Alina assentiu, absorvendo cada palavra, tentando manter a calma.
— Vou me esforçar, senhora Alice. Quero fazer tudo certo. — Tenho certeza que sim, minha querida. Ela fez uma pausa antes de acrescentar com um tom um pouco mais sério: — Ah, e outra coisa… Só frequente os cômodos de convivência da casa, aqueles relacionados à rotina de Isabela. Evite passear pelos outros espaços, principalmente o escritório do senhor Joaquim. Ele preza muito pela privacidade dele, e não gosta de interrupções. Alina sentiu um frio na barriga e assentiu rapidamente. — Entendi. Pode deixar, senhora Alice. Vou fazer tudo direitinho. — Tenho certeza de que sim, minha querida. — Alice lhe deu um leve tapinha no braço, voltando a sorrir. — Vou te ajudar no que precisar. Quando a governanta se afastou, Alina ficou ali parada por um momento, processando tudo. O olhar gela-do de Joaquim, a voz doce de Alice e a advertência sobre o escritório pareciam ecos em sua mente. Enquanto a jovem se dirigia de volta para seu quarto, não pôde deixar de pensar no olhar frio de Joaquim, no jeito como ele segurava a filha com um carinho disfarçado por trás de toda a dureza. E na forma como, mesmo sem querer, ele a deixava desconcertada. Um mês havia se passado desde que Alina chegara à casa dos Albuquerque. Durante esse tempo, tudo havia corrido relativamente bem. Ela cuidava de Isabela com dedicação e evitava qualquer interação des-necessária com Joaquim, limitando-se a conversas formais e rápidas, sempre em tom respeitoso e distan-te. Ele, por sua vez, parecia satisfeito com a eficiência e discrição da nova babá, embora seu olhar gélido ainda a deixasse desconfortável. Naquela noite, no entanto, algo quebrou a rotina. Alina acordou sobressaltada ao ouvir o choro abafado vindo do quarto de Isabela. Com o coração acele-rado, levantou-se da cama e, descalça, correu para o quarto da criança. A garotinha chorava desconsola-da, enroscada em seu cobertor. Alina a pegou no colo, embalando-a com palavras suaves e carinhosas. Aos poucos, Isabela foi se acalmando, soluçando baixinho contra o peito de Alina até, finalmente, ador-mecer de novo. Exausta, Alina a colocou de volta no berço, certificando-se de que estava bem. Mas, antes de voltar para a cama, sentiu a garganta seca. Decidiu descer até a cozinha para beber um pouco de água. Vestia apenas um pijaminha curto de algodão, os cabelos soltos caindo pelos ombros, e caminhava des-calça pelos corredores silenciosos da mansão. Quando chegou à cozinha, parou de repente. Joaquim estava lá, encostado no balcão com um copo de uísque na mão. Ele a observou por cima do co-po enquanto dava um gole lento, os olhos se estreitando. Por um instante, o silêncio entre eles pareceu mais pesado do que nunca. Alina sentiu o rosto esquentar ao perceber a maneira como ele a olhava — não era hostil, mas também não era exatamente acolhedora. Era um olhar que ela não conseguia decifrar, misto de tensão e curiosidade. — Não conseguia dormir? — Perguntou ele, a voz rouca pelo álcool e pela hora. — Isabela estava chorando… fui ver o que era. — Ela desviou o olhar, sentindo-se exposta demais de pi-jama e com os cabelos desgrenhados. — E agora está aqui… — ele murmurou, erguendo o copo. — Desculpe, se assustei. — Ah, não… não foi nada — disse Alina, a voz baixinha. — Eu só… só vim beber um copo de água. Hesitou por um momento, depois fez um gesto educado com a cabeça. — Com licença, senhor Joaquim. Vou me recolher. Ele apenas a observou enquanto ela se retirava apressada da cozinha, sentindo o olhar dele queimar em suas costas mesmo quando já estava fora de vista. Lá em cima, no corredor escuro, Alina encostou-se por um momento na parede, tentando acalmar a respi-ração. Não sabia o que havia naqueles olhos dele que a deixavam tão desconcertada, mas uma coisa era certa: por mais que tentasse manter a distância, havia algo naquela casa — e naquele homem — que co-meçava a mexer com ela. Joaquim permaneceu na cozinha, o copo de uísque ainda firme na mão. Observou a porta pela qual Alina havia desaparecido, a imagem dela gravada em sua mente: o pijaminha curto, os cabelos soltos, a ex-pressão entre tímida e determinada. Havia algo naquela garota que ele não conseguia definir. Não era apenas a aparência física, embora fosse evidente que ela era bonita, com um jeito simples e natural que destoava do mundo polido e artificial ao qual ele estava acostumado. Mas era mais do que isso. Era o jeito como ela se comportava — discreta, mas firme. Sempre cuidadosa com Isabela, nunca ultrapassando os limites impostos. Nunca uma palavra fora do tom, nunca um gesto que sugerisse algo além do necessário.