sério, semblante fechado.

Quando nos cruzamos no corredor, senti o peso do passado cair sobre mim.

— Hellena — ele disse, a voz baixa, contida.

Assenti, tentando parecer indiferente.

— Enzo.

Houve um silêncio pesado.

Ele me olhou de cima a baixo, como se quisesse dizer algo, mas se contivesse.

Até que seus olhos desviaram para trás de mim — e o vi endurecer a expressão.

Sabia o motivo antes mesmo de me virar.

Augusto estava ali.

Encostado na parede, observando tudo, com aquele ar relaxado e provocante.

O tipo de presença que fazia qualquer um se sentir pequeno.

Enzo o encarou, visivelmente incomodado.

— Amigo seu?

— Colega de classe — respondi, seca.

— Parece bem… interessado — ele comentou, o tom carregado de algo que soava como ciúme.

Engoli em seco, sem saber o que dizer.

Mas Augusto não perdeu tempo.

Aproximou-se devagar, o olhar preso no de Enzo, e com um sorriso quase imperceptível, colocou a mão sobre meu ombro.

— Nos vemos na aula, Hellena — disse, sem tirar os olhos de Enzo. — Não se atrase.

E se afastou, deixando o silêncio pesar entre nós.

O olhar de Enzo ficou escuro.

— Cuidado com quem você deixa se aproximar — disse, antes de virar as costas e ir embora.

Fiquei parada, sem conseguir reagir.

A loba dentro de mim rugia de forma desordenada, confusa entre a raiva, a curiosidade e o instinto.

Augusto me atraía de uma forma que eu não conseguia entender, enquanto Enzo…

Enzo ainda doía.

Mas já não da mesma forma.

A dor estava mudando de lugar — e o que surgia em seu lugar era algo novo, perigoso, impossível de ignorar.

Naquela noite, deitada na cama, encarei o teto escuro, o coração ainda acelerado.

As palavras de Augusto ecoavam na minha mente:

“Não adianta correr de algo que já é seu.”

Por mais que eu tentasse negar, algo em mim sabia que ele estava certo.

E isso me assustava mais do que qualquer rejeição poderia ter feito.

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