O despertador tocou às 6h, mas desta vez não foi o som estridente que me acordou. Era Giulia, pulando na minha cama com os pés gelados e um sorriso que poderia rivalizar com o sol da manhã.
— Papai, acorda! Hoje é sábado! — ela gritou, balançando meu braço com uma energia que só uma criança de seis anos pode ter.
— Já estou acordando, princesa — respondi, esfregando os olhos e tentando me livrar do peso dela em cima de mim. — O que tem de tão especial no sábado? — Você prometeu que íamos ao parque hoje! — ela disse, como se eu tivesse cometido um crime por esquecer.Ah, sim. O parque. Eu havia prometido na semana passada, durante uma de nossas noites de filme, que dedicaria o sábado inteiro a ela. Trabalho tanto que às vezes esqueço que promessas são sagradas para uma criança, mesmo com toda a correria.
— Certo, certo. Vamos ao parque — concordei, sentando na cama. — Mas primeiro, café da manhã. Você já comeu?
— Não, estava esperando você! — ela respondeu, pulando da cama e correndo em direção à cozinha.Seguir Giulia até a cozinha era como tentar acompanhar um furacão. Ela já estava na mesa, com uma tigela de cereal na frente, quando eu cheguei. Maria, nossa governanta, sorriu ao me ver.
— Bom dia, senhor Miguel. Parece que alguém está animado hoje — disse ela, servindo uma xícara de café para mim.
— Bom dia, Maria. E sim, alguém está me mantendo em movimento — respondi, sentando-me ao lado de Giulia.Enquanto tomava meu café, observei Giulia devorando o cereal com uma animação contagiante. Ela falava sem parar, contando sobre um sonho que teve com um dragão roxo e uma princesa que sabia voar. Eu ouvia, tentando acompanhar a lógica peculiar de uma criança de seis anos, e me surpreendi rindo de suas histórias malucas.
— E aí, o dragão comeu a princesa? — perguntei, brincando.
— Claro que não, papai! Eles viraram amigos e foram morar numa nuvem — ela respondeu, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.Depois do café, Giulia me arrastou para o quarto dela, onde insistiu que eu ajudasse a escolher sua roupa.
Quando chegamos ao parque, Giulia saiu correndo em direção ao balanço, como se fosse a primeira vez que o visse. Eu a segui, tentando manter o ritmo, mas ela já estava sentada e balançando os pés antes que eu pudesse alcançá-la.
— Empurra, papai! — ela pediu, e eu obedeci, empurrando-a gentilmente enquanto ela ria e pedia para ir mais alto.
— Cuidado, princesa! Não quero que você voe para longe! — brinquei, segurando o balanço para diminuir a velocidade.Compramos sorvetes e nos sentamos em um banco, observando as outras crianças brincarem. Giulia encostou a cabeça no meu ombro, e eu a envolvi com o braço, sentindo o calor dela contra mim.
— Papai, você é o melhor pai do mundo — ela disse, entre uma lambida e outra no sorvete.
— E você é a melhor filha do mundo — respondi, beijando o topo de sua cabeça.Ficamos em silêncio por um momento, aproveitando a calma do parque. Era raro ter esses momentos de paz, e eu sabia que precisava aproveitar cada um deles. Mas também sabia que havia algo importante que precisava contar a ela.
— Giulia, tenho uma novidade para você — comecei, tentando escolher as palavras certas.
— O que é, papai? — ela perguntou, levantando a cabeça para me olhar com curiosidade. — Bem, você sabe que eu trabalho muito, né? E às vezes fico ocupado demais para brincar com você como gostaria. — Eu sei, papai. Mas você sempre arruma um tempinho — ela disse, com uma inocência que me partiu o coração.Sorri, acariciando seus cabelos.
— Sim, mas eu quero que você tenha alguém que possa brincar com você o tempo todo. Alguém que te ajude com a lição de casa, te leve ao parque e faça coisas divertidas quando eu não puder. — Tipo a Maria? — ela perguntou, confusa. — Não exatamente. Alguém mais jovem, que possa brincar mais com você. Uma baba.Giulia franziu a testa, pensativa.
— Uma baba? Como aquelas que a gente vê nos filmes? — Mais ou menos. Ela se chama Isabella, e vem do Brasil. Ela vai morar com a gente por um tempo e cuidar de você. — Ela é legal? — Giulia perguntou, seus olhos brilhando com curiosidade. — Eu acho que sim. A Carmen escolheu ela, e ela parece muito gentil. Além disso, ela gosta de crianças e vai te ajudar a aprender coisas novas.Giulia ficou em silêncio por um momento, olhando para o sorvete que derretia em sua mão.
— Ela vai ficar comigo quando você estiver no trabalho? — Sim, princesa. Mas eu ainda vou estar aqui para você, sempre que puder. A Isabella vai ser como uma amiga que vai te ajudar e brincar com você.— Legal! — ela exclamou, pulando do banco. — Quando ela chega? — Em alguns dias. Vamos conhecê-la juntos, que tal? — Combinado! — ela disse, estendendo a mão para mim com um sorriso travesso.Apertei sua mãozinha, rindo.
— Combinado.— Papai, você acha que a Isabella vai gostar de mim? — ela perguntou de repente, com uma expressão séria que me surpreendeu.
— Claro que vai, princesa. Como alguém não poderia gostar de você? — respondi, puxando-a para um abraço. — Não sei... às vezes as pessoas não gostam de mim — ela disse, baixinho.Meu coração apertou. Giulia era tão pequena, mas já carregava dúvidas e inseguranças que eu nem imaginava.
— Giulia, você é a pessoa mais incrível que eu conheço. A Isabella vai adorar você, assim como todo mundo que te conhece. E se ela não gostar, ela não é a pessoa certa para ficar aqui.Ela olhou para mim, seus olhos brilhando com uma mistura de esperança e medo.
— Promete, papai? — Prometo — respondi, apertando sua mãozinha novamente. — E lembre-se, eu sempre estarei aqui para você, não importa o que aconteça.