Capítulo 6

Leo Tudor

A vida muda rápido demais.

Algumas pessoas dizem isso como metáfora… mas no meu caso, foi literal.

Perdi minha esposa há dois anos, e desde então tudo ganhou outra cor.

Cinza. Silenciosa.

E eu precisei aprender a respirar dentro desse silêncio.

Hoje, minha rotina é simples:

Acordo cedo demais.

Abro as cortinas do loft e deixo a luz cinzenta de Londres entrar.

Confiro e-mails, respondo mensagens da diretoria, reviso relatórios.

Tudo automático.

Tudo calculado.

Mas nos últimos meses… existe um caos adicional na minha vida.

Um caos de cinco anos, de cabelos loiros e olhos astutos:

Mel.

Minha filha..

Meu tornado em forma de criança.

Meu orgulho — e meu maior desafio.

Já estamos na nossa sétima babá em quarenta dias.

E nenhuma sobrevive mais de um dia ao furacão Mel.

Ela não é maldosa.

Só… fechada.

Machucada demais pela perda da mãe.

E eu também não facilito, sendo honesto.

Trabalho demais.

Peço demais.

Espero demais.

E, nesse ritmo, ninguém aguenta.

Naquela manhã, sentei-me à mesa de jantar enquanto tomava meu café e folheava a agenda.

A casa estava silenciosa — um silêncio suspeito.

— Sr. Tudor? — chamou a última babá contratada, com uma expressão tão desesperada que eu soube antes mesmo de ela abrir a boca.

Suspirei.

— Ela trancou todas as minhas roupas no banheiro, jogou água na sala e me chamou de “dentadura velha”. Eu… eu realmente não consigo mais. — Ela engasgou, pegou a bolsa e saiu sem olhar pra trás.

Outra desistindo.

Passei a mão pelos cabelos, cansado.

Isso estava ficando ridículo.

Peguei o celular e liguei para a única pessoa que poderia me ajudar:

Dra. Miranda Cooper, minha amiga de anos, diretora clínica do Queensbridge Hospital.

Ela atendeu rindo, como sempre.

— Se você estiver ligando sobre babá, já aviso: eu não tenho uma fábrica de mulheres pacientes, viu?

— Miranda — esfreguei o nariz — tô no limite. Ela trancou roupas no banheiro. Jogou água na sala. E inventou que a babá tinha 200 anos.

Ela gargalhou.

Eu não.

— Leo… sinceramente, a Mel está pedindo socorro do jeitinho dela. Você sabe disso.

— Eu sei. E estou tentando. Mas preciso de alguém que fique com ela enquanto eu trabalho.

— Tá. — Ela respirou fundo. — Eu vou perguntar às meninas do hospital. Sempre tem uma amiga de amiga… ou alguém recém-chegado precisando de emprego.

As agências já desistiram mesmo, né?

— Todas. — confirmei.

— Ok, me dá até amanhã. Mas já vou avisando: ninguém vai aceitar fácil trabalhar com a “pequeno furacão Tudor”.

Revirei os olhos.

— Ela não é tão terrível assim.

— É sim — ela riu. — Mas você também é. Então combina.

Desliguei, e por um instante fiquei parado, encarando a vista enorme da cidade através das janelas de vidro.

Prédios.

Ponte.

Carros passando.

Tudo em movimento constante.

E eu ali… estagnado.

Trabalhei o restante da manhã no escritório da empresa, revisando números enquanto meu celular vibrava sem parar.

Investidores. Conselheiros. Reuniões.

Tudo sempre urgente.

Sempre crítico.

Mas, no meio disso, meu pensamento voltava para Mel.

E para a promessa que fiz à minha esposa no hospital, segurando a mão dela pela última vez:

“Eu cuido dela. Por nós dois.”

Eu cumpriria.

Nem que rasgasse Londres inteira procurando a pessoa certa.

Recebi uma mensagem de Miranda perto do meio-dia:

“Talvez eu tenha uma indicação. Deixa eu confirmar com uma amiga.”

Nada concreto.

Mas era alguma coisa.

Algo que eu não tinha há semanas: esperança.

Guardei o celular no bolso e respirei fundo.

Quem quer que Miranda estivesse tentando encontrar…

Que fosse alguém firme.

Alguém doce.

Alguém paciente.

Alguém que não fugisse no primeiro caos.

Terminei minha última reunião pouco antes das cinco da tarde. A sala de vidro dava para o Tâmisa, e a luz cinzenta de Londres já começava a se transformar naquele dourado fraco típico do fim do inverno.

Eu deveria estar satisfeito — metas batidas, contratos assinados, números alinhados.

Mas tudo parecia… vazio.

Desde que perdi a minha esposa, o trabalho virou minha fuga.

Minha desculpa.

Minha armadura.

E armado demais, às vezes eu também virava pedra com a Mel.

Fechei o notebook e deixei minhas costas afundarem levemente na cadeira.

O celular vibrou de novo.

Miranda:

“Conversei com a minha amiga. Ela tem alguém sim. Uma garota nova, recém-chegada em Londres. Ainda não fala inglês muito bem. Mas é esforçada. Amanhã cedo ela dá uma passada aí. Pede paciência.”

Paciência.

Era pedir demais de mim?

Talvez.

Mas pedir menos não resolveria nada.

Respondi apenas:

“Amanhã. Obrigado.”

Joguei o celular sobre a mesa e fiquei encarando o teto por um momento.

A ideia de ter outra desconhecida em casa me cansava só de pensar.

Mas então lembrei do olhar da Mel quando acordou de madrugada ontem, suado, chorando, chamando a mãe.

Do jeito que ela se encolheu quando eu tentei abraçá-la.

Do jeito que empurrou a babá hoje cedo, dizendo que “ninguém gosta dela de verdade”.

Meu peito apertou.

Eu não precisava de uma babá.

Eu precisava de alguém que conseguisse alcançar a minha filha onde eu falhei.

Levantei, peguei meu casaco e deixei o escritório.

O motorista já esperava na frente da empresa.

— Casa, senhor Tudor? — ele perguntou.

— É. — confirmei, afrouxando a gravata. — E rápido, por favor.

A noite caía sobre Londres — luzes acendendo, pessoas correndo para fazer tudo caber no tempo, ônibus vermelhos cruzando as avenidas como sangue nas veias da cidade.

No banco traseiro, pela primeira vez em semanas, não pensei em relatórios.

Pensei naquela garota desconhecida que chegaria amanhã.

Uma imigrante.

Sem inglês fluente.

Sem experiência com o Ryan.

Novata na cidade.

Um desastre anunciado.

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