Amara
Depois de horas de voo, meu corpo inteiro estava dolorido. Uma vontade terrível de fazer xixi me consumia. Finalmente, o avião pousou.
Dava para ver o medo estampado no rosto das garotas. Não sabíamos o que nos esperava, mas os homens fizeram questão de nos avisar que era algo pior do que a morte.
Eu, Jaqueline e mais quatro garotas fomos levadas para dentro de uma van. Não faço ideia de que país estamos, mas o frio é de cortar a pele. O vento gelado b**e no meu rosto enquanto sou empurrada como mercadoria para dentro do carro.
Já disse que não vou me entregar sem lutar. Começo a chutar, mesmo com as pernas amarradas, tentando atingir a porta da van. Isso claramente não deixou meus sequestradores felizes.
Ainda consegui ver os rostos tristes das meninas ao meu lado antes de a escuridão me engolir completamente.
Quando abro os olhos novamente, estou em um quarto escuro. Não há mais amarras nos meus braços nem nas minhas pernas. Me levanto devagar, zonza, e vejo várias beliches. Procuro por minha amiga e a encontro sentada em uma cama, chorando baixinho.
— Ei... não fica assim. Eu vou tirar a gente dessa enrascada — falo me aproximando dela.
— Está tudo bem, Mara. A culpa não é sua... Se eu não tivesse falado com aquele homem pela internet, nada disso teria acontecido — Jaqueline diz, com os olhos cheios de lágrimas.
— Não pensa assim, Jaque. Os únicos culpados são esses malditos. Eu vou tirar nós duas daqui... nem que eu tenha que matar cada um deles — falo decidida.
Mas agora eu preciso mesmo é fazer xixi, estou apertada demais.
— Onde é o banheiro? — pergunto.
Corro o mais rápido que posso, tentando não me mijar. O banheiro é pequeno, sujo e cheira mal, mas não me importo. Apenas alivio minha bexiga que já doía muito.
Enquanto estou ali, observo cada canto, procurando uma rota de fuga. Nada. O banheiro é só um cômodo sem janelas, com um vaso sanitário e um chuveiro velho — que eu duvido que funcione.
Volto para o quarto e observo as outras. Somos quatro agora: eu, Jaqueline, a loira que mandou eu ficar quieta no avião, e uma moça morena, de cabelo castanho escuro, que permaneceu em silêncio durante toda a viagem. Ela não chorou uma única vez.
A garota me olha com olhos calculistas, como quem está planejando algo. E isso me anima. Eu também quero sair daqui. Se ela pretende fugir, vou com ela. E levo Jaqueline comigo.
— Onde estamos? — pergunto, me sentando ao lado de Jaqueline.
— Eu... não sei — responde ela, ainda chorosa.
— Estamos em uma boate. Uma boate cheia de criaturas sobrenaturais — diz a garota morena, com um olhar estranho.
A loira solta uma risada debochada.
— Boate sobrenatural? Você está vendo filme demais. Isso aqui é só um cativeiro de bandidos. Sequestradores, só isso.
Observo o lugar, tentando entender o que a garota de cabelo escuro quis dizer com "criaturas sobrenaturais".
— Que tipo de criatura sobrenatural? Fantasmas? — pergunto, um pouco irônica.
— Não fantasmas... feiticeiros, vampiros, lobisomens, feras... coisas da noite. Coisas que você nem imagina — ela fala se aproximando de nós duas.
— Essas coisas não existem — Jaqueline rebate, tentando parecer forte.
— Eu também pensava assim... até minha irmã ser sequestrada e trazida para cá. Eu procurei por todos os cantos e acabei encontrando pessoas que caçam esse tipo de monstro — ela responde, com um tom derrotado.
— Você tá dizendo que existem monstros tipo série de TV? — pergunto, tentando entender o que ela realmente quer dizer.
— Um pouco pior. Mais cruéis, mais perversos... e quase impossíveis de matar.
— E o que você está fazendo aqui, então? Se sabe que tem criaturas tão perigosas nesse lugar? — pergunto, ainda confusa.
— Estou aqui para salvar minha irmã. Eu sei que ela está aqui. Então vou matar o desgraçado dono desse lugar e descobrir onde ela está. Não tenho tempo para proteger ninguém. Então se quiser salvar sua amiga chorona, cuide dela — ela diz, olhando para Jaqueline.
Fico irritada na hora.
— Eu não preciso que ninguém me salve. Sei me virar. E quanto à minha amiga, eu vou cuidar dela. Mas acho que você está exagerando. Criaturas sobrenaturais... fala sério. Isso só existe no cinema.
— Então por que acha que estamos soltas, sem correntes, sem grades nas janelas? — ela rebate, mostrando as mãos livres.
— Porque eles são homens armados e grandes. E nós somos só mulheres indefesas — a loira responde, entrando na conversa.
— Nem tão indefesas assim... A nossa amiga aqui deu trabalho. Precisaram de três caras pra segurá-la — a garota fala, apontando pra mim.
— Meu nome é Amara, mas todos me chamam de Mara — digo, estendendo a mão para ela.
— Rebecca — ela responde, apertando minha mão.
— Marcela — diz a loira, balançando a mão no ar, ainda com desdém.
— Rebecca, a sua história é... inusitada demais. Criaturas sobrenaturais? Só porque esses homens são monstros não quer dizer que eles não sejam humanos — digo, abraçando Jaqueline, que ainda soluça.
— Quando eles entrarem aqui, vocês vão ver que eu estou certa. Mas aí vai ser tarde demais. Não sei o que fazem com as garotas... se sacrificam, usam como escravas... Segundo meus informantes, somos vendidas como mercadoria. E o comprador faz o que quiser com a gente.
— Eu não vou ficar esperando ser vendida pra nenhum sádico. Vou arrumar um jeito de sair daqui. E, se quiser, pode vir comigo — digo firme.
— Eu irei... assim que encontrar minha irmã. Não saio daqui sem ela. Tenho certeza de que ela está aqui, em algum lugar — Rebecca responde, determinada.
Mesmo sem acreditar totalmente nessa história de monstros, eu prometo que vou ajudar. Temos que ficar unidas e nos proteger desses homens... ou seja lá o que forem.
O medo atinge o fundo da minha alma. Se tudo isso for verdade, estamos condenadas.
Mas não... essas coisas não existem. Ela deve estar delirando, só isso. Delirando por causa da dor, da perda e do desespero.
Ou será que não?