Aos dezesseis anos, Kayla Prescott se prepara para deixar o colégio interno católico onde passou a vida inteira, vinculado ao orfanato que sempre chamou de lar. Tudo muda quando a instituição recebe uma notícia inesperada: seus pais biológicos foram encontrados, e ela será enviada para viver com eles. Mas o reencontro com sua verdadeira família reserva muito mais do que uma nova casa. Kayla terá que lidar com segredos enterrados, uma nova dinâmica familiar — e com Kaiden Prescott, um irmão que abala todas suas estruturas e que é mais velho do que ela três anos. Entre descobertas, tensões e sentimentos desconhecidos, a vida de Kayla está prestes a mudar para sempre. Ela vai descobrir segredos de um legado ligado tanto pelo sangue como pela Lua.
Ler maisChegada de Kayla ao Orfanato St. Joseph’s Haven for Children
A neblina pairava baixa naquela manhã fria de outono, envolvendo em silêncio os arredores do St. Joseph’s Haven for Children, um orfanato católico situado nos arredores de uma pequena cidade americana. Os portões de ferro se abriram com um rangido suave, dando passagem ao carro preto do serviço social que avançava lentamente pela alameda coberta de folhas secas. Nos braços da assistente social, uma bebê recém nascida, observava o mundo com olhos azuis límpidos, grandes e silenciosos como um lago em pleno inverno. Seu cabelo loiro, puxado para um tom quase cobre, caía em mechas desalinhadas sobre a testa, contrastando com a palidez impecável de sua pele — branca como porcelana. A única coisa que apertava contra o corpo com força era um ursinho de pelúcia e em seu pescoço um colar fino em ouro, em sua roupa ainda continham marcas de sangue. Na escadaria principal, Irmã Margaret — de hábito azul-escuro e olhar maternal — aguardava com as mãos unidas em oração silenciosa. Ao ver a pequena, desceu alguns degraus e se abaixou lentamente, falando com ternura: — Seja bem-vinda, minha criança. Que São José te guie nesta nova casa. Kayla não respondeu. Mas diante daquele semblante calmo, do toque acolhedor e do som distante dos sinos da capela, ela cedeu. Encostou a cabeça no ombro da freira, como se ali, mesmo sem palavras, seu coração soubesse que aquele seria seu refúgio. Naquele dia, as portas do orfanato se fecharam atrás dela — não como uma prisão, mas como um abrigo. E mesmo sem entender, Kayla dava início ao capítulo mais transformador de sua vida. Os anos seguintes à chegada de Kayla ao St. Joseph’s Haven for Children foram surpreendentes. Embora tivesse sido acolhida em silêncio, a menina logo se revelou uma luz vibrante nos corredores de pedra do orfanato. Sua beleza chamava atenção desde muito cedo — os cabelos loiros de tom quase acobreado refletiam o sol com um brilho dourado, e seus olhos azuis límpidos pareciam ver muito além da superfície das coisas. Mas era o que emanava de dentro dela que verdadeiramente cativava a todos. Kayla cresceu rodeada por carinho. As freiras viam nela algo raro: uma mistura de doçura e firmeza que contagiava crianças e adultos. Quando alguém chorava, era ela quem oferecia o primeiro abraço. Quando surgia uma briga entre os meninos, era ela quem se interpunha com olhar firme e postura destemida — e todos paravam. Mesmo sem entender por quê, as outras crianças sentiam que Kayla era diferente. Não apenas bonita ou inteligente… havia nela um instinto natural de liderança. Um tipo de presença silenciosa que atraía, impunha respeito e trazia segurança. Aos seis anos, ela foi selecionada para ingressar no Colégio Interno St. Jude, uma escola de prestígio ligada ao orfanato, voltada à formação acadêmica e espiritual dos órfãos com maior potencial. Para Kayla, foi o começo de um novo capítulo. Nas salas do St. Jude, a menina revelou outro traço de sua alma inquieta: uma curiosidade voraz pelas ciências biológicas. Enquanto outras crianças se encantavam com literatura ou música, Kayla mergulhava com fascínio em livros sobre genética, reprodução celular, organismos híbridos e evolução. Seus olhos brilhavam sempre que estudava sobre procriação, metamorfoses ou o nascimento da vida. Era como se uma voz interior a chamasse a compreender o ciclo que move todos os seres vivos — e a imaginá-lo de novas formas. A cada nova aula sobre DNA, células-tronco ou simbiose, ela fazia perguntas que deixavam até os professores em silêncio por um instante. Não era apenas inteligência: era visão. Kayla enxergava possibilidades. Ela falava da vida como quem a sentia pulsar por dentro. Mas não era só nos estudos que se destacava. Seu carisma era tão natural quanto sua respiração. Era a primeira a dar as mãos nas orações em grupo, a última a abandonar uma amiga doente. Sua risada se espalhava pelos corredores como uma canção leve. Todos queriam estar perto dela — não por obrigação, mas por instinto. Até os mais rebeldes cediam à influência de Kayla sem perceber. Ela era calma, mas inquebrável. Doce, mas jamais submissa. Era, acima de tudo, uma loba em pele de menina. Em silêncio, o espírito de uma Alfa fêmea se consolidava. Ela não precisava comandar com gritos — seu olhar bastava. Não disputava território — ela conquistava com presença. E mesmo sem compreender totalmente o que era esse instinto que queimava sob sua pele de porcelana, Kayla sentia que algo maior se aproximava. Que seu destino não estava entre os muros do orfanato, nem apenas nos livros do colégio. Ela era feita para algo mais. Era início de primavera no St. Jude, e o perfume das flores recém-desabrochadas misturava-se ao som de vozes juvenis, risadas e passos apressados pelos corredores do antigo colégio. Kayla, com seus cabelos quase acobreados presos em uma trança solta e os livros contra o peito, era uma figura querida entre alunos e professores. Inteligente, carismática e determinada, chamava atenção por onde passava — mesmo sem querer. O professor e Dr. James Morrison, da matéria de biologia, era novo na escola. Jovem, bem-apessoado e sempre simpático, conquistara a admiração de muitas alunas. Mas Kayla nunca se deixou iludir por aparências. Observadora, notava os olhares longos, os elogios fora de hora, o jeito como ele se aproximava mais dela do que do necessário. Até o dia em que ele passou do limite. A sala de biologia estava vazia, já no fim da tarde. Ela havia voltado para buscar um caderno esquecido. James apareceu pouco depois, com um sorriso que não combinava com o momento. — Está sempre tão concentrada. Você é especial, Kayla. Muito mais do que imagina — disse ele, se aproximando demais. Kayla se afastou instintivamente, mas ele deu um passo à frente. — Você é madura. Não como as outras. E eu vejo isso. Você também vê, não vê? A voz dele baixou, e a mão tocou de leve o ombro dela, e seu corpo levemente pressionado em Kayla deixava clara sua excitação. O mundo pareceu congelar. Kayla o encarou, séria. Seus olhos azuis, límpidos como gelo, tornaram-se cortantes. — Tire a mão de mim e se afaste! — disse, firme, sem gritar. — Agora. Dr. James Morrison recuou, surpreso com a frieza. — Kayla... eu só pensei que... — Pensou errado — cortou ela. — E vai pagar por isso. Saiu da sala sem correr, com o coração acelerado mas a cabeça erguida. Sabia o que tinha que fazer. Na manhã seguinte, Kayla procurou a Madre Superiora e contou tudo. Sem hesitação, sem medo. Não foi a primeira nem a única, como descobriram mais tarde. Outras alunas se encorajaram. Testemunhos se somaram. O Dr. Morrison foi afastado imediatamente e, dias depois, expulso formalmente da escola. A notícia causou abalo. Mas Kayla manteve-se serena, embora por dentro sentisse um misto de revolta e alívio. Ela aprendeu ali, mais uma vez, que força não é só física. É saber dizer "não". É saber se levantar. É proteger não apenas a si mesma, mas as outras. E naquele colégio onde aprendeu tanto sobre biologia e comportamento, foi naquele dia que ela aprendeu a lição mais importante: Nunca se silenciar diante do que é errado. E sempre dizer não quando algo não parecer certo.P.D.V de Íris Já faz semanas desde que Kayla partiu. E o idiota do Dr. James? Sumiu por quase duas semanas. Disse que estava “caçando”, como ele gosta de chamar. Mas eu sei muito bem o que ele andava fazendo: procurando mulheres com genética promissora para os experimentos grotescos daquele circo dos horrores que ele chama de laboratório. Só alguém tão perturbado quanto ele poderia ver essas monstruosidades como uma forma de evolução. Ele adora se vangloriar por achar que foi o primeiro a descobrir o método para uma gestação simulada. Mas ele está errado. A verdade é que foi a entidade que me acolheu e me refez, quem me mostrou esse caminho. Algo dentro de mim diz que isso já aconteceu antes. A analogia da uva vem à mente: uma fruta que cai de uma árvore que nem era dela. Como se dissesse que a fruta não cai longe do pé — mas, nesse caso, ela nem pertencia àquela árvore. Será que Stella não é filha de Vivienne? Preciso de testes. Já fiz alguns rituais para tentar sondar, James ta
P.D.V de Stella Sullivan Me sinto exausta. Minha boca tem um gosto estranho o tempo todo, como se algo estivesse errado dentro de mim. Kayla foi embora ontem, e mesmo assim eu mal consegui levantar da cama — nem para comemorar, nem para tentar uma investida com Kaiden. Resolvo procurar minha mãe. Sei que ela tem contatos com bruxas e talvez possa verificar se está tudo bem comigo. Íris me alertou que seria difícil e ela não mentiu. Está sendo realmente difícil. Minha loba, Sirenia, choraminga quase o tempo todo. Mas agora ela vive se escondendo nas sombras da minha mente, e tudo que escuto são suas lamúrias abafadas, seus resmungos distantes. Quando estou prestes a abrir a porta do escritório, paro ao escutar vozes baixas. Mesmo com a mente embaralhada pelos lamentos da loba, consigo distinguir parte da conversa: — Vivi, você sabe que ela espera um filho de outros pais. O filho que ela carrega não é dela e de Kaiden. É de Kaiden e Kayla. Forjado magicamente, que ironia, não acha?
P.D.V de Kaiden Passei as últimas duas semanas imerso na minha alcatéia, organizando tudo. Meu treinamento como Alfa já estava concluído — comecei aos 17 e terminei aos 18. É um curso básico, com duração de um ano. Ensinam a teoria: nossa cultura, costumes, leis, rituais. Mas o que realmente importa... isso não se aprende. Está no sangue. A força, a liderança, a presença — essas coisas nascem com a gente. John Madison também se adaptou. Trocou as vestimentas tradicionais, com seu estilo tribal marcante, por roupas mais sóbrias, urbanas. Vindo de onde veio, ele estava claramente se esforçando para se encaixar no novo ambiente. E, devo dizer, estava conseguindo. O momento mais desconfortável dessas duas semanas, sem dúvida, foi meu primeiro encontro com Stella. Já faz quase uma semana, mas a cena ainda ressoa na minha mente. Perses, meu lobo, esteve na superfície durante toda a interação. Ele a rondava em silêncio, como se ela fosse nossa companheira. Mas não era só isso. Ele sentia
P.D.V de Kayla Meio que por curiosidade e meio que por medo também. Esse lance de alma gêmea — a gente cresce achando que vai ser algo perfeito, mágico, inquestionável. Mas a verdade é que nem sempre é assim. E, bom, eu queria garantir que minha amiga não saísse machucada. Então, por mais errado que parecesse, eu os segui. Queria ouvir com meus próprios ouvidos. Entender. Mas quando escutei a conversa, a decisão se formou ali, firme, inevitável: eu iria para a Alcateia de Ethan. Não seria justo separá-los. Isso os machucaria, e muito. Eu vi nos olhos dos dois, aquilo era real. E que tipo de amiga eu seria se os obrigasse a sufocar esse sentimento? De toda forma, eu já andava pensando em ir mesmo — agora era só unir o útil ao agradável. Estava prestes a me afastar quando uma voz zombeteira me pegou de surpresa: — Você sabe que nós, lobos, sentimos cheiro melhor que os outros, né? Sentimos o seu há metros, antes mesmo de você chegar… Era Ivy. Ela espiava apenas com a cabeça pela e
P.D.V de Ethan O vitral sobre o altar projetava cores suaves no chão de pedra, como se a luz do céu tentasse tocar a terra ali dentro. A capela estava quase vazia. Só eu, sentado num dos bancos ao fundo, e Madre Margaret Callahan, ajoelhada em oração. Esperei em silêncio. Não queria interromper. Eu sabia que precisava falar com ela, mas também sabia que o momento exigia reverência. Quando ela se levantou, notou minha presença. Caminhou até mim com aquele mesmo sorriso discreto de sempre — firme, sereno, quase maternal. — Que bom que você veio e na hora certa — disse ela. Assenti com a cabeça e me levantei, o coração apertado no peito. — Achei que era hora de agradecer — respondi. — E também de pedir permissão. Ela arqueou uma das sobrancelhas, curiosa. — Permissão? Estendi a pasta de couro que trouxe comigo. Estava um pouco suada nas mãos. Quando ela a abriu, encontrou os projetos que venho trabalhando há semanas. Desenhos, algumas descrições. No topo de tudo, estava o títul
P.D.V de Ethan Uma semana se passou desde a cerimônia em que me tornei Alfa — e também desde que meu pai partiu desta terra. Agora, tudo está pronto para minha visita ao orfanato St. Joseph’s Haven for Children. Por que lá? Simples: gratidão e saudade. Sinto um aperto no peito, uma nostalgia que me corrói em silêncio. É como se algo em mim precisasse voltar, rever rostos, ouvir vozes, respirar aquele lugar. E, quem sabe, captar ao menos o cheiro dela — agora que meus sentidos de lobo estão despertos. Reencontrá-la seria um milagre. Mas sei o quão improvável isso é. Levo comigo algo especial para entregar ao Padre Elias Moretti e à Madre Margaret Callahan — dois pilares na minha vida. Sei que ambos percebem algo do sobrenatural, ainda que interpretem tudo sob a luz da fé que seguem. Torren me acompanha. Ele foi o Beta do meu pai, leal até o fim. Ainda não decidi qual critério usar para nomear meu próprio Beta — é uma responsabilidade maior do que parece. Mas Torren disse qu
Último capítulo