capítulo 7

O apartamento estava silencioso, exceto pelo som ritmado do relógio na parede. Clara sentou-se à mesa da cozinha, encarando a xícara de chá ainda fumegante. A tentativa de se afastar de Alaric, que no início parecia necessária, agora a consumia por dentro. Cada risada distante, cada lembrança inesperada, cada ausência dele doía.

— Isso é insuportável — murmurou para si mesma, apertando a caneca até que os nós de seus dedos ficaram brancos.

Ela se lembrava do sorriso dele, da facilidade com que a amizade deles se transformava em um conforto que nenhuma outra presença conseguia reproduzir. Mas agora, a distância que ela própria impôs parecia uma corda apertando o pescoço.

Na manhã seguinte, ao caminhar para o trabalho, Clara esbarrou em alguém correndo com uma pilha de papéis que ameaçava cair. Ela se abaixou rapidamente para ajudar.

— Nossa! Obrigada! — disse a jovem, rindo sem constrangimento. — Eu sou Lúcia. Sempre correndo demais…

— Clara — respondeu, sorrindo com timidez. — É fácil se perder na correria mesmo.

O encontro casual virou conversa de caminho, depois um café, e logo Lúcia se tornou uma companhia constante. Ela era divertida, direta e parecia enxergar Clara de um jeito que ninguém via há muito tempo: sem julgamentos, sem cobranças.

— Então você trabalha e ainda parece uma esfinge — disse Lúcia uma tarde, enquanto tomavam café —. Sério, você parece carregar um peso invisível, mas ninguém percebe.

Clara sorriu, constrangida. — É só rotina… nada demais.

— Ah, por favor! — Lúcia riu —, eu conheço pessoas cansadas, mas você parece… querer desaparecer.

Clara não respondeu de imediato, apenas respirou fundo, sentindo um misto de alívio e estranheza. Ela não tinha ideia de que precisava de alguém assim ao lado dela.

— Quer ir jantar comigo hoje? — Lúcia perguntou de repente. — Conheço um restaurante ótimo. Você precisa sair dessa bolha, Clara.

— Eu… acho que sim — murmurou Clara, surpresa. Algo dentro dela dizia que seria bom.

O restaurante era acolhedor, com luzes baixas e música ao fundo. Lúcia pediu pratos variados, comentando sobre cada escolha de maneira animada, e Clara se deixou levar. Por algumas horas, esqueceu o vazio que Alaric havia deixado.

— Sabe — disse Lúcia, rindo —, você deveria rir mais. É contagiante!

Clara sorriu, e por um instante, se sentiu leve. — Eu… estou tentando. É só… difícil, sabe?

— Difícil como? — Lúcia inclinou-se, curiosa.

Clara hesitou, olhando ao redor. — É sobre amizade, sobre… pessoas importantes que parecem sempre longe quando mais precisamos.

Lúcia assentiu, compreendendo sem precisar de mais explicações. — Eu entendo. Às vezes, a ausência dói mais que a presença de alguém que não nos entende.

Clara sorriu, sentindo que aquela conversa era uma pequena vitória: compartilhar sem medo, sem julgamento. Pela primeira vez em semanas, sentiu que não estava completamente sozinha.

— Obrigada por me puxar pra fora de casa — disse Clara, em tom sincero. — Eu precisava disso.

— Sempre que precisar — Lúcia respondeu, rindo. — E prometo que não vou deixar você se afogar no silêncio.

Mesmo com a companhia de Lúcia, Clara ainda sentia o peso da ausência de Alaric. Caminhando para casa depois do jantar, olhava os prédios iluminados e pensava nele. Cada lembrança era como uma corda apertando seu peito.

— Por que isso dói tanto? — murmurou, apertando o celular na mão. — Eu só queria estar bem… sem ele… mas não consigo.

O telefone tocou, era Lúcia com uma mensagem de incentivo: “Viu? Nada como uma boa amizade pra relembrar que a vida ainda tem cor.” Clara sorriu, mas a alegria era pequena diante do vazio que só Alaric preenchia.

Os dias se arrastaram, e Clara tentou continuar com pequenas distrações: livros, cinema, saídas com Lúcia. Mas cada tentativa era apenas um lembrete de que ninguém conseguia ocupar o espaço de Alaric.

Numa noite fria, sentada à janela, contemplando a cidade, decidiu que precisava ouvir a voz dele. Não para confrontá-lo, não para exigir nada, apenas para sentir o conforto que sua presença sempre lhe dava.

— Alaric… — sussurrou, segurando o telefone com força. — Só um pouco… só a sua voz.

A chamada caiu na caixa de mensagens rapidamente. Ela suspirou, frustrada. Tentou novamente, e mais uma vez. Finalmente, a linha se conectou.

— Alô? — a voz dele, grave e pausada, trouxe um aperto imediato no peito dela.

— Alaric… — começou Clara, a voz trêmula — Eu… só queria ouvir você… só um pouco…

— Clara… — disse ele, e por um instante pareceu hesitar. — Não é hora.

— Eu… não aguento mais — choramingou ela. — Tentei, tentei tanto… mas cada dia sem você me destrói por dentro.

— Clara… — a voz dele era firme, como um muro que ela não podia atravessar.

— Eu só queria… não sei… — soluçou —, sentir que ainda existe algum lugar pra mim… junto de você.

— Clara… — A pausa foi longa. — Eu não posso — disse ele, e o desligamento abrupto cortou sua voz como um golpe.

O celular caiu da mão dela, e as lágrimas escorreram silenciosas. Sentou-se no sofá, imóvel, encarando o vazio do quarto. Cada batida do relógio parecia gritar a ausência dele.

— Ele deve estar bravo… ou… ou não quer me ouvir… — murmurou, soluçando baixo. — Como posso viver assim?

Minutos, talvez horas, se passaram. O choro finalmente deu lugar a um silêncio pesado. Clara se levantou, trêmula, caminhou até a janela e olhou a cidade que parecia indiferente ao seu sofrimento.

Então, o som da campainha quebrou o silêncio. Seu coração disparou imediatamente.

— Não… não pode ser… — sussurrou.

Ela correu até a porta, mãos trêmulas, o corpo inteiro tenso. Ao abrir, lá estava ele: Alaric, o casaco ainda molhado pela chuva recente, os olhos fixos nela com aquela intensidade que sempre a deixava sem fôlego.

— Alaric… — murmurou, sem palavras para explicar tudo que sentia.

Ele não disse nada de imediato. Apenas entrou, fechando a porta atrás de si, o olhar percorrendo-a como se estivesse medindo cada emoção que ela tentava esconder.

— Eu… eu não consegui ficar longe — disse ele finalmente, quase um sussurro, mas carregado de força. — Você… parece tão… tão frágil sem mim.

Clara engoliu em seco, tentando controlar o choro.

— Eu… tentei… — respondeu, a voz embargada. — Tentei me afastar, mas… não consigo.

Ele se aproximou, o rosto perto do dela, e suspirou profundamente.

— Clara… você sempre foi a minha melhor amiga. Sempre esteve aqui. E mesmo que eu não veja tudo que sente, não quero mais que sofra assim.

Ela tremeu, sentindo finalmente que parte do peso havia diminuído. Apenas o fato dele estar ali, presente, já era suficiente para acalmar temporariamente o turbilhão que sentia.

— Eu prefiro… — disse ela, a voz falhando — eu prefiro ser a sombra sua, mesmo que isso doa, do que estar longe de você.

Ele a olhou em silêncio por alguns segundos, absorvendo cada palavra, antes de estender a mão e segurá-la suavemente.

— Então, fique aqui. Fique comigo — murmurou, e por primeira vez, o silêncio entre os dois pareceu leve, quase reconfortante.

Clara fechou os olhos, deixando-se apoiar nele, e pela primeira vez em muito tempo, sentiu que o mundo poderia esperar.

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