Eu não posso me casar

Parte 6...

Valentina

Na manhã seguinte...

— Meu Deus... – esfreguei o rosto várias vezes de novo — O que eu faço? – puxei o ar. Parece que está difícil respirar — O que eu faço?

— Calma, amiga... A gente vai dar um jeito – Bianca estava ao meu lado, segurando meu joelho.

— Jeito como, Bia? Não tem jeito – senti que ia começar a chorar de novo. Coisa que desde ontem eu faço.

— Tem sim, pra tudo se tem jeito. A gente vai achar um, espera só...

Eu balancei a cabeça. Não sinto que eu possa dar um jeito nisso. É um acordo que meu pai fez e que eu vivi na ignorância por tanto tempo. Não há o que fazer agora, a não ser voltar para casa e cumprir minha parte. Uma parte que nem mesmo sabia, nem fui avisada, vivi na escuridão e ainda perdi tempo fazendo planos para meu futuro.

— Eu tô me sentindo mal – coloquei a mão na testa — Sinto um peso na cabeça, parece que estou sufocando.

— Calma, pelo amor de Deus! – ela quase gritou — Isso é nervosismo, é estresse...

— Eu sei disso – mordi o lábio com força que cheguei a sangrar — Eu só não sei como sair – ergui as mãos — Deus não existe...

— Claro que existe, não diga bobagens.

— Pois se existe, ele não gosta de mim.

Ela revirou os olhos.

— Val, a gente vai te ajudar... – fez um gesto com a mão para esperar — A gente vai conseguir.

— Vai conseguir o que? – levantei e andei pelo quarto com a mão na testa, cheia de pensamentos e dúvidas — Meu pai espera que eu volte para casa o quanto antes para poder me casar. – parei em frente a ela — Eu não quero me casar, Bia!

Ela levantou também com os olhos arregalados.

— E você não vai, não vai!

Deram duas batidinhas na porta e paramos de falar. A porta abriu e Silas enfiou a cabeça pra dentro.

— Posso entrar?

— Entra logo, inferno! – Bianca o puxou de vez. — Por que você demorou?

— Porque eu não podia sair da aula assim, ia dar muito na cara – ele me olhou com uma carinha de pena. Eu odeio pena — Você está bem, amiga?

— Não, ela está surtando – Bianca respondeu por mim — E cadê a Kira? Eu não a vi ainda hoje.

— Ela me disse que tinha que ficar na biblioteca estudando até tarde ontem – andei pelo quarto mordiscando o polegar.

— Tá, mas ela não veio dormir?

— Eu sei lá – bati as mãos — Eu não estou com cabeça pra ficar vigiando se a Kira veio dormir ou não, Bianca.

— Meu Deus, calma criatura. Você vai ter um troço daqui a pouco.

— Ai, seria tão bom – coloquei as mãos na cabeça e soprei o ar — Pelo menos se eu morrer, ninguém vai me forçar a me casar com um estranho.

— Val, eu fiz uma pequena pesquisa ontem – Silas levantou o dedo — Aproveitei que tinha aula de informática e usei o computador pra pesquisar na internet.

— E pesquisou o que?

— Sobre seu marido... Desculpe, seu suposto marido – ele ergueu as mãos.

— Tá, mas e daí?

— Daí que ele é muito gostoso – ele fechou os olhos e deixou o corpo inclinar pra frente.

— Silas! – quase falei igual com Bianca.

— Ué, gente... É a verdade. – ele segurou minhas mãos — Valentina, o cara é um g.a.t.o... O cabelo dele... – se abanou — Ui, Jesus!

— Silas, você está muito menina hoje – Bianca colocou as mãos na cintura — Pare! Agora!

— Preconceituosa.

Eu não pude deixar de rir. Silas estava ainda na fase de dúvida. Tinha dias em que ele se declarava gay e outros que era bissexual. Enfim, ele era muito eclético com relação a pessoas.

Sentei na beirada da cama, ouvindo Silas contar sobre as descobertas de sua pesquisa. Até parecia que falava como um espião.

— Mas como conseguiu burlar os códigos?

— Ah, minha filha... Eu dou meu jeito.

A internet era liberada, mas apenas para acesso interno. Ninguém conseguia saber o que se passava na internet normal para todos. O colégio tinha regras pesadas sobre se envolver com assuntos que fugiam de nossa educação e também para evitar problemas, inclusive de depressão, com alguns alunos.

Como meu caso, que eu entrei aqui e nunca voltei para casa. Assim como eu, tantos outros também eram assim. Saber o que se passa do lado de fora baseado em futilidades, para a diretora Collier, era algo errado e que só iria trazer prejuízos para nossa conduta e educação.

A porta se abriu de vez, até levei um susto, mas era a Kira.

— Gente, gente... – ela estava até sem ar.

— Você veio correndo? – Silas riu — Está toda vermelha igual a um camarão.

— Não enche – ela deu um tapa nele — Val, eu já sei o que fazer. Você não vai se casar. Pode parar de surtar e de chorar.

— E por que não? – franzi a testa. — O que você fez, Kira?

— Eu fui atrás de quem pode ajudar você a se livrar desse acordo ridículo que seu pai fez – apontou o dedo, balançando a cabeça — Aliás, seu pai é muito sacana, me desculpe falar. Isso não se faz. Ele casou uma menina.

— Na verdade, ela não casou ainda...

— Cala a boca, Silas – falamos por igual.

Ele fez uma cara de medo, abriu a boca e deu um passo para trás.

— Sentei – ergueu as mãos e puxou a cadeira.

— Fala logo, Kira – apertei as mãos no colo.

— Ontem eu disse que ia estudar até tarde na biblioteca... Mas era mentira – ela abriu a mão na minha cara pra que eu ficasse calada — Eu dei uma fugida – arregalei os olhos — E fui até a casa de um amigo.

— Amigo? – Silas deu uma risadinha e piscou o olho — Eu sei, eu sei...

— É sério... Quase... – ela gesticulou meio sem sentido — Bom, não interessa o rótulo agora. É um amigo que eu conheci de umas saídas atrás.

— Onde? – eu cruzei os braços — Eu conheço esse amigo?

— Não, você já o viu, mas não conhece – abanou a mão — O que importa é o seguinte... Eu dei uma fugidinha e fui até a casa dele... Pra conversar – apontou para Silas — Cala a boca!

— Credo – ele riu abrindo os braços — Que violência é essa?

— A gente não tem que entrar em detalhes agora de minha relação com o Jay. Eu o conheci quando a gente foi naquele restaurante de comida mexicana, lembra, Valentina?

Eu me lembro da fuga para ir ao restaurante. Foi a terceira vez que a gente criou coragem pra escapar do colégio sem ninguém saber. A primeira vez foi ideia pura da Kira, sempre querendo ser a rebelde e eu embarquei na dela. Silas e Bianca já foram com a gente também, mas geralmente somos nós duas que damos nossas escapadas.

— Eu lembro sim. E o que tem ele?

— Ele vai te levar para a França.

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