No dia em que completei dezoito anos, perdi tudo. O presente que a vida me deu foi a morte do meu pai — e, junto com ela, a certeza de que eu não teria paz até ver cada gota de sangue vingada. Desde então, carrego o gosto amargo da promessa que fiz de joelhos, diante do caixão: ninguém sairia impune. Nem que eu mesma tivesse que sujar as mãos. Eu só não sabia que meu maior inimigo usaria perfume caro, sorriso torto e mãos que me seguram forte demais quando tento fugir. Ele está aqui, colado em mim, quente como pecado, frio como a arma que carrega na cintura. Agora sou eu, minha sede de vingança e esse desejo proibido que me corrói por dentro. E entre beijos, mentiras e balas disparadas no escuro… alguém vai sair perdendo. Mas não serei eu.
Ler maisDezoito anos. Não parecia real.
Ainda não me acostumei com a ideia de que deixo de ser, oficialmente, “a menininha do papai” ou “a garotinha da mamãe”. A verdade é que, junto com a idade nova, vinham responsabilidades pesadas: faculdade, noivado, contas, planos de casa, filhos — a vida adulta se aproximando como uma maré inevitável.
Olhei em volta da boate. A luz piscava freneticamente, colorindo rostos, corpos e sorrisos. A música alta vibrava dentro de mim, mas meus olhos estavam fixos nele: meu pai. Encostado no balcão, com os braços cruzados, observava tudo em silêncio. Os fios grisalhos começavam a aparecer entre os cabelos escuros, contrastando com a camisa branca social que realçava sua postura firme, ainda atlética. Seu olhar encontrou o meu por um instante — carregava ternura, mas também um peso que eu não conseguia nomear.
Ele tirou o celular do bolso, mostrou-o para mim e apontou para os fundos da boate. Assenti com a cabeça, torcendo em silêncio para que não fosse uma daquelas ligações que duram uma eternidade. Era o meu aniversário. A minha noite.
Ainda assim, compreendi. O trabalho dele exigia isso. Mas mesmo entendendo, algo dentro de mim doía.
Ele voltou minutos depois, com o rosto mais tenso. Aproximou-se e inclinou-se ao meu ouvido.
— Tessa, eu preciso ir. Volto em algumas horas, prometo.
Neguei de imediato, segurando o olhar dele.
— Pai… é o meu aniversário.
— Eu sei, filha. — Ele respirou fundo, os olhos varrendo o salão lotado. — Mas você vai se sentir mais à vontade sem mim. E, além disso… — hesitou, e então, com um meio sorriso — você não vai sentir minha falta.
Claro que eu sentiria. Mas não disse.
Ele me abraçou forte, beijou minha testa com carinho e sussurrou:
— Aproveite cada segundo. Eu te amo.
— Eu te amo mais, pai — respondi, com um nó na garganta.
Fiquei ali parada por alguns segundos, observando-o sair. A silhueta dele se perdeu entre as luzes da entrada. Senti um aperto no peito. Minha mãe também já tinha ido embora. E agora eu estava só. Não exatamente sozinha — havia amigos por todos os lados — mas sem eles. Sem meus dois pilares.
Fui puxada de volta ao presente pelos gritos animados dos meus amigos.
— Liberdade! Liberdade!
Me levantaram no ar três vezes, me lançando sobre os ombros e braços, rindo, celebrando. Me senti viva. Me senti a rainha daquela noite.
A batida da música me conduzia. Meu vestido preto colado ao corpo refletia as luzes. Meus cabelos negros, soltos e escovados, balançavam com os passos. Cada abraço recebido, cada felicitação me lembrava do quanto esperei por esse momento. Mas, por dentro, algo ainda pesava — uma sombra sutil de desconforto que eu tentava ignorar.
Talvez fosse a ideia de que, agora, tudo mudaria. Logo viria o casamento. Logo eu teria que “virar mulher de verdade”.
Ele apareceu no meio da multidão. Messias. Meu namorado. Blusa preta, calça jeans e aquele sorriso torto que sempre me desarmava. Tinha os olhos azuis mais intensos que eu já vi. E mesmo bêbado, ainda sabia como me conquistar.
— Mê... — sussurrei, interrompendo o beijo antes que ele começasse. Ele sempre dizia que o lugar não importava, mas pra mim… importava sim. Eu não queria ser só mais uma. Queria que a primeira vez fosse depois do casamento.
— Paciência, vai. Eu sei que você quer... — disse ele, colando nossos corpos.
— Eu quero, mas quero mais do que isso — respondi, olhando nos olhos dele, no meio da escuridão da boate.
Ele suspirou. Não insistiu. Voltamos a nos beijar devagar, no nosso ritmo, até que os amigos nos separaram de novo com risadas e abraços.
Minha melhor amiga, Camila, surgiu sorridente, me puxando pela mão.
— Que carinha é essa? É sua festa, aproveita!
— Eu tô tentando... — respondi, deixando que ela me levasse até a pista de dança.
— Vai me contar no que tá pensando? — ela perguntou, entrelaçando os dedos aos meus, como sempre fazia quando queria saber mais do que eu estava disposta a dizer.
— Nada com que se preocupar agora, Cam. — sorri e ajeitei o batom vermelho borrado dela com o dedo. — Quem te borrou assim, hein, vadia?
Ela riu, fugindo da resposta, e eu a empurrei de leve, rindo também.
Logo fui chamada por outro grupo de amigos. Celebrei mais. Ri, dancei, gritei. Mas, de vez em quando, ainda procurava Camila no meio da multidão. Quando percebi que ela não estava mais por perto, fui até o banheiro. Estava lotado.
Cumprimentei algumas pessoas pelo caminho, todas me parabenizando. Corri para a primeira porta aberta, fechei e encostei, tentando respirar e conter aquela mistura de alegria e ansiedade.
Foi então que ouvi a voz dele.
— Eu te amo!
Messias entrou rindo, com os braços abertos e a bebida na mão. Me beijou com força, o gosto do álcool invadindo minha boca. Suas mãos desceram rápido pelas minhas coxas, meu vestido subiu.
E ali, no meio da excitação, pensei de novo: era isso que eu queria?
Passei três anos esperando. Guardando-me. Sonhando com uma noite especial, com aliança no dedo, promessas cumpridas.
Desejo eu sentia. Muito. Mas não assim. Não ali.
— Mê, espera...
Ele me fitou, respirando pesado. A tensão era real.
— Tudo bem — disse, recuando com um sorriso gentil. — Eu vou esperar. Como sempre.
Suspirei, aliviada. Ajustei o vestido e saí. Ainda era a minha festa. Ainda era o meu momento.
E mesmo com o peso do mundo batendo à porta, decidi adiar as decisões adultas só mais um pouco. Caminhei de volta, mas algo faltava. Procurei por Camila, me sentindo estranhamente sozinha sem ela. Quando me disseram que ela estava no banheiro, fui até lá — e encontrei o banheiro vazio.
O som abafado da boate quase não chegava até ali. Estava silencioso, íntimo… até que um gemido cortou o ar, vindo de uma das cabines.
Engoli em seco. Aquela voz era inconfundível.
— Camila?
Meu corpo enrijeceu. As palavras que ouvi em seguida me rasgaram por dentro.
— Onde quer que eu goze, cachorra?
— Vai gostoso, vai! Dentro, gostoso... me enche com tua porra, vai, Messias!
O coração disparou. As pernas fraquejaram. Corri até a porta trancada, mas não consegui abrir. O som de corpos se chocando ecoava na minha cabeça como um tambor.
Subi num vaso sanitário da cabine ao lado, mãos trêmulas segurando as bordas.
E o mundo parou.
Lá estavam eles. Camila, a minha melhor amiga, e Messias, o homem com quem eu sonhava casar. Ela, de joelhos, rindo em meio ao caos, embriagada. Ele, suado, completamente entregue ao ato.
— Ah! Puta merda! — Ela gemeu, rindo alto, os cabelos grudados no rosto. Messias empurrava com força, até erguer o queixo e encará-la. Camila, com o vestido prateado, tão parecido com o meu, balançava, rindo, sem nem perceber minha presença.
O grito que saiu de mim não foi só de dor. Foi de traição.
— Tess? — A voz dele me encontrou, surpresa. Mas quem deveria estar surpresa era eu.
Desci com pressa, o chão girando. As lágrimas desciam antes que eu pudesse contê-las. A traição não era apenas dele. Era dela também. Minha confidente. Minha irmã de alma.
— Tess quem? — ouvi Camila rir, a voz pastosa de álcool. — A Tess tá ocupada demais pra você, garotão!
Era esse o plano? Beber até esquecer quem somos… ou até nos destruirmos?
Eu perdi o morro, os amigos sumiram, nem a minha irmã que eu criei vem me visitar, seis meses nesse lugar, aqui é pior, a gente ver de tudo, morte, briga, droga, tráfico, nada que eu não esteja acostumado.Em seis meses, Tessália me visita uma vez no mês, eu não quero que ela se exponha deste jeito, sei que a vistória é pesada, que eles hulmilham, que eles tocam e as vezes abusam, ouço os caras dizer na hora do banho de sol, e por mais que eu lhe diga que não é pra vim, ela vem.O meu garoto já tem cinco meses, Antony, o moleque acabou tornando uma garota em mãe, e ela nem teve ele, mas pelo sorriso, pelas história que conta, e o brilho nos olhos dela toda vez que vem, tenho medo, de que ela ame mais a ele que a mim, porque sei que lá fora, é a unica cabeça que ainda lembra quem eu sou, quem eu fui, o resto foi de passagem.Até agora não marcaram a data do julgamento, apesar da mãe dela, ter deposto a meu favor, dizer que lhe defendi, que ela ia morrer, apresentar laudos e todo o resto,
Eu não saberia dizer nem o que aconteceu, simplesmente travei quando ouvi do meu tio que ele faria aquilo comigo, era o meu tio Isaac Romano, o homem que tocava em nossas cabeças enquanto brincavámos, pedia beijos na bochecha, me colocava sentada em seu colo na missa na igreja.Estava o tempo inteiro com o meu pai, com a minha mãe, ele me viu crescer, junto com a sua filha, e quando todos o acusava, eu era a única a dizer que não, a achar que ele só queria ajudar, quando me induziu a ser garota de programa numa boate, para descobrir o que eu jamais descobriria, quem matou o meu pai.Eu me perdi em meu mundo por dias, Camilla tinha razão, eu fui criada com muitas regalias, não conheci nada da vida, e ali estava a prova, o meu pai morreu eu fui tão facilmente levada por uma conversa, a minha mãe foi violentada de todas as formas, pelo homem que ela chamou por muito tempo de cunhado.E agora, ela estava no hospital, e mais uma vez, eu travei, eu me tranquei em meu mundo, como metodo de defe
Sai de casa deixando Tessália pensar nas neuras dela, sabia que pra ficar comigo era mais que só dizer, não vou abrir mão da minha vida, mesmo gostando dela. Não tem vida pra mim sem ser no tráfico, ela foi criada diferente, não tem mudança para mim, uma vez no crime sempre no crime, é nele que garanto a minha vida, tiro a minha renda, garanto pra os meus.Ela ficou no barraco, não ia apertar a mente, nunca fui de forçar ninguém cojntra a vontade, ou dá porque quer, ou não dá pô. Fiquei na biqueira com os moleques, a chuva não parou, varou a noite quase toda. Já era madrugada alta, a chuva caia, estava sentado fazendo as contas de tudo. – Rodrigo?Levantei a cabeça olhei pra porta, lhe vendo com meu casaco, cabelos pingando, toda molhada. – O que tu veio fazer aqui? – Ia ficar gripada, tinha certeza, nem sabia como veio de lá pra cá, a calça toda molhada, mas encharcada até o meio das canelas. – Fica comigo vai. – Pediu meio chorosa, os moleques não deram um pio, arrastei a cadeira pra
O dia estava sendo maravilhoso, perfeito pra mim depois de tudo, tantas idas e vindas acabei parando ali nos braços de quem eu não queria estar, de certa forma o destino me jogou na vida de Rodrigo, estava entrelçado? Não sei.Eu nunca acreditei em destino, o dia era chuvoso, depois de ficar na sua casa por um dia quase inteiro, eu não poderia abusar, precisava voltar pra casa me entender com a minha mãe. Quando me vesti, pentei o cabelo, ele estava sentado na sala assistindo tv, me olhou com os seus olhos pretos tão intensos, que eu não tive duvidas, nunca estive tão apaixonada na vida.A perfeição desde os seus olhos se espalhando por seu corpo, a boca carnuda deliciosa. - Eu vou te levar. - Avisou eu não achei ruim, quem me dera, mas todo e qualquer segundo com ele estava sendo prazeroso, além do sexo, da cama, era só estar junto, mesmo em silêncio a sua companhia me apazigua e isso é tão bom.Passou pra o quarto, abriu o guarda-roupa pegou uma blusa de mangas compridas branca, um pou
A casa sem graça, nada de luxo pelos cantos, eu abrir mão de morar no mesmo prédio com a minha mãe, e minha irmã, para que o meu filho não conhecesse a vida que eu vi de frente, era apenas um moleque com muita responsabilidade, Roberta já acordava chorando, aos berros, e quando chovia não tinha muita coisa a fazer.Tentava enganar com bico, que ela sugava até começar a entender que chupar a borracha não dava em nada, a maioria até apontava um negão que trabalhava no gás,dizia que era o meu pai, mas ele era casado, sempre enfezado, troncudo, várias vezes tinha pensado em bater lá na grande, pedi um pão, um pouco de pó de café.A mulher dele, bem branca, mal via a gente começava a xingar, eu demorei a entender uma cara, como acontecia as paradas na favela, eu nunca quis que o meu moleque passasse chuva, frio, ou que alguém olhasse torto pra ele, não era fruto de um caso de amor, nem aquelas narrativas perfeitas de novela, mas de qualquer maneira, do mesmo jeito que eu fui homem para abaix
Eu queria não procurar Rodrigo, não liguei, bloqueei o seu número, e desbloqueiei quando me vi sozinha dentro do quarto.Sabia de tudo que se passava no morro, porque além de Roberta, parecia ter feito amizades com algumas moradoras de lá, eu não estava dando conta de toda a situação.Minha mãe denunciando o meu tio, monitorando o meu celular, Camila indo depor contra ele, e agora vendo Roberta e minha mãe amigas, era de lascar.Tudo parecia sair do lugar, eu precisava sair, tomar um ar, quando sair deixando as duas novas amigas conversando, ambas me deram o mesmo olhar.- Eu sei!- Avisei revoltada com tanta segurança, porque de repente o meu tio se tornou um vilão pior era ele não responder as minhas ligações, o medo de Rodrigo ter pego ele me atormentava.Eu só não esperava voltar, e encontrar a minha mãe com a cara enfiada dentro das pernas de Roberta, sentada no sofá, os gemidos atravessavam a porta, eu estanquei na porta, agora tudo fazia sentido.De repente tudo fazia sentido, se enca
Último capítulo