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Capítulo 3 ― O Homem por Trás do Contrato

O céu estava encoberto por nuvens pálidas quando Dayse abriu os olhos devagar, tentando entender se estava sonhando.

Dayse fechou os olhos novamente, na tentativa de fugir do pesadelo.

A mansão imponente. O contrato — uma armadilha fria e meticulosamente calculada pelos seus pais adotivos. O casamento que parecia mais uma sentença do que uma celebração — tudo permanecia intacto.

Nada havia mudado. A realidade, em todo o seu esplendor grotesco, se mantinha inabalável.

Sim, ela agora era a esposa legal de um homem que, até ontem, não passava de um completo desconhecido.  Ele era um mistério, uma presença envolta em incertezas e silêncios. A situação parecia surreal, como se o destino tivesse decidido, de forma repentina, entrelaçar suas vidas.

O quarto estava em completo silêncio, tão limpo e tão espaçoso que parecia ecoar até seus pensamentos ― vasto e impecável, mas desprovido de qualquer calor humano.

Sentou-se na cama devagar. A cabeça latejava de tensão acumulada.

Sobre a mesa de cabeceira, uma bandeja com café da manhã disposta de maneira impecável: frutas cortadas, pães, geleias, uma xícara de porcelana. Tudo milimetricamente organizado. Quase… clínico.

Apenas uma nova etapa de uma vida sem escolhas. Ela não tocou em nada. Permanecia imóvel, sentindo o silêncio sufocar as paredes daquele quarto.

O tempo passava devagar até que três batidas secas soaram na porta. Dayse se levantou, sentindo o pulso acelerar sob a pele, e abriu a porta.

Luna Vasquez estava ali, como uma sombra.

— O senhor Bellucci quer vê-la agora — disse, sem rodeios.

Nada de gentilezas, nada de suavidade. Apenas uma ordem seca, tão direta quanto o olhar afiado da mulher. Sem bom dia. Sem margem para hesitação. Apenas o necessário.

Dayse não respondeu. Apenas assentiu com a cabeça. Seu rosto estava calmo, mas por dentro o estômago se contraía.

Ela seguiu pelos corredores da mansão atrás da secretária, que andava como um soldado em missão.

Foi conduzida até uma sala espaçosa com grandes janelas e uma grande lareira acesa, embora o frio lá fora fosse apenas brando. Ela ia, finalmente, encontrar o homem que mudaria sua vida. Ou que tentaria dominá-la por completo.

As janelas se estendiam do chão ao teto, emolduradas por cortinas pesadas que filtravam a luz opaca do dia. Quadros clássicos adornavam as paredes e móveis robustos compunham o ambiente, que cheirava a poder e controle. Tudo ali exalava riqueza, mas era frio. Impessoal.

Dayse parou na soleira da porta, o coração acelerando.

Enzo estava ali, de costas, diante da janela. As mãos cruzadas atrás das costas, os dedos entrelaçados com uma tensão quase imperceptível, observando o jardim através do vidro.

Sua postura era rígida. Imóvel como uma estátua de mármore.

Ele não se virou, não a cumprimentou, nem sequer lançou um olhar em sua direção.

O silêncio pairava pesado, denso como o ar antes de uma tempestade.

― Sente-se ― ele disse, com as costas ainda voltadas para ela. Sua voz era profunda e incisiva, cortando a quietude com uma precisão gélida, desprovida de calor, despida de qualquer traço de emoção.

Dayse sustentou a postura, lutando contra o aperto no estômago. Não se moveu de imediato, não cedeu à expectativa silenciosa da ordem pronunciada. Suas mãos estavam geladas, mas firmes.

— É curioso… — sua voz carregava um toque de ironia cortante, delicadamente ensaiada.

— Ser recebida por um homem cujo sobrenome já carrego, mas que não achou necessário comparecer ao próprio casamento. 

Enzo permaneceu imóvel, sem demonstrar reação, apenas medindo o tempo como quem espera um incômodo passar. Como se aquela troca de palavras fosse uma formalidade inconveniente. Um ajuste burocrático. Um detalhe a ser riscado da lista.

Quando finalmente se virou, ela viu pela primeira vez o rosto de Enzo Bellucci.

Um homem jovem, talvez nem tenha chegado na casa dos trinta ainda, de traços aristocráticos e expressão impassível.

Ele era exatamente o que ela imaginou: postura impecável, expressão fria, um homem acostumado ao poder — e alheio a qualquer emoção que não pudesse controlar.

O tipo de pessoa que não olhava para alguém, mas atravessava com os olhos.

Os cabelos estavam perfeitamente penteados para trás. Nada em sua aparência era descuidado — ou espontâneo.

Os olhos azuis de fundo preto, pareciam tão profundos quanto um abismo insondável. Frios e enigmáticos, não deixavam transparecer nenhuma emoção, como se escondessem segredos que ninguém ousava desvendar. Essa tonalidade única reforçava sua aura distante e quase intangível, tornando-o ainda mais impenetrável e intrigante.

Ele a observou por alguns segundos em silêncio, avaliando-a. Como quem examina a funcionalidade de um móvel caro.

— Acredito que casamentos como o nosso dispensam romantismo ― disse ele, a voz tão fria quanto os olhos.

Dayse passou os dedos pelos cabelos castanhos ondulados, agora presos em um coque baixo — um reflexo de sua tentativa de parecer mais madura e confiante do que realmente se sentia.

— Que bom que concordamos — disse Dayse, seu sorriso delicado, mas afiado, trazendo à tona um sarcasmo envolto em uma falsa leveza.

— Porque se eu quisesse romantismo, teria me casado com um banqueiro suíço.

Enzo ergueu uma sobrancelha, levemente intrigado.

— Não sabia que tinha esse tipo de opção.

— Não tinha. — Ela inclinou ligeiramente a cabeça, como quem j**a uma carta calculada na mesa. — Mas saber imaginar já é um passo.

O silêncio entre eles se estendeu por um instante carregado de algo indefinível, um jogo tácito de controle e expectativa.

— Espero que tenha se acomodado sem problemas — disse ele, a voz medida e indiferente, como se estivesse apenas ajustando uma peça necessária em sua rotina.

— Pretendo manter essa experiência o mais objetiva possível.

Dayse não respondeu de imediato. Apenas assentiu com a cabeça, educadamente. As palavras dele não eram uma recepção. Eram uma constatação. Como quem observa a chegada de uma encomenda esperada,

— Você já recebeu instruções básicas? — perguntou ele, a voz medida, sem qualquer inflexão de interesse.

— Apenas as iniciais. A senhorita Vasquez me informou sobre a limitação de acesso à casa.

Enzo assentiu, sem surpresa, como quem apenas marca mais um item cumprido em uma lista.

— Ótimo. Luna cuidará de tudo o que for necessário. Alimentação, suplementos, monitoramento médico. Tudo será acompanhado de perto.

A palavra "acompanhado" pairou no ar, carregada de um significado preciso demais para ser ignorado. Não se tratava de cuidado. Tratava-se de controle.

— O objetivo principal é que essa gestação ocorra sem imprevistos.

Não havia espaço para individualidade, nem para vontade própria. Apenas uma missão delineada com frieza e eficiência.

E naquele instante, Dayse soube que não seria apenas um corpo atravessando aquele processo. Seria algo muito mais perigoso: uma peça imprevisível em um jogo que exigia submissão absoluta.

O silêncio retornou, cortante. Luna continuava na sala, imóvel como um adorno.

Enzo se aproximou devagar, sem ameaçar, mas também sem suavidade.

— Quero que saiba que não espero nada além do cumprimento do contrato — ele disse, direto.

— E imagino que você também não esteja aqui por devoção. Portanto, podemos manter as coisas simples.

Dayse ergueu o queixo, sentindo o peso de cada palavra que acabara de ouvir, mas recusando-se a deixar transparecer qualquer fragilidade. Seus olhos brilhavam com um misto de desafio e dor contida.

— Se por simples você quer dizer vazias, indiferentes, sem alma… — ela deixou escapar um sorriso, pequeno, mas carregado de ironia e uma ponta de amargura.

— Então sim… acho que será fácil. Fácil como fingir que não dói. Fácil como esquecer que poderia ser diferente.

Algo brilhou nos olhos dele. Não exatamente surpresa. Mas… curiosidade?

Enzo estreitou o olhar, como se visse ali algo que não esperava. Um tipo de resistência que ele raramente encontrava.

— Você terá assistência integral e privacidade. Não haverá exigência de interações pessoais, a não ser quando… necessárias.

Ele sequer nomeou quais seriam as "interações pessoais necessárias" a que se referia, como se até mesmo isso pudesse ser reduzido a uma cláusula fria e clínica.

A sala parecia sufocar com o peso do silêncio.

— Entendido — ela respondeu, com a voz firme, mas contida. Seus olhos permaneceram baixos, como um véu de submissão.

Por fora, era a imagem perfeita de obediência. Por dentro, uma chama ardente e indomável queimava, alimentada por uma mistura de indignação e determinação.

Ela não se dobraria, não realmente. Não enquanto aquela brasa continuasse viva.

O silêncio pairou no ar, denso e carregado de algo que Dayse não conseguia nomear.

— Haverá um jantar esta noite. Considere isso… uma formalidade.

A voz dele cortou o ambiente como uma lâmina fria. Sem esperar por qualquer reação, ele se virou para Luna.

— Peça que preparem o jantar. Na sala de refeições menor.

Luna assentiu com a eficiência de quem já sabia exatamente o que fazer e saiu sem uma palavra.

Dayse permaneceu imóvel, como se o chão sob seus pés tivesse se tornado instável.

— Pode se retirar — disse ele, já voltado para a janela, como se ela não passasse de uma sombra que havia cumprido sua função.

Dayse não respondeu. Apenas girou nos calcanhares e saiu.

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