Capítulo 2 – A Proposta

A casa ainda cheirava a comida fria. As velas haviam se apagado há horas, deixando um rastro de cera sobre a toalha branca. O vinho seguia intocado na taça, refletindo as luzes suaves da sala.

Clara estava sentada no sofá, imóvel. O mesmo vestido preto, o cabelo já meio solto, o rosto sem expressão. Não havia lágrimas, só um cansaço profundo, quase silencioso. O relógio marcava quase meia-noite quando ela ouviu o som da chave girando na fechadura.

Arthur entrou devagar, como quem teme o próprio eco.

— Clara… — ele chamou, a voz rouca, insegura.

Ela não respondeu. Apenas levantou o olhar e o encarou.

Por um instante, o silêncio pareceu uma punição. Ele fechou a porta, respirou fundo e se aproximou, os passos pesados no piso de madeira.

— Eu posso explicar… — começou, hesitando. — Não é o que você pensa.

Clara soltou um riso curto, sem humor.

— Não é o que eu penso? Você estava jantando com outra mulher no lugar onde a gente comemorava o nosso amor, Arthur. O que mais eu preciso pensar?

Ele passou a mão pelos cabelos, nervoso.

— Eu errei, tá? Eu… eu não queria que você descobrisse assim.

— Então o erro não foi trair — foi eu ter visto, é isso?

Arthur fechou os olhos por um instante.

— Eu não sei o que aconteceu. Eu me senti… preso, sufocado. A rotina, o trabalho, tudo igual. Eu te amo, Clara, mas eu preciso respirar.

Ela o olhou, sem raiva, sem gritar. E isso o desarmou mais do que qualquer ataque.

— Você precisava respirar, e por isso escolheu outra mulher?

— Eu não escolhi — respondeu rápido. — Aconteceu. As coisas acontecem.

— Não — ela corrigiu, calma. — As coisas não “acontecem”. Você escolhe. Você decidiu mentir pra mim, decidiu sair com ela, decidiu me enganar.

Arthur ficou em silêncio. Caminhou até o aparador e serviu um pouco de whisky, tentando parecer no controle, mas a mão tremia.

— Eu só queria que você me entendesse — disse, sem encará-la. — Que entendesse que eu não quero perder o que a gente tem.

Clara o observava com uma serenidade quase cruel.

— E o que a gente tem, Arthur?

Ele demorou a responder.

— Uma história. Uma vida. Cinco anos juntos. Eu não quero jogar isso fora. Eu só… — engoliu em seco — eu só quero liberdade.

Ela arqueou a sobrancelha.

— Liberdade?

Arthur se virou, os olhos marejados.

— Talvez o que esteja faltando pra gente seja… abrir o casamento.

A frase caiu no ar como uma pedra.

Clara piscou devagar, tentando entender se ele realmente tinha dito aquilo.

— Um casamento aberto? — repetiu, em voz baixa.

— Sim — ele disse, com firmeza repentina. — Tem casais modernos que fazem isso, que se permitem viver outras experiências sem que o amor acabe. Eu te amo, Clara. Só acho que a gente precisa… se reinventar.

Ela ficou em silêncio. Ele interpretou o silêncio como choque e tentou avançar:

— Seria um acordo. Um recomeço. Eu juro, eu quero continuar com você.

Clara levantou-se devagar. O som do tecido do vestido deslizando contra o sofá pareceu amplificar o momento. Ela caminhou até ele, devagar, os olhos fixos nos dele.

— Você quer um casamento aberto, Arthur?

— Quero que a gente tenha espaço pra respirar. Que possamos ser livres sem acabar um com o outro.

Clara o observou por longos segundos.

Então, para total surpresa dele, ela assentiu.

— Está bem.

Arthur piscou, confuso.

— O quê?

— Está bem — repetiu, firme. — Você quer um casamento aberto, então vai tê-lo.

Ele deu um passo pra trás, atônito.

— Clara, eu não disse isso pra te machucar. Eu só… eu não achei que você fosse aceitar.

Ela esboçou um sorriso frio.

— Pois é. Você nunca acha que eu seria capaz de nada, não é? Nem de te enfrentar, nem de te deixar, nem de aceitar isso.

Fez uma pausa. — Mas adivinha? Eu aceitei.

Arthur a encarou, sem entender.

— Você tá falando sério?

— Mais do que nunca — respondeu, com uma calma que parecia perigosa. — A partir de amanhã, estamos “abertos”. Você vive como quiser. E eu também.

Ele a olhou, surpreso, tentando decifrar se ela falava por impulso ou vingança.

Mas Clara apenas se virou, caminhando até o corredor.

Antes de desaparecer no quarto, disse sem olhar pra trás:

— Boa noite, Arthur. E boa sorte com a sua liberdade.

A porta se fechou devagar.

Arthur ficou parado na sala, com o copo ainda na mão, o som do relógio ecoando como um lembrete cruel. Ele achou que dominava o jogo, mas, sentiu medo.

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