Entrei no carro aberto pelo guarda-costas da Irma e fiquei simplesmente de boca aberta.
O interior parecia coisa de filme: bancos de couro, ar condicionado suave e aquele cheiro caro de novo. Eu não gosto do que estou prestes a fazer, mas não dá para negar que, pelo que vejo, boa vida me espera.
Só que, junto da curiosidade, veio o medo. Com tanto sequestro por aí, não estranhem se no fim de tudo eu descobrir que só queriam meus rins.
O carro nos levou até o avião.
Minha barriga gelou só de ver a escadinha encostada naquela máquina enorme.
Nunca andei de avião na vida. Para mim, voar é coisa para gente que nasceu com berço de ouro — e, ainda assim, eu nem queria saber o processo. O chão já me serve.
— É para a gente ir nessa coisa? — perguntei.
— Dá para entrar sem passar vergonha? — retrucou o guarda, sem desgrudar os olhos do celular.
— Eu… não sei se consigo.
— Fecha os olhos e sobe. O resto a gente resolve aqui dentro.
— Como assim, “o resto”? — apontei o dedo para ele, desconfiada.
Ele ergueu a cara pela primeira vez. — Eu não vou comer você, se é isso que está pensando. Estava falando do medo de voar. Temos sonífero.
— Ah… sonífero. Certo.
Subi tremendo, coração batendo feito tambor. Logo que entrei, me deram uma garrafa de água.
— Se não quiser ver nada, comece por aqui.
Sem hesitar, virei a garrafa inteira. Afinal, era melhor dormir do que assistir aquela geringonça levantar voo.
Meus olhos pesaram e o sono me arrastou.
Quando acordei, já não estava no avião. Estava deitada em uma cama macia, num quarto enorme. Andei até a porta, abri devagar e quase caí para trás.
O quintal era imenso, com piscina brilhando no centro, moços e moças seminus desfilando como se fosse a coisa mais natural do mundo. Eu, de roupa, me senti a esquisita — parecia nua de tanta vergonha. Cruzei os braços para disfarçar, mas quem já sentiu vergonha sabe que é exatamente assim que a gente se entrega.
Foi quando ouvi a voz de Irma.
— Atenção, meninos! Tenho uma notícia importante. — Bastou um instante para todos a olharem como se fossem soldados esperando ordens. Impressionante. Eu não conseguia tanto respeito nem como chefe de turma na escola.
— Como sabem, eu precisava de mais mulherada nessa casa. Então apresento a vocês Maria!
Congelei. Meu corpo ficou duro como o de uma gazela diante do caçador. Mas, sem ter para onde correr, avancei. Irma me esperava com aquele sorriso que mistura charme e perigo.
— Maria é a nova filha que mencionei. — Ela ergueu minha mão como se me exibisse. — Tratem de mostrar a ela tudo: ordens, deveres, direitos e, claro, diversão.
A recepção foi uma mistura de abraços, beijos, apertos de mão e até cutucadas. Eu mal sabia se sorria ou fugia.
Quando anoiteceu, já estava cansada. A casa vibrava com música, risadas, vozes altas. Mas eu não gostava daquilo. Descobri que, vivendo com Rafael, aprendi a amar o silêncio.
Meu coração disparou. Rafael! Será que estava bem? Levantei apressada e perguntei para a primeira pessoa que cruzou comigo:
— Você viu a Irma?
— Deve estar na sala, cuidando das contas ou conversando.
Fui sem bater. Ao abrir a porta, dei de cara com Irma e o guarda-costas. Digamos… num clima que só vídeos proibidos mostrariam.
— Ah, céus! — gritei e bati a porta.
Segundos depois, ela apareceu ajeitando o cabelo, despediu-se dele e me chamou.
— Entre. O que foi agora?
— Eu… — hesitei.
— Vamos, fala logo. Nunca viu alguém transando?
— Como eu veria isso? — estremeci, vermelha.
Ela riu. — Sei lá, em filmes. Ou nunca se gravou?
— Eu não faço ideia de como.
— Fácil. Já ou nunca. Mas, pela sua cara, vai me dizer que nunca fez nada.
— Não preciso responder a isso. Eu só vim saber do meu irmão.
Irma arregalou os olhos e soltou uma gargalhada.
— Isso é sério? Você é virgem?
Fiquei sem palavras, mas meu silêncio respondeu por mim.