Capítulo 3 - O inesperado

O escritório Whitmore & Hunt LLP ocupava os quatro andares superiores de um prédio histórico em Mayfair, um dos bairros mais sofisticados de Londres. A fachada de pedra clara, com coluna imponentes e janelas arqueadas, revelava a herança aristocrática da banca jurídica — mas, por dentro, o ambiente era moderno, tecnológico e altamente eficiente.

Referência em Direito Empresarial Internacional, o escritório era conhecido por representar conglomerados multinacionais, fundos de investimento e grandes holdings europeias, com ênfase em contratos estratégicos, fusões e reestruturações globais.

Alicia Parker caminhava pelos corredores com passos firmes, pastas organizadas junto ao corpo, vestindo a calça cinza de corte impecável e uma blusa de seda branca que realçava sua pele delicada. O cabelo solto em ondas suaves, o perfume sutil e a maquiagem neutra completavam o ar de elegância silenciosa que a precedia.

Ela era linda. Isso era inegável. Mas o que mais encantava — e confundia os que a cercavam — era o contraste entre a beleza evidente e a postura contida, discreta.

Alicia Parker jamais foi vista rindo alto nos corredores. Jamais usou roupas justas ou decotes. Nunca foi flagrada em escândalos nem em flertes.

Era o tipo de mulher que os homens olhavam duas vezes… mas não se atreviam a se aproximar.

Ela era distante. Reservada. E, justamente por isso, irresistivelmente magnética.

Naquela manhã, Alicia foi convocada para uma reunião privada com três dos principais advogados seniores do setor internacional:

• Thomas Beckett, especialista em contratos comerciais com sede em Paris;

• Graham Whitmore, neto do fundador e sócio titular do setor societário;

• E Andrew Sterling, coordenador de equipes e responsável por alocações estratégicas.

A sala de reuniões no terceiro andar tinha janelas altas que deixavam entrar a luz fria do inverno inglês, livros antigos nas prateleiras de madeira escura e uma mesa oval de carvalho, cercada por cadeiras de couro verde-oliva. Uma lareira elegante permanecia apagada, mas imponente.

Quando Alicia entrou, todos se viraram. Ela cumprimentou com um leve sorriso e um aceno elegante da cabeça.

— Srta. Parker — disse Whitmore, abrindo espaço ao lado dele —, por favor.

Ela sentou-se com elegância. As pastas alinhadas. As pernas cruzadas naturalmente. A expressão calma.

— Obrigada.

Beckett foi direto:

— Recebemos ontem à noite uma solicitação confidencial de um novo cliente. Uma empresa multinacional que precisa de atuação imediata, com foco em revisão contratual e contenção de danos.

— Trata-se da D’Abruzzi Corporation — completou Sterling, ajustando os óculos. — Uma das maiores redes de importação e exportação da Europa, com sede principal em Milão e filial operacional aqui em Londres. A holding está enfrentando suspeitas internas de vazamento de contratos e documentos sigilosos.

Whitmore cruzou as mãos sobre a mesa e encarou Alicia:

— Eles querem descrição, estratégia, e, acima de tudo, confiança. Por isso decidimos que você será incluída na nossa equipe que os visitará amanhã para a primeira reunião formal.

Ela assentiu com naturalidade, mesmo com o coração acelerado por dentro.

— Perfeitamente. A que horas?

— Às 14h, sede da D’Abruzzi Corporation, em Canary Wharf. O CEO fará uma breve apresentação sobre a situação e os riscos envolvidos. A partir disso, discutiremos a estratégia jurídica e uma possível alocação contínua de um de nossos advogados no jurídico da empresa.

— Isso já está definido? — Alicia perguntou.

— Ainda não. Dependerá da reunião. Mas nossa intenção é mostrar excelência. E acreditamos que sua presença será decisiva nesse aspecto.

Ela respondeu com um leve movimento de cabeça. Não buscava reconhecimento. Mas ouvia com respeito.

— Estarei pronta.

Thomas Beckett trocou um olhar com os outros dois senhores.

Havia um consenso silencioso na sala: ela era especial.

Alicia Parker não era apenas uma advogada.

Era a promessa viva de uma nova era da advocacia britânica: inteligência afiada, beleza serena e ética inquebrável.

Mas ela deixava a sala com os pensamentos em outro lugar.

Na rua escura.

Na boca quente.

Nos olhos negros.

Na pergunta sussurrada contra seus lábios:

Você me quer?

Ela respirou fundo e voltou para sua sala.

Era hora de deixar Alicia voltar ao controle.

Mesmo que, por dentro, Lúcia ainda queimasse em silêncio.

Do outro lado de Londres, em um dos últimos andares da imponente torre envidraçada da D’Abruzzi Corporation, um homem observava a cidade de cima, com as mãos cruzadas atrás das costas.

Victor D’Abruzzi.

Vestia um terno cinza grafite italiano, com corte perfeito, gravata preta estreita e sapatos de couro oxford polidos à perfeição. A postura era firme, o olhar fixo em direção ao Tâmisa, mas a mente... milimetricamente estratégica.

Aos 34 anos, Victor era o tipo de homem que nunca precisou levantar a voz para dominar um ambiente. Sua autoridade vinha do silêncio — e do legado.

Herdeiro do maior império familiar de importação e exportação da Europa, foi criado entre mansões da Toscana, reuniões com ministros, e cafés fortes demais para um garoto de doze anos.

A D’Abruzzi Corporation começara com mármore, vinhos e azeites — produtos finos e tradicionais. Mas, sob seu comando, deixara os rótulos artesanais para trás e mergulhara nos setores mais lucrativos — e sensíveis — do comércio internacional: energia, metais raros e contratos de defesa.

Hoje, a empresa operava com governos, mineradoras, multinacionais e acordos bilaterais protegidos por cláusulas de sigilo absoluto. Tudo passava por ele. Tudo era calculado.

Aos vinte, deixou a Itália para estudar em Oxford.

Decisão estratégica.

Longe da sombra do pai. Longe do peso das expectativas.

Ali, aprendeu a conter o sotaque, dominar o inglês com perfeição e andar com a elegância sutil dos britânicos — sem jamais deixar para trás a intensidade natural de um verdadeiro D’Abruzzi.

Ao retornar aos negócios, não se prendeu apenas ao nome. Transformou a corporação em uma multinacional consolidada. Diversificou mercados, modernizou contratos, criou barreiras jurídicas quase inexpugnáveis... até agora.

— Senhor D’Abruzzi — chamou seu assessor direto, Renzo Bellini, batendo suavemente à porta de vidro do escritório.

— Entre.

— O escritório jurídico Whitmore & Hunt confirmou presença amanhã, às 14h. Quatro advogados seniores estarão presentes, conforme solicitado.

Victor virou-se lentamente, caminhando até a mesa em nogueira escura, onde repousava um relatório detalhado sobre os últimos vazamentos contratuais — documentos que haviam sido interceptados por concorrentes asiáticos semanas antes do lançamento de uma nova operação no porto de Antuérpia.

— Algum nome da equipe?

— Não, senhor. Apenas o representante do setor internacional, Thomas Beckett, e três associados indicados por ele.

Victor assentiu, folheando o relatório com olhos atentos.

— Quero acesso prévio a todos os contratos que serão levados amanhã. E que a sala de reuniões seja preparada com o material técnico pronto e projetores revisados.

— Já está sendo providenciado, senhor. Mais alguma instrução?

— Sim. Traga café italiano de verdade. Não quero aquelas cápsulas aguadas no meio da apresentação.

Renzo sorriu discretamente, habituado às exigências do patrão.

— Entendido.

Victor voltou-se para a janela.

Ele não sabia que a mulher que mudaria tudo estava a menos de 10 km dali, revisando os documentos que levaria para a reunião — com um passado compartilhado com ele que, por ora, ainda era um mistério.

Tudo o que ele queria naquela manhã era resolver o problema técnico de segurança jurídica e conter o dano reputacional de um possível vazamento interno.

Ele ainda não fazia ideia de que a tempestade viria disfarçada de elegância britânica.

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