"Quando a escuridão é sua única companhia, até os demônios parecem convidativos."
Uma dor latejante na nuca foi a primeira coisa que Scarlet percebeu ao retomar a consciência. O segundo foi o cheiro — sangue velho, ervas amargas e algo indefinivelmente animal. Ela tentou se sentar, mas correntes ásperas a puxaram de volta contra uma superfície fria de pedra. Ah, acordou. A voz feminina era como vinho derramado sobre veludo — doce, mas com um amargor oculto. Scarlet forçou os olhos a se focarem na figura à sua frente: uma mulher alta, de cabelos prateados como a lua e olhos cor de âmbar que brilhavam no escuro. Valquíria — Scarlet engoliu seco, o nome saindo como uma lembrança que não sabia ter. A loba-alfa sorriu, mostrando dentes perfeitos e afiados. Então você sabe quem eu sou. Interessante. Ela deslizou pela caverna úmida, suas unhas longas raspando contra a pedra como garras. — Mas não sabe o que você é, não é mesmo?
Valquíria ergueu uma mão. Em um movimento fluido, as correntes de Scarlet se soltaram como cobras mortas. Ande. Scarlet esfregou os pulsos marcados, mas obedeceu. Cada passo ecoava nas paredes da caverna, que agora revelava sua verdadeira natureza não era uma simples gruta, mas um santuário. Entalhes antigos cobriam as paredes, mostrando cenas de guerra entre lobisomens e humanos... e no centro, uma figura feminina com marcas idênticas às que agora cintilavam nos braços de Scarlet. Você é a última Ligação de Sangue Valquíria parou diante de um altar manchado de séculos de sacrifícios. Uma humana capaz de gerar lobisomens ainda mais fortes... ou destruí-los com um simples corte. Scarlet sentiu o ar faltar. Isso é impossível! É sua herança. Valquíria girou, seu vestido de peles esvoaçando. Sua mãe era uma. Sua avó também. Todas queimadas pela mesma alcateia que agora quer seu sangue. Um urro distante fez a caverna tremer. Valquíria riu. Eles ainda lutam por você. Patético. Ela se inclinou para Scarlet, seu hálito quente cheirando a menta e metal. Kieran acha que pode protegê-la. Rafael quer usá-la. Mas nenhum deles merece o poder que você carrega. Scarlet recuou, suas costas colidindo com algo sólido — alguém. Mãos grandes envolveram seus ombros. Errou de novo, Val. — A voz de Rafael era um sussurro venenoso atrás dela. Eu não quero usá-la. Ele girou Scarlet para enfrentá-lo. Seus olhos azuis agora brilhavam vermelhos como brasas. Eu quero devorá-la. Antes que Rafael pudesse agir, um vulto escuro arrebentou através da entrada da caverna Kieran, seu torso ensanguentado, suas garras estendidas. Ela não é sua! Valquíria bateu palmas, uma risada melodiosa ecoando. Magnífico! Agora façam sua escolha, Ligação. Ela apontou para os irmãos. Um morrerá hoje. O outro você levará para sua cama. Qual será? Scarlet olhou para Kieran, depois para Rafael. E então, algo dentro dela despertou. As marcas nos braços de Scarlet incendiaram-se em dourado, projetando sombras de lobos gigantes nas paredes. Valquíria recuou, seu rosto pela primeira vez mostrando medo. Impossível... ela sussurrou. A Ligação já escolheu. O ar dentro da caverna ficou eletrizante, como se uma tempestade estivesse prestes a desabar sobre suas cabeças. Scarlet olhou para suas mãos, onde veias douradas pulsavam sob sua pele, irradiando um calor que não queimava mas consumia. Valquíria recuou mais um passo, suas garras cravadas no chão de pedra. Pare! a loba-alfa ordenou, mas sua voz perdeu a firmeza. Scarlet não a ouviu. Era como se mil vozes sussurrassem em sua mente, todas falando uma língua antiga que, de algum modo, ela entendia. Scarlet. Kieran foi o primeiro a chamá-la, seu rosto ensanguentado iluminado pelo brilho dourado que agora emanava de seu corpo. Ele estendeu a mão, não como um lobisomem para sua presa, mas como um homem para uma mulher. Não lute contra isso. Do outro lado, Rafael riu, mas era um som tenso, quase nervoso. Isso, eu não esperava. Seus olhos vermelhos refletiam o brilho dourado de Scarlet, como se estivessem sendo consumidos por dentro. Scarlet sentiu algo quebrar dentro dela. E então, ela riu. O som ecoou pelas paredes da caverna, transformando-se em algo maior, mais profundo um rosnado que não era humano, nem lobisomem, mas algo entre os dois. Vocês três... Scarlet falou, mas sua voz vinha em camadas, como se mais alguém falasse através dela. ...acharam que eu era apenas uma peça no jogo de vocês. Valquíria finalmente pareceu entender o perigo. Mate-a! Ela ordenou aos irmãos. Mas nem Kieran nem Rafael se moveram. Eles não podiam. Seus corpos estavam rígidos, músculos tremendo como se lutassem contra uma força invisível. Scarlet ergueu a mão, e os dois caíram de joelhos, suor escorrendo por suas têmporas enquanto uma dor invisível os consumia. Vocês querem meu sangue? Scarlet perguntou, avançando em direção a Valquíria, que agora recuava em direção à parede. Então venham buscá-lo. E então, com um único gesto, as tochas da caverna se apagaram. Na escuridão, só restaram três pares de olhos brilhando: Dourado (Kieran) Vermelho (Rafael) E um novo... Âmbar flamejante (Scarlet) Quando a luz retornou, Valquíria já não estava mais sozinha. Dez lobisomens agachados atrás dela, todos com os olhos fixos em Scarlet — alguns com medo, outros com adoração. E no canto mais escuro da caverna, uma figura que Scarlet não tinha visto antes observava tudo em silêncio... Com os mesmos olhos dourados que os de Kieran.