Predador: Presa em minhas garras
Predador: Presa em minhas garras
Por: Evy
Capítulo 1: O lobo cruel

O cheiro de sangue e medo impregnava o ar.

Melia tinha apenas treze anos. Era frágil, magra, os cabelos grudados na testa de tanto suor. Corria pela mata com os pés descalços, tropeçando nos galhos, com os olhos marejados e o coração batendo tão alto que abafava qualquer som ao redor. A respiração arfante da mãe ao seu lado mostrava que ambas estavam no limite. A floresta de Obsidian parecia nunca terminar, árvores escuras, o chão úmido e coberto de folhas mortas e pedras que cortavam seus pés era tudo o que viam à frente. A noite densa era iluminada apenas pela luz trêmula da lua e, mesmo sem muitas esperanças, precisavam continuar.

E atrás delas… o som de lobos.

Rugidos e uivos preenchiam a mata como um coro vindo de um pesadelo sufocante. Galhos se partindo, patas rasgando o chão… Eles estavam cada vez mais perto.

— Melia, corre! — gritou sua mãe, Selene, puxando o braço da filha com força. — Não olha pra trás, minha pequena! Não para de correr!

Mas o corpo da menina já não obedecia. As pernas pequenas falhavam, os joelhos estavam bambos e ela estava exausta. O terror era tanto que a garotinha não sentia mais o frio cortando sua pele. Então, de repente, tropeçou em uma raiz grossa e caiu de joelhos, o rosto raspando na terra molhada e o gosto de sangue chegando a sua boca.

— Mamãe… — soluçou, agarrando o vestido da mãe, os olhos arregalados. — Eu não aguento mais… ele tá aqui, ele tá falando comigo… Tô ouvindo a voz dele…

A voz na mente das duas era monstruosa, profunda, cheia de fúria e ódio.

“Selene, pare com isso. Devolva minha companheira, essa criança me pertence!”

Selene apertou os dentes, os olhos brilhando com uma raiva que queimava como brasas. 

Não hesitou.

Num segundo, se transformou.

O corpo da mulher alongou, os ossos estalaram, e no lugar da mãe, surgiu uma loba. Elegante, embora magra, com pelos rajados em preto e cinza. Seus olhos amarelos brilharam como tochas.

Ela se abaixou, abocanhou com cuidado a blusa da filha e jogou Melia sobre suas costas, protegendo o corpo da menina entre os ombros. Não deixaria aquele monstro levar sua menina, nem que precisasse dar sua vida para isso.

A loba correu.

Melia chorava sem parar, agarrada ao pescoço da mãe.

— Ele tá aqui! — gritou. — Ele tá dentro da minha cabeça! Mãe, faz ele sair! Faz ele parar!

A voz do alfa Van Smaill agora era um trovão em suas mentes.

“Melia… minha pequena companheira… Acha que pode fugir de mim? Acha mesmo que pode escapar do alfa de Obsidian?”

O uivo dele ecoou pela floresta, como uma sentença de morte.

Mas a loba não parava, saltava entre raízes, pedras, e atravessava galhos afiados. Mesmo ferida, mesmo com o sangue escorrendo das patas, continuava.

Ao longe, a clareira já era vista, a linha invisível que separava Obsidian de Valtheria. A fronteira entre os dois territórios, um passo a mais e estariam sob a proteção de outro alfa. 

Era a única esperança delas.

Mas ele estava atrás, o alfa de Obsidian não as deixaria ir tão fácil. 

Claro que não.

Era um lobo monstruoso, de pelos avermelhados e olhos vermelhos como brasas. Imenso, selvagem, as garras arrancavam a terra, e os dentes estavam expostos em um rosnado animalesco. Corria pela mata como um vulto vermelho, decidido a alcançar as escravas e estraçalhar aquela loba insolente que teve a pretensão de lhe tirar o que lhe pertencia.

Melia olhou para trás e gritou.

— Ele tá vindo! Mãe! Ele tá vindo!

A loba correu mais rápido, soltando um grunhido de dor.

A fronteira se aproximava. 

Van estava quase alcançando. 

O som dos outros lobos atrás era ensurdecedor, eles vinham com sede de sangue, prontos para rasgar mãe e filha em nome do alfa deles. Selene sabia que, se a pegassem, ela não viveria para ver o que Van faria a sua menina e Melia estaria condenada a morte ao lado daquele monstro.

Selene reuniu todas as forças que lhe restavam e, com um impulso final, se jogou com a filha sobre a fronteira.

As duas rolaram pela grama úmida, caindo com força do outro lado.

Então, no mesmo instante suas mentes se silenciaram.

A voz de Van não alcançava mais suas mentes, não ali. 

Os lobos de Obsidian frearam, parando exatamente na linha da fronteira. Rosnavam, uivavam, mas nenhum ousava atravessar.

Selene voltou à forma humana, sangrando, nua, com o corpo tremendo, cobriu a filha com o próprio corpo, apertando a menina contra si, tentando escondê-la dos olhos dos outros lobos principalmente dos olhos dele.

Haviam conseguido… Mas será que a fronteira poderia protegê-las daquele lobo cruel?

Van também mudou, voltando a forma humana a medida que caminhava, as patas se tornando pés, o focinho de lobo se moldando num rosto humano, até que ele estivesse completamente mudado, parado na frente da linha da fronteira. Agora era um homem alto, forte, de traços frios e duros no rosto. Os cabelos escuros e desgrenhados caíam sobre os olhos vermelhos, o peito nu ostentava cicatrizes. Ele estava ofegante, as mãos cerradas ao lado do corpo.

Ficou na frente da fronteira e sorriu, um sorriso lento, ameaçador.

— Que bonitinho… — murmurou, com a voz rouca. — A escrava traidora protegendo a filhinha... Acha mesmo que vai conseguir mantê-la longe de mim, Selene?

A mulher, mesmo ferida, manteve o olhar firme.

— Ela não é sua, nunca foi, e nunca vai ser. Você sabe disso! As outras também não eram suas, e você as matou!

Van soltou uma risada baixa, os lobos atrás dele rosnaram, ansiosos.

— Cale essa boca, escrava… Nada disso te interessa, você me pertence, é uma escrava e eu comprei você… Assim como comprei sua filha, ela também é minha, atravessar a fronteira não vai mudar isso.

— Você não é um companheiro — cuspiu Selene. — É um monstro.Minha filha é só uma criança e mesmo assim você quer marcá-la. Não passa de um monstro maldito, que marca crianças!

Van se aproximou mais da linha, sem ultrapassá-la. Os olhos cravados em Melia, que tremia em silêncio nos braços da mãe.

— Eu vou encontrá-la, pequena companheira… — prometeu com voz baixa. — Não importa onde esteja. E quando eu pegar de volta o que é meu… vai aprender que fugir de mim tem um preço.

Melia fechou os olhos com força, encolhendo-se.

Van olhou para Selene uma última vez.

— Espero que a faça lembrar que eu sempre… Sempre, Selene, vou estar esperando. E que, quando menos esperar… vou aparecer e arrastá-la de volta para Obsidian.

Ele virou de costas, se transformou novamente e desapareceu com os lobos em meio à escuridão da floresta.

A noite ficou em silêncio.

Selene abraçou a filha com força, afagando os cabelos dela enquanto Melia chorava baixinho. Estavam a salvo, por enquanto.

Mas mesmo depois que Van se foi, deixou o medo e o terror para trás… Porque não importava para onde elas iam, parecia que ele seria sempre sua sombra, o demônio embaixo de sua cama.

E aquilo era só o começo.

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