Você começa hoje.

A primeira coisa que penso quando vejo Adrian Lancaster descendo a escada é:

meu Deus, esse homem existe mesmo?

Porque não é normal alguém ter aquele porte, aquela presença, aquele tipo de beleza que faz a gente esquecer como respira.

E não é só beleza,  é o jeito que ele se move. Devagar. Seguro. Como se o mundo inteiro tivesse que esperar por ele.

Tudo que consigo notar é que ele é… bonito demais para minha paz.

Meu estômago vira uma bagunça.

Ótimo. Exatamente o que eu precisava: passar vergonha mental antes mesmo de começar.

Ele para no último degrau e me olha.

E não é um olhar qualquer. É um olhar que atravessa.

Que pesa.

Que parece descobrir coisas que nem eu sei sobre mim.

— Senhorita Duarte — ele fala, e a voz dele é tão grave que arrepia.

Tento parecer adulta.

Mas minha boca só consegue soltar:

— Boa tarde… senhor Lancaster.

Perfeito. Minha voz saiu fina. 

— Venha comigo — ele diz, já virando as costas. — Vamos conversar no escritório.

Sigo atrás, tentando não tropeçar na própria ansiedade.

Ele se senta. Eu fico em pé, sem saber se posso ocupar uma cadeira tão cara.

— Sente-se, senhorita Duarte.

Ele começa com perguntas técnicas.

Experiência. Horários. Expectativas.

E tudo que eu penso é:

Ele nunca vai me contratar. Não alguém tão normal, tão nervosa, tão… eu.

Adrian fecha uma pasta, como se já tivesse decidido.

— Antes de avançarmos, preciso garantir que compreende as regras da casa.

Regras.

Claro.

— Não levar ninguém para a casa — ele diz, olhando diretamente para mim.

Eu aceno. Claro. Nunca levaria. Nem tenho quem levar.

— Não usar nada… inadequado.

O calor invade meu rosto.

Ele não piscou ao dizer isso.

— Não entrar no meu escritório. Em hipótese alguma.

E eu quase rio por dentro.

Ótimo momento para estar aqui dentro, então.

— Toque de recolher às 22h.

Outro aceno.

— E proibido contrariar instruções relacionadas à minha filha.

— Entendido.

Ele me olha como se já soubesse que eu vou quebrar alguma regra.

— Você começa hoje.

— A-ah… hoje? 

— Imediatamente — ele confirma, sem nenhuma dúvida na voz. — O motorista vai levá-la até sua casa. Pegue tudo que precisar. Você volta em no máximo duas horas.

Meu coração dá um salto tão forte que quase escapa pela boca.

Eu nem sei se tenho “tudo que preciso”. Meu guarda-roupa é uma mistura de roupas simples e peças que minha mãe comprou em promoções aleatórias. Nada combina com essa casa.

— Duas — ele reforça. — E, Isadora… não se atrase.

A forma como ele diz meu nome faz um arrepio quente subir pela minha coluna.

Ele abre a porta do escritório para mim.

— O motorista está te esperando. Volte pronta para trabalhar.

Eu só aceno, meio muda, e caminho até a saída. O motorista já está à porta, me cumprimenta com um gesto curto e abre o carro. Eu entro ainda meio zonza. A mansão se afasta pela janela como se estivesse me observando ir  e esperando eu voltar.

Pego o celular.

Ligo para Dani.

Ela atende no segundo toque.

— Oi, Isa, consegui falar com a gerente do—

— TENHO UM EMPREGO! — eu grito tão alto que o motorista se assusta no retrovisor.

— O QUÊ? — Dani berra de volta, do jeito espalhafatoso que só ela sabe. — COMO ASSIM?

— ALEGRIA! EU CONSEGUI, DANI! EU CONSEGUI! — estou rindo, nervosa, meio sem ar. — Eu fui lá na entrevista, ele me contratou NA HORA, eu tô indo em casa pegar minhas coisas porque começo AGORA!

— Meu Deus, Isa, calma! Quem contrata assim?

— Depois eu te conto. 

O motorista tenta fingir que não está ouvindo nada, mas eu vejo o canto da boca dele tremer.

Dani continua falando, fazendo perguntas, já planejando arrumar minha mala pelo viva-voz.

Chego em casa ainda com o coração acelerado. A chave gira na fechadura, mas antes de entrar eu faço algo automático: bato na porta ao lado.

— Mãe? — chamo, esperando ouvir o som da TV alta ou o barulho de alguma panela.

Nada.

Bato de novo, mais forte.

— Mãe, sou eu.

Silêncio.

Respiro fundo, tentando não entrar naquela espiral de preocupação que eu conheço tão bem. Não tenho tempo para isso agora. 

Abro o armário, pego minhas roupas mais discretas, as camisetas confortáveis, o único jeans que não está rasgado, uns pijamas simples. Tudo rápido. Sem pensar muito. Se eu parar, começo a duvidar.

Passo no banheiro, recolho meus produtos, escova, a maquiagem básica. Jogo tudo dentro da mochila, que fica pesada do jeito errado, daquele jeito que parece que estou levando minha vida inteira embora.

Olho mais uma vez para a porta da minha mãe.

Nada.

Nenhuma sombra por baixo, nenhum ruído.

Deixo uma mensagem no celular dela:

Consegui um emprego. Vou ficar fora por alguns dias. Me liga quando vir essa mensagem, por favor.

Tranco minha porta. A mala leve puxa meu ombro para trás, mas o peso real é outro.

Quando desço as escadas do prédio, o carro preto já me espera.

E ali, parada na calçada, eu sinto a mudança.

A vida simples atrás de mim.

A mansão Lancaster na frente.

E no fundo eu sei: Adrian Lancaster não é o tipo de homem que deixa alguém entrar na vida dele… sem cobrar um preço.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App