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Capítulo Cinco — O Plano Que Nasceu do Acaso

“Às vezes, não somos nós que encontramos a brecha. 

É o próprio alvo que abre a porta — e espera que entremos.”

Entrei na sede da Polícia Federal com a sensação incômoda de que nada, a partir daquele dia, seria simples.

O prédio seguia o mesmo de sempre — concreto, vidro, corredores longos e vozes abafadas —, mas eu estava diferente. Carregava uma informação que podia mudar completamente o rumo da investigação. E, se mal conduzida, colocar todos nós em risco.

Passei pela recepção, cumprimentei alguns agentes no caminho e segui direto para a sala de reuniões da equipe especial. Eles já estavam lá quando cheguei.

Dr. Nilo organizava alguns documentos sobre a mesa, óculos apoiados na ponta do nariz, expressão concentrada. Carla estava sentada à esquerda, tablet em mãos. Jorge encostado na parede, braços cruzados, observando tudo em silêncio. Mais dois agentes da inteligência completavam o grupo.

— Bom dia — eu disse, fechando a porta atrás de mim.

— Pelo seu semblante, não é só mais um briefing — Nilo comentou, sem levantar os olhos.

Sentei-me à cabeceira da mesa, respirei fundo e apoiei as mãos sobre o tampo frio.

— Não, não é.

Todos ficaram atentos.

— Recebi novas informações sobre o Heitor Almeida Castro — comecei. — E, mais do que isso… surgiu uma oportunidade real de infiltração.

Carla foi a primeira a reagir.

— Infiltração direta?

— Muito mais do que imaginávamos — respondi. — Dentro da casa dele.

O silêncio que se seguiu foi pesado.

— Você vai precisar explicar isso com calma, Myrthes — Nilo disse, agora me encarando por cima dos óculos.

Assenti.

— Vou começar do início.

Contei sobre a academia. Sobre o acidente. Sobre como Heitor havia sido o primeiro a me socorrer. Detalhei o trajeto até o hospital, o cuidado excessivo, a postura controlada. Depois, descrevi o momento em que ouvi a ligação dele enquanto eu era atendida.

— Ele falava com alguém sobre a necessidade de ter uma babá dos filhos — expliquei. — Uma conversa tensa. Pelo tom, ficou claro que ela havia a necessidade de uma profissional

— E foi aí que você teve a ideia — Carla completou, já entendendo.

— Não na hora — corrigi. — Mas a semente foi plantada ali.

Continuei.

— Quando me perguntaram meus dados na recepção, ele estava por perto. Nome, telefone, tudo ficou registrado. Poucas horas depois que eu conversei com a Carla ontem, ele ligou.

Jorge arqueou a sobrancelha.

— Ligou achando que você era… quem?

— Valentina Cruz — respondi. — Especialista em educação infantil. Babá com experiência internacional.

Nilo soltou um suspiro lento.

— Você improvisou uma profissão para a Valentina Cruz no meio de um atendimento médico?

— Não foi improviso — retruquei. — Foi instinto profissional.

Carla sorriu de canto.

— E funcionou.

— Funcionou — confirmei. — Ele me convidou para conversar pessoalmente. Quer que eu avalie a possibilidade de cuidar dos filhos dele.

Os agentes trocaram olhares rápidos.

— Isso muda completamente o jogo — Jorge disse, descruzando os braços. — Acesso direto. Rotina. Casa. Crianças.

— Exatamente — concordei. — Nenhuma escuta ambiental nos daria isso.

Nilo ficou em silêncio por alguns segundos, analisando.

— Você sabe que uma infiltração desse tipo não é simples — disse por fim. — Envolve exposição prolongada. Vínculo emocional. Risco elevado.

— Eu sei — respondi. — E sei também que essa oportunidade pode não se repetir.

Carla deslizou o tablet pela mesa, projetando algumas informações.

— As minhas confirmações batem com isso — disse. — Heitor é o CEO do Grupo Arruda Teixeira e tem como empresa principal a Latina Engenharia Global, oficialmente uma multinacional do setor de manutenção e construção civil. Oficialmente limpas. Mas já mapeamos rotas suspeitas ligadas a contrabando de armas.

— O fundador é Paulo de Arruda Teixeira — acrescentei. — Figura intocável da elite empresarial. Heitor assumiu a operação nos últimos anos.

— Casado com a filha dele — Jorge comentou.

— Sim — confirmei. — Um casamento de conveniência. Pelo pouco que levantamos, sem afeto real. Mas isso não importa agora.

Nilo apoiou as mãos na mesa.

— Importa, sim. Tudo importa quando falamos de infiltração doméstica.

Olhei para ele.

— Estou ciente.

Houve uma pausa. Então ele assentiu.

— Muito bem. Vamos trabalhar com o cenário de que você aceita a proposta. Precisamos construir Valentina Cruz de forma impecável.

Carla já digitava.

— Histórico profissional, certificados, referências falsas, mas verificáveis.

— Cursos — Jorge completou. — Psicologia infantil básica, primeiros socorros, idiomas.

— Perfil discreto — acrescentei. — Nada que chame atenção além do necessário.

Nilo me observava com atenção excessiva.

— E você? — perguntou. — Está preparada para isso?

A pergunta não era técnica. Era humana.

— Não estou — respondi com honestidade. — Mas estou disposta.

Ele assentiu lentamente.

— Esse é o tipo de missão que não permite erros emocionais.

Engoli em seco.

— Eu sei disso.

Carla me lançou um olhar rápido, como se quisesse dizer algo, mas preferiu se manter profissional.

— Precisamos mapear a rotina das crianças — disse ela. — Idades, horários, escola, cuidadores secundários.

— E prever um plano de extração — Jorge completou. — Se algo sair do controle.

— Nada sai do controle — Nilo afirmou. — Se planejarmos direito.

Fiquei ouvindo enquanto eles montavam o esqueleto da operação. Cada palavra reforçava o peso da decisão que eu estava prestes a tomar.

Me tornar uma babá dentro da casa de um dos homens mais perigosos do país.

— Myrthes — Nilo me chamou de volta à mesa. — Você será o ponto mais vulnerável da operação. E o mais estratégico.

Assenti.

— Eu sei o que está em jogo.

Ele me encarou por alguns segundos, depois fechou a pasta.

— Então está decidido. Valentina Cruz vai entrar na vida de Heitor Almeida Castro.

O silêncio que se seguiu não era de dúvida. Era de consciência.

Levantei-me devagar.

— Não foi assim que planejei chegar até ele — confessei. — Mas talvez tenha sido exatamente assim que deveria acontecer.

O acaso.

Ou o destino.

Enquanto saía da sala, uma coisa ficou clara para mim: aquela investigação tinha acabado de ultrapassar a linha entre o profissional e o pessoal.

E eu precisava estar preparada para não me perder no caminho.

Porque, dessa vez, não era só o caso que estava em risco.

Era eu.

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