Narrado por Leonardo:
O clique da porta do meu escritório me isolou no silêncio que se seguiu à saída de Sarah. O aroma de jasmim e o rastro do seu batom vermelho imaginário ainda pairavam no ar, misturando-se ao persistente cheiro de whisky que eu carregava. Joguei o relatório sobre a mesa de vidro, a urgência dos números já um ruído distante na minha mente. Aquele maldito vestido vermelho. E aqueles olhos verdes.
Ela estava diferente. Não era a Sarah de sempre, a eficiente e inatingível secretária que, por quatro anos, conseguira me manter à distância com uma muralha de profissionalismo e uma postura que beirava a indiferença. Aquela noite, algo havia se quebrado nela. Eu vi a dor, a vulnerabilidade, por trás da fachada de controle que ela tentou manter. Mas, estranhamente, essa vulnerabilidade não a tornou fraca aos meus olhos. Pelo contrário. Despertou uma curiosidade, um desejo ainda mais intenso.
Caminhei até a janela do meu escritório, observando as luzes da cidade. Um milhão de histórias acontecendo lá embaixo, e eu me pegava obcecado pela única que acabara de deixar minha sala. A Sarah. Sempre tão recatada, sempre em roupas que pareciam querer escondê-la. E, de repente, ela surge como um raio carmesim, uma deusa em chamas. Que inferno.
Meu telefone vibrou. Era a notificação de um e-mail do meu conselho. Pressão. Mais pressão. É por isso que eu estava aqui, afinal. Mas a concentração me escapava como areia entre os dedos. A imagem dela, sentada à mesa dela, procurando os papéis, o ombro à mostra, o corpo delineado pelo tecido... Puta que pariu.
Sempre fui um homem de poucas palavras quando se tratava de sentimentos. As mulheres que passaram pela minha vida eram passageiras, atrações que saciavam um desejo momentâneo, nunca nada mais profundo. Elas sabiam as regras. Eu deixava claro. A maioria aceitava, algumas se iludiam e se machucavam, e então saíam. Todas, exceto Sarah. Ela nunca caiu na minha lábia. Nunca demonstrou fraqueza. E essa resistência dela sempre me fascinou, me intrigou. Ela era um enigma. E eu adorava enigmas.
Por isso, minha curiosidade sobre o que a havia abalado naquela noite era quase insuportável. A dor em seus olhos era autêntica, profunda. Não era a raiva comum de uma discussão boba. Era algo que rasgava a alma. E a forma como ela tentava mascarar aquilo, com aquela fúria silenciosa, só me atraía mais.
Abri a porta e a vi parada perto da janela, o olhar perdido na imensidão da noite paulistana. Ela estava tão longe, tão vulnerável, que quase me arrependi das provocações. Mas o instinto de predador é difícil de controlar. Ela se virou quando me ouviu.
— Já vai? — perguntei, a voz um pouco mais suave do que o habitual, pegando-me de surpresa.
— Sim, Senhor Ferrari. O relatório está com o senhor. Não há mais nada que eu possa fazer hoje — a voz dela era firme, mas eu notei a leve rouquidão. Ela estava se segurando.
Eu a observei. Cada movimento, cada fibra dela parecia dizer: "Estou quebrada, mas não vou me curvar". Aquela era a Sarah que eu conhecia, mas elevada à máxima potência. A resiliência dela era algo que eu admirava, mesmo que nunca tivesse verbalizado.
— Claro — respondi, tentando soar casual. — Vá para casa. Descanse.
Ela apenas assentiu e pegou a bolsa. Eu a segui com os olhos até o momento em que as portas do elevador se fecharam. Fiquei parado ali, no meio do corredor vazio, o silêncio da noite engolindo o som do elevador.
A mão do destino. Era isso que Sarah Evans parecia ser para mim. Desde o dia em que a contratei, há quatro anos, ela se tornou o ponto fixo em meio ao meu caos. A única pessoa em quem eu confiava cegamente para as questões de trabalho, e a única que não me olhava com admiração ou desejo óbvio, e sim com uma mistura de respeito profissional e uma dose saudável de desafio.
Sempre achei que a atração por ela era apenas mais uma daquelas coisas que um homem no meu poder sentia por uma funcionária atraente. Mas nunca tentei nada, não de verdade. Havia algo nela que me dizia para não cruzar aquela linha. Talvez fosse a sua integridade, a forma como ela se mantinha distante, ou o fato de que eu, pela primeira vez em muito tempo, respeitava uma mulher além do seu corpo.
Mas hoje... hoje algo mudou. A fragilidade dela, misturada com aquela força recém-despertada, e aquele maldito vestido vermelho. Ela estava mais mulher, mais real, mais palpável do que nunca. E o desejo, que sempre foi uma corrente subterrânea, agora rugia como um rio.
Voltei para o meu escritório, a mente ainda girando em torno dela. O relatório podia esperar. Eu tinha algo mais urgente para analisar. A Sarah. E o que diabos ela estava fazendo comigo. A noite era jovem, e a intriga era um prato que eu apreciava mais do que qualquer whisky caro.