Isadora mal havia pisado no elevador e já sabia que o dia não seria dos mais tranquilos. A cabeça ainda fervia com a lembrança da noite anterior — os olhares de Lorenzo, o clima estranho... e, claro, o tal Gustavo. Mesmo assim, chegou cedo, decidida a manter o profissionalismo intacto.
Mas o universo, como sempre, tinha outros planos. Logo após sentar-se em sua mesa, o ramal tocou. — Srta. Mendes? — a voz da recepcionista soou hesitante. — Chegou uma entrega pra você. Um buquê… bem grande. — Entrega? Pra mim? Desceu desconfiada. Ao ver o arranjo, quase tropeçou de susto: rosas brancas impecáveis, em um buquê tão vistoso que mal cabia nos braços. Havia um cartão elegante, com uma caligrafia firme: “Para a mulher que roubou minha atenção ontem. Que tal um jantar, sem interferências? — G.D.” Ela fechou o cartão com um estalo. O calor subiu pelas bochechas como se tivesse levado um tapa. Subiu para o andar executivo com o buquê nos braços, tentando parecer inabalável, mas por dentro fervia de desconforto. Mal havia passado pela porta, Lorenzo a viu. Estava parado ao lado da mesa de sua secretária quando seus olhos se fixaram no arranjo exagerado. Franziu o cenho. Sem disfarçar, caminhou até a mesa de Isadora, que ainda ajeitava as flores ao lado do monitor, tentando decidir o que fazer. — Srta. Mendes — disse ele, a voz baixa, firme. — Posso falar com você um instante? Ela se virou, erguendo os olhos para ele. Estava tensa, mas manteve o tom calmo. — Claro, senhor. Ele indicou com um gesto discreto uma sala de reuniões vazia ao lado. Entraram. Isadora deixou o buquê do lado de fora, como quem se livra de uma culpa. — Flores, é? — Lorenzo começou, cruzando os braços. Ela assentiu. — De Gustavo Diniz — respondeu, direta. — Chegou agora há pouco. Achei melhor que soubesse. Não me sinto confortável com esse tipo de abordagem, principalmente aqui. Ele respirou fundo, desviando os olhos por um breve momento. — Ele passou dos limites — murmurou, mais para si do que para ela. Depois, a olhou de novo. Havia algo mais ali. Uma tensão que não vinha só das flores. — Obrigado por me informar — disse, voltando ao tom profissional. — Gustavo é investidor, mas isso não lhe dá liberdade para agir de forma inadequada com nenhuma funcionária desta empresa. Tomarei as providências. Isadora assentiu, aliviada com a firmeza dele. — Agradeço. E, por favor, descarte isso. Ou... faça o que quiser com as flores. Ela hesitou, depois deu um meio sorriso. — A síndica do meu prédio faz aniversário hoje. Vai achar que fui generosa. O buquê vai ter alguma utilidade, pelo menos. O canto da boca de Lorenzo se curvou de leve, quase imperceptível. Mas ela viu. — Algo mais? — ele perguntou, recuando um passo. — Não, senhor. E saiu da sala com a cabeça erguida. Digna. Mais ou menos. Horas depois, no horário de almoço, Isadora se sentou com Sofia no refeitório. Sofia, como sempre, era pura observação disfarçada de humor ácido. — Tá achando que eu não vi aquele arranjo de flores te escoltando pelo corredor? Amiga, parecia que a primavera chegou em forma de escândalo. — Ah, não começa, Sofia. Foi o Gustavo. Um presente totalmente fora de hora. — Fora de hora e fora da casinha. E Lorenzo? — Falei com ele. Foi... surpreendentemente sensato. Disse que vai resolver. Sofia se inclinou sobre a mesa, olhos atentos. — E você? Vai resolver o que sente quando aquele homem te olha como se soubesse todos os seus segredos? Isadora arregalou os olhos. — Não viaja, Sofia... — Eu vi, Isa. Ele não olha assim por educação. E você... não desvia por timidez. Tem coisa aí. Isadora desviou o olhar, fingindo interesse na sobremesa. — A única coisa que tem aqui é trabalho. E eu preciso muito desse emprego. Sofia soltou um suspiro dramático. — Ai, amiga... espero que você aguente. Porque esse jogo aí entre vocês já começou faz tempo. Só falta alguém admitir.