CAPÍTULO 04

AURORA

Perambulei por várias cidades durante dias, até que o destino me trouxe até aqui. Não esperava muito desse lugar escondido entre o mar e a floresta, mas uma coisa eu sabia com certeza — estava longe o bastante.

Longe o bastante para que Victor ou Agne não pudessem me encontrar com facilidade. Quando o estômago roncou e a cabeça latejou, cedi à fome.

O orgulho falou mais alto — não queria ter que caçar como loba, então entrei no primeiro restaurante que encontrei.

Simples por fora, mas lotado por dentro.

Havia algo acolhedor naquele espaço. Não era apenas o cheiro de comida que enchia o ar — era o calor humano, o burburinho baixo de conversas, risadas, talheres tocando pratos.

Sabia que tinha pouco dinheiro, mas não custava nada olhar o cardápio e alimentar a esperança de que algo se encaixasse na minha condição.

Eu não havia percebido o homem atrás do balcão, com uma aparência marcante e poderosa até o momento em que fiz meu pedido.

Aquele homem não apenas aparentava força e confiança — ele transbordava uma masculinidade quase palpável.

Os braços fortes revelavam músculos definidos sob a camisa de mangas dobradas. O peitoral largo, o rosto quadrado com mandíbula bem delineada e barba rala, davam a ele um ar quase selvagem.

Os cabelos castanhos escuros e a pele bronzeada contrastavam lindamente com o branco da camisa. Mas o que mais me atingiu foram os olhos.

Olhos escuros e penetrantes, como se vissem além da superfície, como se estivessem sempre à espreita. Por um instante, me senti exposta e frágil.

Algo nele me intimidava e não era só a aparência — era a energia. Mas havia algo mais. Algo que eu não conseguia identificar até olhar diretamente nos olhos dele… ele também era um lobo.

Sempre me preocupei em manter distância de outros da minha espécie, e jamais imaginei cruzar com um lobo justamente naquele lugar.

Minha loba permanecia cativa, surgindo apenas quando eu lhe cedia o controle para nos proteger durante a noite. Mas, quando meus olhos encontraram os dele, tudo mudou.

Algo despertou nela — o cheiro que vinha dele, inebriante e amadeirado, a puxou para fora do escuro, como se ela tivesse saído da sombra para a luz, só para contemplá-lo.

Meu coração disparou, como se quisesse fugir do peito. Um frio intenso me percorreu a espinha, enquanto o olhar dele cravava-se em mim, fundo, despertando algo que eu não sabia definir o que era.

Um misto de medo e desejo me dominou, e tudo ao meu redor pareceu desaparecer — só existíamos nós dois, ligados por aquele olhar.

Apenas quando a moça simpática que atendia as mesas — e que logo percebi ser outra loba — se ofereceu para me atender, aquele encantamento se quebrou.

Percebi o modo como ele me olhava, tentando decifrar de onde eu havia surgido — como se minha simples presença tivesse desestabilizado algo dentro dele.

Sentia seus olhos cravados em minhas costas, como se esperasse que, a qualquer momento, eu causasse um problema que ele teria de resolver.

Esforcei-me ao máximo para ignorá-lo, sem compreender por que minha loba estava tão inquieta, agitando-se incessantemente em minha mente.

Ela implorava pelo controle com uma urgência quase desesperada. Arranhando as paredes da minha mente, rosnava baixo, impaciente.

Eu tentava contê-la, mas ela estava determinada. Então, quando menos esperava, sua voz ecoou clara em minha mente — forte, possessiva, impossível de ignorar.

“Nosso”

Meu corpo enrijeceu. Não… não podia ser. Ela estava se referindo a ele? Aquele homem de olhos intensos, que me fitava como se enxergasse através da minha alma? Aquilo não fazia sentido. Eu me recusei a aceitar.

— Você está enganada… — murmurei para mim mesma. — Isso não pode ser verdade.

Quando ele se aproximou da mesa para trazer a conta, senti meu coração disparar.

Uma parte de mim esperava — desejava que ele dissesse algo. Qualquer coisa que quebrasse aquele silêncio tenso entre nós e explicasse o turbilhão de sentimentos que eu não conseguia compreender.

Seu rosto estava fechado, sério demais. Os olhos, duros. Ele parecia irritado com a própria presença ali, ou talvez fosse só comigo.

— Quem é você? — perguntou, direto, colocando a conta diante de mim e sentando-se na cadeira a minha frente, encarando-me.

Sua voz soou fria. Nada na sua postura indicava que ele sentia o mesmo turbilhão que me consumia.

Ele parecia ser exatamente como Victor. E eu… eu não tinha fugido de uma prisão para entrar em outra. Não importava o que a minha loba sentisse. Eu não permitiria que me arrastassem de novo para a escuridão.

— Desculpe? — perguntei, querendo aparentar surpresa e ignorância.

— Estou perguntando quem você é… e imagino que já tenha percebido ao que me refiro — disse ele, com a voz mais ríspida.

— Não sabia que para comer aqui eu precisaria me identificar — argumentei, não baixaria a cabeça para esse idiota.

— Perdoe meu patrão, lindinha. Você não precisa se identificar para comer aqui, é claro. Acho que ele só ficou surpreso… não recebemos muitos clientes como você — disse a garçonete, tentando suavizar o momento com um sorriso gentil.

Ela, que também era uma loba, foi muito mais simpática do que ele. Seu sorriso era sincero, e seu olhar carregava uma gentileza acolhedora.

— Tudo bem… eu não sabia que existiam… você sabe, pessoas iguais a mim aqui. Não quero causar problemas — disse eu, por fim.

— Está só de passagem ou pretende ficar? — perguntou aquele lobo rude, direto mais uma vez.

— Isso não é da sua conta — respondi, com ousadia na voz e um brilho desafiador no olhar.

— Quando você está em meu território, é da minha conta, sim — respondeu ele, com firmeza. E aquilo me pegou de surpresa.

— Killiam, pare de ser rude… ela não representa ameaça alguma, e você deve ter sentido isso — disse a loba, em minha defesa.

— Me chamo Aurora — disse, enfim me apresentando, e estendi a mão na direção dele, como uma pessoa civilizada.

O gesto foi simples, quase ingênuo, mas seu corpo pareceu enrijecer. Minha mão pairou no ar entre nós, e por um momento, tudo o que eu conseguia pensar era em como seria sentir o aperto dele.

Mas ele me ignorou completamente. Deliberadamente. Hesitei por um segundo, mas antes que pudesse baixar a mão, a garçonete a apertou com um sorriso, mais uma vez tentando suavizar o clima.

— Me chamo Suelen, como você já sabe. E esse idiota aqui é o Killiam, dono do restaurante — disse ela, com um sorriso maroto.

Aquele homem me encarava, e minha loba se agitava dentro de mim, implorando para que cedesse ao nosso laço.

— Você está apenas de passagem ou pretende aproveitar a magia deste lugar? — perguntou Suelen, em um tom bem mais ameno.

— Ainda não tenho certeza… — respondi agora, com um leve suspiro. — Cheguei a poucas horas, mas percebi que a cidade é pequena e não há muitas opções de trabalho aqui.

— Parece que você está com sorte, Aurora… — disse Suelen, animada, fazendo-me encará-la com curiosidade. — Estamos precisando de mais alguém para ajudar aqui no restaurante.

— Isso é sério? — perguntei, com uma voz carregada de esperança, enquanto olhava de Suelen para ele. Uma fagulha de esperança acendendo dentro de mim.

E não era pelo laço que me atraía a ele, mas pela oportunidade de conseguir algum dinheiro para me manter fugindo do passado.

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